É preciso atenuar os impactos negativos dos parques solares nos morcegos, avisam investigadores



A transição de modelos de produção e consumo de energia dependentes de combustíveis fósseis para fontes energéticas mais limpas e sustentáveis é considerada um pilar indispensável no combate às alterações climáticas.

Na União Europeia, a energia solar é a renovável que mais tem crescido, sendo que em 2022 a capacidade instalada na região subiu cerca de 50% face ao ano anterior. A nível mundial, tudo aponta para que a solar passe a ser a fonte de energia dominante até 2027.

No entanto, à medida que se procura aumentar a capacidade de geração de energia a partir da radiação solar, aumenta também a área em terra coberta pelos chamados parques solares, e, assim, os impactos sobre a vida selvagem que habita nessas zonas.

Para que a luta contra as alterações climáticas não intensifique a perda de espécies e ecossistemas, outra das três grandes crises planetárias do nosso tempo, é preciso que os projetos de energias renováveis prestem cada vez mais atenção à biodiversidade e que seja vista como um eixo central no que toca à transição energética.

Uma investigação liderada pela Universidade de Bristol, no Reino Unido, chama a nossa atenção para os impactos que os parques solares têm sobretudo nas populações de morcegos.

Elizabeth Tinsley, principal autora do artigo publicado esta semana na revista ‘Journal of Applied Ecology’, embora reconheça os tremendos benefícios das renováveis como estratégia para reduzir os impactos humanos sobre a Terra, afirma que “as energias renováveis podem ter impactos negativos sobre a biodiversidade e a mitigação é essencial para que se possa ter soluções de ganho mútuo para fornecedores de energia e para a vida selvagem”.

Para chegarem a essa conclusão, os investigadores colocaram sensores para monitorizar a atividade de morcegos em dois locais, com as mesmas dimensões e ambos com a presença de sebes: um parque solar e outro sem painéis solares, para servir de controlo.

Representação esquemática do parque solar (à esquerda) e do local de controlo (à direita).
Fonte: Elizabeth Tinsley

Os resultados demonstram que no parque solar a atividade de seis das oito espécies de morcegos captadas pelos sensores era “substancialmente menor” do que no local de controlo. Por isso, Tinsley considera que “devido ao significativo impacto negativo que foi identificado”, a perda de habitat causada pelo fenómeno de afastamento, os projetos de criação de parques solares devem ser sujeitos a avaliações de impacte ambiental para que sejam ativadas as medidas de mitigação necessárias para salvaguardar as espécies selvagens presentes nesses habitats.

“Isso já tem sido feito nos parques eólicos”, diz a investigadora, “onde a mortalidade de morcegos tem sido reduzida através da alteração da velocidade do vento a que as turbinas ficam operacionais” e através da implementação de sistemas sonorosos que procuram manter os animais afastados das torres eólicas.

Ainda assim, os cientistas acreditam que são precisos mais estudos para que se possa perceber melhor as razões que levam os morcegos a manterem-se longe dos parques de painéis fotovoltaicos. “É a perda de habitat adequado que reduz a atividade? Existem menos insetos presa disponíveis e estão os morcegos em risco de colisão com os painéis?”, são todas questões que, pelo menos por agora, continuam sem resposta.

Tinsley considera, no entanto, que podem ser implementadas medidas que ajudem a manter as populações desses mamíferos alados nos locais onde são instalados os painéis, como a plantação de espécies vegetais que sejam atraentes para os insetos ou a criação de sebes que permitam a fixação e proliferação das populações desses invertebrados dos quais muitos morcegos dependem para se alimentarem.

“A situação é potencialmente preocupante”, admite Gareth Jones, outro dos autores da investigação. À medida que os parques solares se vão expandindo, vão também ocupando áreas usadas pelos morcegos para a procura de alimento, e o cientista diz até que esses animais podem confundir a superfície luzidia dos painéis com poças de água “e tentar beber delas”.

Mas se se conseguir encontrar um equilíbrio entre a expansão das energias renováveis e a manutenção e conservação da vida selvagem, Tinsley acredita que será possível que todos saiam a ganhar e que possamos combater duas crises planetárias em simultâneo.





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