Metade das florestas tropicais destruídas para a agricultura não têm qualquer uso



A expansão das atividades agrícolas, especialmente que acontecem a uma escala industrial, é apontada como uma das principais causas da destruição das florestas tropicais, microcosmos de uma vasta diversidade de formas de vida e habitats naturais.

Uma nova investigação, que juntou cientistas de vários países, mostra agora que, apesar de mais de 90% dessa desflorestação tropical ser impulsionada, direta ou indiretamente, pela agricultura, só entre 45% e 65% das áreas desflorestadas são usadas para expandir as explorações agrícolas.

Florence Pendrill, da Chalmers University of Technology, na Suécia, e primeira autora do artigo publicado em setembro na revista ‘Science’, confessa-se “surpreendida” pela descoberta, que resultou da análise de dados recolhidos em estudos anteriores.

A especialista diz que os números a que a equipa científica internacional chegou são de “uma profunda importância” no desenvolvimento e implementação de medidas que tenham como objetivos reduzir a destruição das florestas e “promover um desenvolvimento rural sustentável”.

Então, o que explica que áreas florestais tropicais sejam desflorestadas ‘para nada’? Patrick Meyfroidt, da Université Catholique de Louvain, na Bélgica, e outro dos autores, sugere que parte das zonas desflorestadas que depois acabam por não ter qualquer uso estariam destinadas a projetos especulativos que foram abandonados ou que teriam solos que não eram adequados à prática agrícola. Outra razão pode estar relacionada com os fogos que são ateados para ‘limpar’ porções de floresta, que acabaram por se descontrolar e queimar áreas para as quais não havia planos.

Os investigadores acreditam que os resultados deste estudo fornecem informação de grande relevância para os decisores políticos, para que sejam implementadas medidas para travar as causas da desflorestação, bem como os interesses que alimentam essa prática destrutiva e que coloca em risco a diversidade de formas de vida, de habitats e de ecossistemas, e também a estabilidade do clima da Terra e a própria saúde e sobrevivência das comunidades humanas.

Dessa forma, defendem que sejam criadas proibições às importações de matérias-primas que tenham resultado de desflorestação. Recorde-se que ainda este mês a Comissão Europeia anunciou que o Parlamento Europeu e o Conselho tinham chegado a um “acordo político provisório” para a criação de um regulamento comunitário para garantir que “os bens que são colocados no mercado da [União Europeia] deixam de contribuir para a desflorestação e para a degradação das florestas na UE e em todo o mundo”.

Ainda assim, apesar de considerarem esse tipo de medidas positivas e passos importantes que têm de ser dados, os especialistas dizem que o foco deve estar no reforço da proteção das florestas nos países produtores, onde acontece a desflorestação. Caso contrário, o problema manter-se-á.

“Os resultados do estudo assinalam a necessidade de as intervenções ao nível das cadeias de abastecimento irem além de um foco em matérias-primas específicas e na gestão de riscos”, argumentam os autores, pois só assim será possível “impulsionar parcerias genuínas entre os mercados produtores, consumidores e os governos”. Criar incentivos à agricultura sustentável, tornando-a economicamente atrativa, e desincentivar a destruição das florestas para a expansão de terrenos agrícolas devem ser as principais prioridades, além de apoiar os pequenos agricultores, cujos impactos na floresta são mais reduzidos e que, por norma, orientam-se por práticas em maior harmonia com a natureza da qual dependem.

Mas para travar a perda das florestas tropicais é preciso conhecer o que se passa no terreno. Os investigadores alertam que, além das produções de óleo de palma e de soja, pouco se conhece sobre a cobertura e os ritmos de expansão de outras explorações agrícolas nessas áreas.

Martin Persson, que também assina o artigo, diz que esta falta de conhecimento científico e preciso levanta grandes obstáculos “à nossa capacidade para reduzir a desflorestação da forma mais eficaz”.





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