Portugal: Aves agrícolas em “preocupante declínio”. Cientistas pedem “ação para reverter estas tendências”
As aves associadas a ambientes agrícolas em Portugal estão em “preocupante declínio”, causado, sobretudo, pela expansão de culturas permanentes e da pecuária no país.
O alerta é feito por quatro investigadores portugueses que, numa carta publicada recentemente na revista ‘Science’, dizem que a abetarda (Otis tarda), o sisão (Tetrax tetrax) e o tartaranhão-caçador (Circus pygargus), três espécies cuja conservação é considerada prioritária pela Diretiva Aves da União Europeia, registaram perdas populacionais entre os 50% e os 80% na última década.
Recorde-se que ao tartaranhão-caçador, também conhecido como águia-caçadeira, registou um declínio de até 80% em apenas 10 anos, segundo o primeiro censo nacional da espécie em Portugal.
No texto, explicam que a transformação agrícola, que apontam como sendo uma das principais causas destes declínios, “começou em 2003, quando Portugal deixou de subsidiar a produção de cereais, mas manteve os subsídios para o gado no contexto da reforma da Política Agrícola Comum”.
E escrevem que “além da perda direta de habitat aberto, esta mudança resultou no abandono da prática do cultivo extensivo e rotativo de cereais, uma matriz de habitats composta por cereais, leguminosas e pousios”. Com isso, veio “a redução da diversidade da paisagem e da complexidade vegetal”, que fez cair a pique a disponibilidade de alimento para as aves, bem como os locais para refúgio e reprodução.
Reconhecendo que Portugal, entre 1999 e 2008, “integrou sítios-chave para a conservação de aves localizados em áreas agrícolas” na rede europeia de áreas protegidas Natura 2000 e implementou medidas e incentivos financeiros para promover a conservação de espécies de aves prioritárias, os cientistas argumentam, contudo, que “as medidas que pretendiam melhorar os habitats que contêm culturas de cereais são menos eficazes, à medida que os sistemas de pastoreio se expandem e intensificam”.
Como tal, acusam Portugal de estar “em claro incumprimento” da Diretiva Aves “ao falhar em reverter o declínio de espécies prioritárias”. Para remediar a situação problemática, pedem “ação para reverter estas tendências” e apelam, na carta, a uma maior e mais próxima colaboração entre os ministérios do Ambiente e da Agricultura e os próprios agricultores.
Em comunicado, João Silva, primeiro autor, destaca que “estas novas medidas devem ser sujeitas a uma monitorização e avaliação regulares, ao contrário do que foi feito até agora, para determinar o impacto, a adesão dos agricultores, e possibilitar ajustes imediatos”.
E acrescenta que “apenas um esforço conjunto por parte das entidades responsáveis pela agricultura e conservação pode contribuir para reverter o declínio vertiginoso das aves agrícolas em Portugal”.
Em 2022, no seu relatório ‘O Estado das Aves em Portugal’, a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), revelou que “dentro do grupo das aves associadas a ambientes agrícolas, 30% das espécies estão em declínio”, especialmente as insetívoras e migradoras. Especificamente sobre o grupo das aves comuns em meios agrícolas, o declínio ultrapassa dos 60%.