90 milhões de pessoas deslocadas vivem em países altamente vulneráveis a fenómenos climáticos extremos. Brasil e Moçambique entre os mais afetados



Dos mais de 120 milhões de pessoas deslocadas à força no mundo, cerca de 90 milhões vivem em países altamente expostos a eventos climáticos extremos, diz a Portugal com ACNUR, parceiro nacional da Agência da ONU para os Refugiados (ACNUR).

Em comunicado, a organização humanitária recorda um relatório do Internal Displacement Monitoring Centre, divulgado em junho, que mostrava que, só no último ano, foram registadas 45,8 milhões de deslocações internas devido a catástrofes, com 9,8 milhões de pessoas a permanecerem deslocadas dentro do seu próprio país no final de 2024.

As deslocações internas relacionadas com catástrofes representaram 70% de todas as novas deslocações em 2024.

“À medida que a frequência e a intensidade dos fenómenos meteorológicos extremos aumentam, também aumenta o seu impacto nas pessoas deslocadas à força, nas comunidades que as acolhem e nas nossas próprias operações humanitárias, onde nem sempre dispomos dos recursos essenciais para assegurar a sua preparação e resiliência”, alerta Joana Feliciano, responsável de Comunicação e Relações Externas da Portugal com ACNUR.

Só no último ano, o ACNUR declarou um recorde de nove emergências relacionadas com fenómenos meteorológicos extremos, nomeadamente inundações e ciclones, em África, Ásia e América Latina. Um número que representa 35% do total de novas emergências declaradas pelo ACNUR em 2024.

Tudo indica que até 2040 a situação deverá agravar-se ainda mais, com a Portugal com ACNUR a dizer que “o número de países em risco de enfrentarem eventos climatéricos extremos vai disparar dos atuais três para 653”, no que descreve como “um aumento brutal”.

A organização portuguesa diz, em nota, que se trata de “uma situação verdadeiramente dramática se pensarmos que 65 destes países acolhem mais de 40% de todas as pessoas que vivem atualmente em situação de deslocação forçada”.

Entre os Estados da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), há dois países que entram nesta lista: o Brasil e Moçambique. A Portugal com ACNUR aponta que ambos deverão ser fortemente afetados pela crise climática e os eventos meteorológicos extremos.

“No caso de Moçambique, temos assistido a um crescimento exponencial do número de deslocados nos últimos anos, causado tanto pelos conflitos em Cabo Delgado, como pelos desastres naturais que não dão tréguas à população”, salienta Joana Feliciano.

“Ciclones e tempestades tropicais, como o Ciclone Chido e o Ciclone Dikeledi de dezembro passado, são cada vez mais frequentes e intensos e o impacto na população tem sido devastador. Atualmente, o país já acolhe mais de 1,2 milhões de deslocados internos e 26 mil refugiados devido ao clima e aos conflitos”, acrescenta.

No que se refere ao Brasil, a responsável de Comunicação da Portugal com ACNUR relembra que as chuvas intensas do ano passado no estado do Rio Grande do Sul “deram origem a cheias repentinas e devastadoras que causaram fatalidades e obrigaram 582 mil pessoas a abandonar as suas casas. Entre as pessoas deslocadas encontravam-se 43 mil refugiados e outras pessoas com necessidade de proteção internacional, provenientes da Venezuela, Haiti ou Cuba”.

Para dar resposta às crescentes necessidades resultantes desta crise climática, o ACNUR tem estado a promover inúmeras iniciativas de modo a prevenir, preparar e adaptar as comunidades para as consequências das alterações climáticas e dos fenómenos meteorológicos extremos.

“Por exemplo, nos 10 campos de deslocados com maior risco de inundação, o ACNUR já está a pôr em marcha planos pormenorizados de gestão de infraestruturas. Além disso, 42% dos centros de saúde apoiados pelo ACNUR já são alimentados por energia solar e 27% das pessoas que foram apoiadas com abrigos pela Organização em 2024 vivem agora em abrigos sustentáveis”, conta portuguesa.

E explica também que o ACNUR tem tentado envolver as próprias pessoas deslocadas neste trabalho de adaptação às alterações climáticas, através de iniciativas como os “Refugees for Climate Action”.

“Trata-se de uma rede que reúne pessoas deslocadas e refugiadas, provenientes de países na linha da frente da crise climática como o Brasil, o Afeganistão, o Iémen, o Haiti ou o Bangladesh, para que possam partilhar as suas experiências e conhecimentos únicos nesta área da sustentabilidade e combate às alterações climáticas, que muitas vezes resultam de iniciativas que já estão a implementar nas suas comunidades de acolhimento”, detalha Joana Feliciano.

O financiamento é apontando como um dos maiores obstáculos à resposta do ACNUR e será um dos temas em destaque na próxima cimeira global do clima, a COP30, que acontece no Brasil no final do ano.

“O ACNUR tem estado a reforçar o apelo à comunidade internacional para que seja atribuído mais financiamento às pessoas refugiadas e às comunidades de acolhimento com o objetivo de apoiar os esforços de adaptação e mitigação dos efeitos das alterações climáticas, tornando-as mais resilientes à crise climática. Portanto, sem dúvida que este será um tópico central na próxima COP no Brasil, um dos países que poderá vir a ser mais afetado por este agravamento das consequências das alterações climáticas”, salienta.

A Portugal com ACNUR informa que tem a decorrer em território nacional uma campanha que visa angariar fundos para apoiar esta resposta do ACNUR à emergência climática.

“É um esforço que deve ser conjunto e para o qual todos podemos contribuir: privados e entidades. Por exemplo, com pequenos donativos, a Portugal com ACNUR consegue ajudar uma família refugiada a obter sementes adaptadas ao clima no Sudão do Sul (19 euros) ou com 32 euros mensais asseguramos um importante contributo para apoiar a instalação de sistemas de energia solar para produção de água em campos de refugiados na África Oriental ou Corno de África”, explica Joana Feliciano.






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