Susana Fonseca, Quercus: “Os preços baixos acabam por fazer ricochete”
Sem ambiente e matérias-primas não há economia, e sem economia não há sociedade, por isso a Quercus é também a casa da responsabilidade social, ética ou economia.
Por outro lado, organizações como a Oikos ou a AMI estão já a incorporar e a educar, elas próprias, para as boas práticas ambientais. “Isto anda tudo ligado”, explicou Susana Fonseca, a presidente da Quercus, em entrevista exclusiva ao Green Savers.
Fique atento, nos próximos dias, à publicação das restantes partes da entrevista e aproveite para recordar a que publicámos ontem.
Há dias, Daniel Bessa desafiou o BCSD a ser não só a casa da sustentabilidade mas também a casa da responsabilidade social. A Quercus, no futuro, poderá ambicionar também a sê-lo também, à medida que os temas de sustentabilidade se vão confundido com os de responsabilidade social, ética, pobreza…?
Há um erro de base quando se fala de sustentabilidade e há o risco da proliferação de conceitos. Na área do consumo havia o consumo sustentável, o consumo responsável…, depois há a sustentabilidade e a responsabilidade social, empresarial, ambiental… A sustentabilidade tem lá tudo, os três pilares. A responsabilidade social, entendida nesse sentido restrito, das condições social, está no conceito de sustentabilidade.
Então refaço a pergunta. No futuro, a Quercus poderá incorporar no seu discurso mais temas de responsabilidade social?
Em muitas situações fazemos a ponte entre as questões ambientais e as questões económicas e sociais. Porque as coisas estão muito ligadas e consideramos que, para se trabalhar uma, tem que se ter as outras em consideração. Claro que partimos de uma base em que, sendo o conceito de sustentabilidade o conceito central, há um pilar que é o da base, o ambiental. Se não houver recursos ambientais não há economia, e sem economia não há sociedade. Se não tivermos matéria-prima para as indústrias – ar, água ou sol para produzir o que precisamos para comer – não conseguimos ter actividade económica nem sociedade estruturada. Porque não temos a base da nossa sobrevivência. Embora achemos que o ambiente é fundamental, temos que pensar de forma integrada. Só se o ambiente funcionar bem a sociedade poderá proliferar.
Então a Quercus já é a casa da responsabilidade social.
Eu vim agora da elaboração de um ranking sobre responsabilidade social, transparência e comunicação de empresas e parte das minhas intervenções tiveram a ver com a dimensão social. Um exemplo é a questão dos preços praticados na distribuição. As pessoas querem preços baixos, porque em ambiente de crise o ideal é que assim seja. Esquecem-se é que, ao pedirem esses preços baixos, isso significa que quem está a produzir não poderá fazê-lo com qualidade ambiental nem social. E esses preços baixos vão acabar, [indirectamente] por lhes bater à porta, porque há empresas portuguesas que fabricam estes produtos e vão deixar de o fazer… não conseguem competir com aqueles preços.
Fazem ricochete.
Sim, isso mesmo. Isto é válido para a área alimentar e outras. Também não quero que se caia nos preços excessivos, não é isso, mas as obrigações que estão em cima da mesa hoje em dia, em termos sociais e ambientais, e que são fundamentais para a nossa sociedade e que defendemos, não conseguem ser respeitadas se não tivermos preços justos a serem pagos. E as pessoas não percebem isso… se há uma banana mais cara e outra mais barata, não vão perceber se uma é da Madeira e até está a promover o emprego em Portugal ou se a outra está com aquele preço porque os produtores estão com os preços completamente esmagados por causa de uma negociações internacional. É claro que se disser isto a quem recebe o salário mínimo ele pode não achar graça, tenho essa noção.
Está tudo ligado.
Estas coisas estão todas ligadas. As pessoas costumam dizer que a agricultura biológica é cara em Portugal, mas não é verdade, a agricultura tradicional é que é demasiado barata… e nós ainda a queremos mais barata. É este tipo de mudança de mentalidade que pretendemos. Isto está tudo interligado. Fazemos a ponte com outras áreas, mas somos essencialmente uma organização de ambiente. Temos também um projecto sobre territórios sustentáveis, onde já falamos de consumo sustentável, mudámos a área de educação ambiental para educação para a sustentabilidade porque é isso que faz sentido, já fazemos essas pontes. Também há outras associações da parte social que já começam a fazer a ponte com a ambiental, como a Oikos ou a AMI. Esta revolução já está a decorrer.
Vai recandidatar-se?
Nunca tive o desejo muito forte de ser presidente da Quercus. Gosto muito de estar na direcção, adoro o nosso trabalho em equipa e as pessoas com quem trabalho mas é muito complicado conjugar esta função de direcção com uma actividade profissional, o que às vezes se torna difícil de gerir. Não sei se me vou recandidatar, mas a recandidatura não é do presidente, mas da lista de nove pessoas e três suplentes. É preciso haver coerência e ver se as pessoas se querem manter ou não. Ainda tenho tempo de reflectir, com a restante equipa de direcção. Só no início do ano é que se vai começar a desenhar a nossa lista e quem fica e sai.