Mineração em mar profundo: Organizações ambientalistas saúdam “tomada de posição precaucionária” do Governo



O Governo português defendeu esta sexta-feira uma pausa precaucionária à exploração e extração de minerais em águas internacionais. A posição foi tomada publicamente na Jamaica, onde representantes de vários Estados estiveram reunidos esta semana para uma sessão do Conselho da Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA), responsável pela regulamentação da mineração em mar profundo.

Em reação, as organizações não-governamentais de Ambiente (ONGA) portuguesas ANP|WWF, Sciaena e Sustainable Ocean Alliance (SOA) “congratulam o Governo português pelo apoio a uma pausa precaucionária à mineração em mar profundo”, informam em comunicado, explicando que tal se deveu à “ausência de regulamentação e devido ao conhecimento científico insuficiente”, que “ainda não permite a avaliação efetiva desta atividade, nem garante que os eventuais impactos decorrentes dessa atividade sejam plenamente compreendidos e não causem efeitos nocivos no ambiente marinho”.

A mineração em mar profundo destina-se a extrair minerais como cobre, cobalto, níquel ou manganês do fundo do mar, com maquinaria pesada a operar em condições muito adversas e arriscadas (elevada profundidade e sujeitas a grande pressão), destruindo localmente ecossistemas e perturbando outros a largas centenas de quilómetros em redor. Apesar de o conhecimento científico ser ainda escasso sobre os possíveis impactos ambientais e ecológicos dessa atividade, as ONGA afirmam que “sabe-se que se a indústria avançar, a intensidade e os métodos de mineração poderão destruir habitats completos, extinguir espécies e comprometer os benefícios dos ecossistemas para a Humanidade, prejudicando também as populações locais, principalmente as comunidades costeiras, sob o falso pretexto da transição energética”.

As organizações portuguesas recordam que a posição agora tomada pelo Governo surge “depois de mais de um ano de silêncio” sobre a mineração em mar profundo, mas “respondeu finalmente ao apelo de personalidades, cientistas e Organizações Não-Governamentais de Ambiente (ONGA)”. Assim, Portugal junta-se, por fim, “à lista crescente de nações que defendem pausas precaucionárias ou moratórias ao início desta atividade em águas internacionais”.

Em nota, recordam que, em março deste ano, “30 personalidades assinaram uma Carta Aberta endereçada ao Governo português apelando a que a mineração em mar profundo seja considerada inviável, não apenas nas áreas mais vulneráveis, de alta biodiversidade ou áreas protegidas, mas em todo o oceano”.

Adicionalmente, lembram que no mesmo mês, o Governo Regional dos Açores havia concordado publicamente com uma moratória a essa atividade, com o secretário regional do Mar e das Pescas, Manuel São João, a declarar que “a mineração do mar profundo nesta região, com os alertas em uníssono da comunidade científica, é incompatível com o que desejamos e defendemos para o maior património dos Açores: o nosso mar”.

Para Catarina Grilo, diretora de Conservação e Políticas da ANP|WWF, “ao apoiar uma pausa precaucionária à mineração em mar profundo, o Governo português aponta finalmente para um caminho de coragem política há muito reivindicado pela sociedade civil: o da responsabilidade e compromisso para com a preservação dos ecossistemas marinhos, acima dos interesses económicos de uma atividade que apenas beneficiaria as empresas de mineração”.

Ana Matias, coordenadora de Clima e Poluição da Sciaena, aponta que, no seguimento da posição tomada pelo Governo português, “há que continuar o trabalho diplomático junto de todos os Estados para que esta seja uma posição comum e dominante no seio das Nações Unidas”.

A responsável espera que o executivo liderado pelo Primeiro-ministro António Costa “assuma a mesma posição a nível nacional, protegendo os ecossistemas de mar profundo nacionais, em particular a rica biodiversidade do mar profundo dos Açores”.

Eugénia Barroca, representante da SOA para a Europa e Lusofonia, observa que “contamos que as propostas de alteração da Lei de Bases do Ordenamento do Espaço Marítimo que estão em cima da mesa contemplem desde já a moratória, e que a Assembleia da República trave também a regulamentação da mineração em mar profundo estranhamente incluída na Lei de Bases do Clima à última da hora”.

Recorde-se que, em 2021, o Estado insular Nauru, no oceano Pacífico, desencadeou o que ficou conhecido como a ‘regra dos dois anos’, depois de declarar que pretendia apresentar um pedido em nome de uma empresa para obter uma licença para explorar o mar profundo em fundos internacionais.

Explicam as ONGA portuguesas que essa regra estabelece que, após os dois anos, todos os pedidos devem ser considerados para “aprovação provisória”, abrindo-se assim portas a esta “atividade nociva”.

No entanto, o Conselho da ISA não chegou a acordo sobre as consequências da não adoção dos regulamentos, deixando o processo em torno da mineração em mar profundo num “caminho de incerteza jurídica”.

“Organizações de todo o mundo apelam agora aos Governos para que sejam firmes numa tomada de posição contra esta atividade, salvaguardando a biodiversidade em detrimento dos interesses económicos. São já 21 os países a cumprir este apelo”, salientam.





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