Seca: Climatologista diz que Açores não estão em situação extrema
O especialista português em climatologia Eduardo Brito de Azevedo discorda que se registe nos Açores uma situação de “seca extrema” sem precedentes, considerando que há equilíbrio em termos hidrológicos graças à precipitação de inverno.
“A afirmação de que estamos a passar por uma situação de seca sem precedentes não é bem assim, na minha opinião. Apesar do mês de agosto, sobretudo, ter-se uma anomalia bastante significativa da precipitação, em termos negativos, em termos hidrológicos não é, de maneira nenhuma, o pior ano de disponibilidades hídricas”, declara à Lusa Brito de Azevedo.
Os Açores têm registado, em particular no mês de agosto, temperaturas acima dos valores normais no verão, com máximas de 29 e 30 graus Celsius, a par de baixos valores de precipitação.
O especialista e docente jubilado – gestor de projeto do Eastern North Atlantic (ENA), Graciosa Island ARM Facility, do Departamento de Energia dos Estados Unidos da América e do Laboratório Nacional de Los Alamos – frisa que “o facto de se ter atravessado um período bastante alongado de bom tempo, não significa que seja um período de seca extrema”.
O climatologista refere que, na generalidade das ilhas dos Açores, não há problemas de carga hídrica, assegurada pelo inverno, para abastecimento às populações.
“Em termos agronómicos, o mês de agosto foi, de facto, um mês com sinal negativo na precipitação com implicações na agricultura, em particular nas forragens para o gado”, afirma.
De acordo com o especialista em questões ambientais, este cenário deve-se “a uma persistência do anticiclone dos Açores, bem localizado no Atlântico”, o que “tem condicionado o estado do tempo”.
Brito de Azevedo refere que “a anomalia da temperatura do ar entre os 1,5 e 2,5 graus” deve-se “particularmente devido a uma outra anomalia, que é a temperatura da água do mar à superfície, que foi, particularmente no fim de julho e início de agosto, muito significativa e que deve preocupar todos os setores que dependem da economia”.
“Essa anomalia da temperatura na superfície do mar é que dá, de facto, um sinal mais preocupante. O Atlântico central aqueceu. Já em 2003, as temperaturas à superfície foram as mais elevadas de sempre e, este ano, prolongou-se esse aquecimento particularmente nos primeiros meses do ano”, explica o especialista.
Brito de Azevedo salvaguarda que, “curiosamente, a partir de julho, há a tendência de algum arrefecimento, muito embora se mantenha uma bolsa de água quente nesta zona dos Açores, do Atlântico central, que fez aumentar a temperatura do ar também”.
O especialista refere que esta situação arrasta “alguma imprevisibilidade em termos de futuro, particularmente porque o mar, deixando de regular a temperatura do ar, como acontece na termorregulação, estando mais quente, pode trazer alterações climáticas significativas” com impacto nos ecossistemas marinhos e na composição da fauna e flora marinha.
“Se é uma situação para se manter ou não, é um aspeto que a climatologia ainda não consegue responder”, refere o cientista, que ressalva que a anomalia térmica “influencia a geração e trajeto das tempestades tropicais”.
Segundo Brito de Azevedo, em inícios de agosto, tudo indicava que “seria uma época bastante complicada em termos de tempestades tropicais, mas a partir de meados de agosto houve um arrefecimento da temperatura da água do mar nas zonas equatoriais, onde começam os furacões”.
Quanto às alterações climáticas, o especialista afirmou que “já se fazem sentir” e que se vai “traduzir mais pela irregularidade climática”, sendo que “a sazonalidade que os Açores estavam habituados tem-se vindo a perder quer de inverno, quer de verão”.