Saber como os morcegos resistem a vírus pode ajudar a combater próximas pandemias



Os morcegos são portadores de alguns dos patógenos mais perigosos para os humanos e outros animais, tais como o ébola ou o coronavírus. Contudo, uma evolução de milhares ou mesmo milhões de anos tornou-os praticamente imunes e saber como isso aconteceu pode ajudar-nos, humanos, a combater as próximas pandemias.

Assim pensa um grupo de cientistas dos Estados Unidos da América, da Suíça, da Irlanda e de Espanha, que acreditam que o facto de os morcegos formarem grandes grupos de várias espécies pode ajudar a compreender a proteção que têm face a várias doenças que carregam.

“Várias espécies de morcegos são tolerantes a vírus que são prejudiciais à saúde humana, o que significa que se tornam reservatórios de doenças”, mas não desenvolvem sintomas, explica Nicole Foley, investigadora da Texas A&M University e primeira autora do artigo publicado este mês na ‘Cell Genomics’.

Por isso, em comunicado, afirma que “compreender como os morcegos evoluíram tolerância viral pode ajudar-nos a aprender como os humanos podem melhor combater doenças emergentes”.

O trabalho começou com o mapeamento genético de morcegos do género Myotis, o segundo maior do grupo dos mamíferos, com mais de 140 espécies conhecidas até ao momento. “São encontrados quase em todo o mundo e carregam uma grande diversidade de vírus”, diz Foley.

Em Portugal, por exemplo, estima-se que existam 27 espécies de morcegos, das quais nove pertencem ao género Myotis: o morcego de Bechstein (M. bechsteinii), o morcego-rato-grande (M. myotis), o morcego-rato-pequeno (M. blythii), o morcego-de-franja do Sul (M. escalerai), o morcego -de-franja-críptico (M. crypticus), o morcego-lanudo (M. emarginatus), o morcego-de-bigodes (M. mystacinus), o morcego-de-bigodes de Alcathoe (M. alcathoe) e o morcego-de-água (M. daubentonii).

Os investigadores acreditam que o mapeamento genético dos morcegos ajudará a identificar os genes que podem conferir imunidade a esses mamíferos alados. Além disso, pensam que parte do segredo poderá estar na forma como os morcegos se juntam em numerosos grupos, especialmente durante a época da reprodução.

Nesses ajuntamentos, que podem conter mais do que uma espécie, “há muita atividade de voo, maior comunicação e convívio entre espécies”, assinala Foley. “Para os morcegos, não é muito diferente de ir a uma discoteca.”

Durantes esses eventos, ocorre o acasalamento entre diferentes espécies de Myotis e os cientistas perceberam que os genes responsáveis pela imunidade viral dos morcegos eram o material genético mais frequentemente transmitido durante estes ajuntamentos.

Por isso, sugerem que esse comportamento terá evoluído precisamente para aumentar ao máximo a dispersão de genes ‘antivirais’ entre as populações de morcegos. Sem esses ajuntamentos e sem a hibridização, é provável que a imunidade ficasse restringida a um grupo de morcegos, deixando os demais expostos aos vírus.

E, escrevem no artigo, os locais onde esses ajuntamentos acontecem devem ser considerados de especial interesse para a conservação “dados os processos evolucionários únicos” que aí ocorrem, ou seja, a transmissão de genes de imunidade viral entre espécies, originando híbridos que podem ajudar-nos a desenvolver proteções contra próximas pandemias.





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