Alimentação à base de moluscos fez algumas cobras perderem a ‘mordedura venenosa’



Algumas espécies de cobras terão perdido parcial ou totalmente o seu aparelho de injeção de veneno por terem evoluído uma dieta à base de invertebrados cujos corpos estão cobertos de muco, como caracóis, lesmas e minhocas.

A conclusão é de uma investigação de cientistas do Brasil, Costa Rica e México, que estudaram a evolução do aparelho das cobras que permite injetar toxinas nas suas presas, desde a glândula produtora até aos dentes que inoculam o veneno. O trabalho abrangeu no total mais de 30 espécies de cobras que perderam totalmente essas estruturas.

Esse grupo de cobras, conhecidas informalmente também como goo-eaters (“comedoras de gosma”, numa tradução literal para português) por se alimentarem de invertebrados que produzem substâncias mucosas que cobrem a sua pele, segregam, a partir de glândulas na mandíbula (as glândulas de veneno localizam-se na maxila, na parte superior da boca), compostos que se suspeita que ajudarão a degradar esse muco e facilitam a ingestão da presa.

“As lesmas produzem um muco muito pegajoso capaz de colar as bocas de outros animais. Não é qualquer serpente que consegue comer uma lesma, por mais que pareça superinofensivo. Ela tem adaptações que não permitem ser comida por qualquer animal”, explica Leonardo de Oliveira, do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo e primeiro autor do artigo publicado na revista ‘Systematics and Biodiversity’.

Ainda assim, não seriam consideradas espécies venenosas, uma vez que essas se caracterizam, geralmente, por injetarem veneno através de dentes especializados na parte frontal da boca, embora existam outras, como a Imantodes cenchoa, cujo veneno é injetado por dentes localizados no fundo da sua boca. As cobras goo-eaters não possuem esse aparelho especializado.

A capacidade para injetar veneno está limitada a um grupo restrito de cobras, sendo que algumas procuraram contornar a falta dessa ‘arma tóxica’, adotando comportamentos de captura de presas como a constrição (anacondas e jiboias, por exemplo) e outras que se alimentam de moluscos, como as que foram alvo desta investigação.

Estima-se que, em todo o mundo, existam 300 espécies de cobras que não têm glândula de veneno, nem, por isso, dentes inoculadores.

O objetivo destes investigadores é prosseguir os estudos destas cobras goo-eaters e perceber o que terá levado, no decurso da sua evolução, à perda do aparelho de injeção de veneno e como as glândulas na mandíbula, que teoricamente ajudarão a degradar o muco dos moluscos, permite aos répteis caçar e alimentar-se de lesmas e caracóis.





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