O que acontecerá quando todos os nossos cemitérios estiverem cheios?



Todos os anos morrem cerca de 55 milhões de pessoas em todo o mundo, cerca de 0,8% da população mundial, mas os planeadores urbanos e cidades focam-se sobretudo em acomodar – e ganhar dinheiro – com os vivos.

Os cemitérios são dos locais mais icónicos das cidades mas, sobretudo porque ninguém ganha dinheiro com eles, estão proibidos de crescer dentro do espaço urbano. O que significa, de uma forma bem directa, que as cidades estão a ficar sem espaço para acomodar os seus mortos.

O problema torna-se mais grave, segundo o Guardian, em cidades que não reciclam as sepulturas. Países como Singapura, Alemanha ou Bélgica oferecem sepulturas gratuitas – durante os primeiros 20 anos, normalmente – mas as famílias podem pagar uma renda mensal para as manter. Ou seja, elas não são obrigatoriamente recicladas.

Nos países em que a reutilização de campas não é a norma cultural, porém, algumas primeiras incursões nesta prática foram rechaçadas pela população – cidades como Durban, África do Sul, Sydney, na Austrália ou Londres, Inglaterra, são algumas delas.

“Estamos com uma grave crise no Reino Unido, devido à lei dos enterros [publicada no século XIX e que proíbe a exumação]. Temos cemitérios com mais de 40 hectares em Londres, mas a forma como utlizados o espaço não é sustentável”, explicou Julie Rugg, do grupo de pesquisa de cemitérios da Universidade de York.

Nos últimos anos, porém, um pequeno número de cemitérios britânico – como o da City – começou a reutilizar algumas sepulturas com mais de 75 anos. Ainda assim, se a legislação geral não mudar, nada pode evitar que, dentro de 20 ou 30 anos, os cemitérios londrinos estejam cheios.

Na verdade, até as cidades que reutilizam as sepulturas podem ter problemas. Na Noruega, as preocupações sobre o saneamento e o risco de contaminação do solo nos anos 50 levou a uma política de estipulação em que todos os corpos podem ser enrolados em plástico antes do enterro. Alguns anos depois, concluiu-se que os corpos não se estavam a decompor suficientemente rápido para que as campas fossem reutilizadas.

A solução foi injectar uma solução de lima nas campas, para aumentar a decomposição – a ideia partiu de um coveiro norueguês, que a vendeu ao Governo por €580 (R$ 1.750).

Um espaço que dá inteligência emocional a uma comunidade

À medida que o negócio da morte se tornou altamente lucrativo, sobretudo nas grandes cidades, há áreas metropolitanas, como Nova Iorque, onde já quase não existem locais para se enterrarem pessoas. Em 2008, o antigo mayor da cidade, Ed Kock, pré-comprou a sua campa, em Manhattan, por €17.000 (R$ 52.000).

Em Hong Kong, cada sepultura vale hoje €25.000 (R$ 80.000). A alternativa é esperar cinco anos por um local no cemitério local, onde milhares de urnas com as cinzas cremadas são guardadas.

Em Londres, quem não tem €5.800 (R$ 18.000) para pagar por uma campa pode sempre ser enterrado várias camadas abaixo do solo, ao estilo victoriano, mas esta não é uma solução que possa ser vista a longo prazo.

“O sector privado anda a cheirar… percebendo que existe alguma preocupação do público em torno da falta de espaço”, explica Rugg. É que, para complicar a situação, as cremações criam mais problemas do que aqueles que ajudam a resolver. As urnas continuam a ser enterradas nos cemitérios, e ainda que muitas famílias coloquem mais do que uma urna no mesmo espaço, elas ainda ocupam uma porção significativa do local – e para sempre.

Por outro lado, a cremação aumenta os problemas ambientais: é um processo que precisa de bastante energia para ser efectuado, e a chamada “resomação”, onde o corpo é quimicamente reduzido a cinza e água residual não tóxica, apenas é legal em alguns estados norte-americanos, apesar de há muito se falar desta possibilidade para o mercado europeu.

“Os cemitérios são como escolas ou hospitais. São muito emocionais, e sem eles os bairros ficam sem um espaço comunitário muito particular. Onde é que encontramos algo do género numa paisagem urbana? Eles acrescentam inteligência emocional a uma cidade”, conclui Rugg.

Foto: Paul Wilkinson / Creative Commons





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