Investigador português descobre nova espécie de conífera fossilizada em Leiria
Mário Miguel Mendes, investigador do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE) da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, descobriu uma nova espécie de conífera do período conhecido como Cretácico Inferior no Juncal, localidade de Leiria.
Esta nova espécie foi batizada com o nome Pseudofrenelopsis zlatkoi, em homenagem a Zlatko Kvaček, “eminente paleobotânico checo que enormes contributos deu aos estudos da flora cretácica”, e que faleceu em 2020, aos 83 anos, vítima de COVID-19, explicou à ‘Green Savers’ o investigador português. A descoberta será divulgada num artigo que será publicado na revista ‘Review of Palaeobotany and Palynology’ em fevereiro do próximo ano.
Integrada na família Cheirolepidiaceae, já extinta, a espécie, encontrada em estado fossilizado, exibe semelhanças com uma outra planta desse mesmo grupo, a Pseudofrenelopsis parceramosa, mas apresenta “entrenós sulcados e a sua morfologia é espelhada na disposição das estruturas epidérmicas, tendo geralmente cristas construídas por células epidérmicas ordinárias alongadas”, descreve Mário Mendes.
Há aproximadamente 320 milhões de anos, Portugal contava com “cordilheiras de montanhas com lagos envolvidos e habitados por vegetação rica e diversificada”, como cavalinhas gigantes (Calamites) e outras plantas relacionadas com os atuais licopódios e selaginelas, mas de porte arbóreo, bem como “coníferas que lembravam araucárias”, assinala o investigador.
Da paisagem floral, continua o cientista, faziam também parte fetos, que “eram particularmente abundantes e diversificados”, além de plantas que, apesar de se parecerem morfologicamente com os fetos, “produziam órgãos que apenas se distinguiam de sementes por não passarem por estádio de vida latente”.
Toda essa vegetação proliferava em ambientes pantanosos, “sob influência do clima húmido e relativamente quente das áreas situadas próximo do equador da Terra de então”, diz Mário Mendes, apontando que “são desta altura muitos dos depósitos de carvão mundiais”, incluindo os que encontramos hoje em Portugal.
Contudo, no Paleozoico Superior, o clima do planeta sofreu profundas alterações as massas continentais colidiam entre si para formar o supercontinente conhecido como Pangeia. “Os climas continentalizaram-se, gerando condições adversas para a vegetação”, explica Mário Mendes, e “muitas das plantas extinguiram-se e acompanharam o empobrecimento generalizado da vida no final do Paleozoico”, há perto de 300 milhões de anos.
Mas a vida conseguiu recuperar, e no Triásico, grandes áreas semidesérticas nos continentes foram conquistadas por plantas que migravam a partir de zonas onde existiam lagos. No Jurássico, há cerca de 200 milhões de anos, eram as coníferas que “dominavam a vegetação arbórea”, ainda que algumas se tenham extinguido no final do Mesozoico.
Por fim, no Cretácico, há 140 milhões de anos, assistiu-se ao desenvolvimento de plantas aparentadas às Gnetales dos dias de hoje, bem como de algumas outras já desaparecidas, como as Erdtmanithecales, que são “abundantes no registo fóssil da região do Juncal”, contou-nos o investigador.
É a esse período que pertence a Pseudofrenelopsis zlatkoi agora descoberta, sendo que a família de coníferas a que pertenceu, a Cheirolepidiaceae, extinguiu-se devido, sobretudo, a “alterações com caráter climático”.
Destaca Mário Mendes que “Portugal, a nível global, é uma região que reúne condições excelentes para o estudo destes temas”, porque no país se pode encontrar uma “boa representatividade do Cretácico”, um período de grande produtividade de fósseis de plantas. Essa riqueza de vestígios da flora do passado distante “permite acompanhar a evolução florística desde o Cretácico inferior, com predomínio das gimnospérmicas e das pteridófitas, até o Cretácico superior, onde as angiospérmicas rapidamente colonizaram praticamente todos os ecossistemas terrestres”.
“Os estudos da vegetação cretácica portuguesa são essenciais para o conhecimento das etapas iniciais de desenvolvimento das plantas com flor (angiospérmicas) e para a caracterização dos paleoambientes e dos paleoclimas em que viveram, possibilitando uma contribuição fundamental para o estabelecimento das mudanças globais ocorridas em momento particularmente significativo da história da Terra”, salienta o investigador.
O estudo da flora do Cretácico português tem vindo a ser desenvolvido em parceria com várias instituições internacionais, como o Museu Sueco de História Natural, em Estocolmo, a Universidade de Aarhus (Dinamarca), a Universidade de Yale (Estados Unidos da América) e o Museu Nacional de Praga (República Checa).
Na semana passada, foi divulgado na revista ‘Fossil Imprint’ um outro artigo, no qual participou também Mário Mendes, que se debruçou sobre as plantas angiospérmicas do Cretácico inferior em Portugal.
Fruto de um trabalho de aproximadamente três anos, foram descritos cinco novos géneros e seis novas espécies dessas plantas que eram, até agora, desconhecidas da Ciência.