Chef português na Finlândia alarga conceito de restauração sem desperdício



Depois do ‘Nolla’, o primeiro restaurante de desperdício-zero nos países nórdicos, o chef Carlos Henriques já abriu em Helsínquia mais dois novos espaços, um deles com sabores portugueses, e sonha agora escrever um livro sobre o conceito.

A equipa dos três restaurantes – normalmente de 36 pessoas e que aumenta para 50 funcionários no verão – já conta com seis portugueses, disse o chefe de cozinha à Lusa, em Helsínquia.

“De longe, Portugal é o país de onde nos chegam mais currículos”, referiu Carlos Henriques, ilustrando a curiosidade de cozinheiros portugueses no restaurante.

O ‘Nolla’ (zero, em finlandês), de que Carlos Henriques é coproprietário, juntamente com um chef sérvio e outro espanhol, abriu em 2018 na capital finlandesa, sendo o primeiro restaurante ‘zero-waste’, um conceito que é aplicado à confeção, procurando a utilização máxima do produto, mas também aos fornecedores e roupas utilizadas pela equipa.

“Quando começámos, as pessoas não tinham ideia do que estávamos a fazer”, descreveu o português, a viver na Finlândia há 12 anos.

A preocupação com o ambiente valeu ao ‘Nolla’ uma estrela verde do guia Michelin, que distingue o compromisso com a sustentabilidade. Além disso, é um restaurante ‘Bib Gourmand’ da Michelin, atribuído a estabelecimentos com uma boa relação qualidade/preço.

“Usamos o bom senso para evitar o desperdício que, com o tempo, se torna uma tendência de que todos beneficiam. É doloroso ver o desperdício e a negligência e, uma vez feito, não podemos voltar atrás. É simplesmente uma mentalidade e, para nós, é agora uma rotina diária”, justificam, no ‘site’ da Michelin.

Os fornecedores são produtores locais que “trabalham em harmonia com a natureza” e evitando o uso de embalagens.

“O fornecedor de batatas entrega em sacas que guardamos aqui, o leite vem em leiteiras, o óleo é comprado à tonelada e usamos os nossos próprios vasilhames. Vinagre somos nós que fazemos. Os copos são garrafas de vidro cortadas”, exemplificou.

No ‘Nolla’, praticam uma cozinha mediterrânea apenas com produtos “que crescem” na Finlândia, algo que Carlos Henriques assume ser “um desafio”.

“É como tentar cozinhar em casa, mas não há limões, não há azeite, não há ervas aromáticas no inverno”, relatou.

A confeção, disse, também é “um bocadinho mais pré-industrial” – não cozinham em vácuo, por exemplo. “Usamos frigideiras”.

O compromisso com o desperdício-zero envolve uma monitorização e uma reflexão permanentes.

Cada chef tem, na sua bancada, uma caixa transparente onde coloca o desperdício.

“Quando vamos deitar fora, temos de responder a quatro perguntas: quem sou eu, o que estou a deitar fora, porquê e quanto. A cada 15 dias, pensamos o que podemos melhorar, se as porções são demasiado grandes, qual é o tamanho do menu, se estamos a descascar algo e precisamos mesmo de o fazer. O que importa é que haja uma progressão”, relatou.

O (pouco) desperdício orgânico é transformado num compostor próprio e o composto é depois entregue aos produtores, como adubo. As roupas da equipa vêm de restos de lençóis de um hospital ou são feitas em algodão 100% reciclado.

Depois do ‘Nolla’, a equipa de cozinheiros abriu o ‘Elm’ (ulmeiro, as árvores que se avistam da janela do restaurante), onde os sabores portugueses estão mais presentes.

Esta semana, foi a vez de inaugurar o ‘Nolita’, uma padaria que também serve comida “baseada no pão e massas”, feitos no local.

Agora, a equipa tem “o sonho” de escrever um livro sobre o conceito de ‘desperdício-zero’.

“Acho que ainda não tivemos tempo de refletir sobre todos os processos que desenvolvemos”, disse Carlos Henriques, referindo que “não há assim tantos livros profissionais”.

O trabalho, garantem, nunca acaba: “Continuamos a tentar melhorar todos os dias”, disse o chef português, admitindo que “é muito difícil mudar hábitos”.





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