Morcegos podem não ser a origem do novo coronavírus, defende especialista na espécie



O biólogo mexicano especializado em morcegos Rodrigo Medellin contesta a hipótese de terem sido estes mamíferos a passar aos seres humanos o coronavírus SARS-CoV-2, argumentando que, apesar de disseminada, não existem provas que a sustentem.

Em entrevista à agência Lusa à margem da Cimeira Global da Exploração, em Ponta Delgada, o ecologista da Universidade Autónoma do México afirmou que apontar os morcegos como origem do vírus carece de fundamentação para além de o SARS-CoV-2 ter semelhanças genéticas com um outro coronavírus encontrado nestes animais na China.

“Mesmo que o coronavírus encontrado num morcego na China partilhe 96% do seu genoma com o SARS-CoV-2, isso não o prova. É como dizer que, como os humanos partilham 99% do seu genoma com os chimpanzés, somos descendentes uns dos outros. Não é verdade”, argumentou.

O que é factual, referiu, é que “humanos e chimpanzés partilham antepassados comuns, tal como muitas outras espécies e é exatamente o mesmo processo dos coronavírus”.

Além disso, “mesmo que um ‘cientista louco’ quisesse pegar no coronavírus descoberto nos morcegos e colocá-lo num ser humano, a proteína [que rodeia o vírus] que usa para se ligar às células não é compatível com a membrana das células humanas”, acrescentou.

Salientou que “os coronavírus estão presentes em morcegos, pássaros, primatas e muitos outros animais”.

“De cerca de 300 coronavírus conhecidos, só sete afetam os seres humanos. Desses sete, quatro provocam as constipações comuns e três deles podem afetar gravemente o corpo”: além do que provoca a covid-19, o que causa a síndrome respiratória aguda grave (SARS) e a síndrome respiratória do Médio Oriente (MERS).

“E SARS e MERS não têm nenhuma ligação com os morcegos”, frisou Rodrigo Medellin, que colidera o grupo dedicado aos morcegos na União Internacional para a Conservação da Natureza.

Medellin defende que é preciso investigar a hipótese de que o SARS-CoV-2 possa resultar da manipulação de um vírus em laboratório, nomeadamente o Instituto de Virologia de Wuhan, a cidade onde foram detetados os primeiros casos de contaminação pelo novo coronavírus, que provoca a covid-19.

Os cientistas que propõem essa hipótese defendem que tem que ser investigada para tirar a limpo se houve ou não uma fuga involuntária de um vírus que estivesse a ser estudado nesse laboratório, algo que a China nega desde o início da pandemia.

“Será muito útil para compreender o que se passou. Mesmo que tenha sido zoonose [a passagem de um vírus de um animal para os seres humanos], não sabemos realmente o que foi. Os humanos obcecam com a descoberta de um culpado. Mas o culpado real somos nós, não são os morcegos”, apontou.

“A melhor defesa contra a próxima pandemia é a conservação da biodiversidade e a proteção dos ecossistemas. Quando se tem uma paisagem e um ecossistema completo, com todas as suas plantas e animais, os patogénicos estão diluídos, há tantas espécies que não desenvolvem grandes populações e não há surtos de doença”, acrescentou.

No entanto, “os humanos chegam, começam a mover as espécies, a cortar as grandes árvores, a matar os grandes predadores e a simplificar o ecossistema, permitindo que as populações de certas espécies oportunistas disparem, tal como os seus patogénicos”, frisou.

A Cimeira Global da Exploração, que juntou exploradores e cientistas de mais de 30 países presencial e virtualmente, terminou hoje em Ponta Delgada, depois de ter começado na terça-feira passada em Lisboa.

A pandemia de covid-19 provocou pelo menos 4.013.756 mortos em todo o mundo, resultantes de mais de 185,5 milhões de casos de infeção pelo novo coronavírus, segundo o balanço mais recente feito pela agência France-Presse.

Em Portugal, desde o início da pandemia, em março de 2020, morreram 17.142 pessoas e foram registados 902.489 casos de infeção, de acordo com a Direção-Geral da Saúde.

A doença respiratória é provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2, detetado no final de 2019 em Wuhan, uma cidade do centro da China, e atualmente com variantes identificadas em países como o Reino Unido, Índia, África do Sul, Brasil e Peru.





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