Plantas com flor podem estar a recorrer à auto-polinização para compensar falta de insetos
Alguns animais e plantas têm relações íntimas em que ambos saem a ganhar. É o caso da polinização, em que insetos, os principais agentes bióticos de polinização, se alimentam do néctar das plantas com flor e essas, por sua vez, depositam os seus grãos de pólen, que são as suas células sexuais, no corpo desses artrópodes, que os levam até outras plantas e, assim, veem a sua reprodução realizada.
No entanto, os insetos são um dos grupos de seres vivos mais ameaçados do planeta, com alguns observadores a descreverem a grande e acelerada perda desses animais como um ‘apocalipse dos insetos’. Sendo que se estima que cerca de 80% das espécies vegetais usadas pelos humanos dependem, direta ou indiretamente, dos insetos polinizadores, a escassez crescente de insetos poderá ter graves consequências económicas e em termos de segurança alimentar.
Mas as plantas com flor podem estar a tentar adaptar-se a um mundo com cada vez menos insetos e a procurar novas estratégias para assegurarem a sua reprodução.
Uma equipa de investigadores da Universidade de Montpellier, em França, descobriu que algumas espécies de plantas com flor estão a recorrer à auto-polinização para compensarem a falta de insetos polinizadores e garantir a sua própria reprodução.
A investigação procurou estudar a evolução dos métodos reprodutivos de uma espécie de violeta, a Viola arvenses, ao longo de 20 anos na região de Paris “para testar se o sistema de reprodução desta espécie evoluiu em resposta aos recentes declínios de polinizadores”, escrevem os cientistas num artigo publicado na revista ‘New Phytologist’.
Os resultados mostram que as flores das V. arvenses de hoje são 10% mais pequenas, produzem 20% menos néctar e são menos visitadas por polinizadores do que os seus antepassados. Os autores atribuem essas diferenças ao “declínio das populações de polinizadores na Europa”, recordando, por exemplo, que mais de 75% da biomassa de insetos voadores desapareceu das áreas protegidas na Alemanha nos últimos 30 anos.
A equipa fala de um ciclo vicioso, em que a diminuição do número de insetos faz com que as plantas produzam menos néctar, o que por sua vez intensifica a perda de polinizadores por escassez de alimento.
Como tal, os investigadores salientam, em comunicado, “a importância de implementar medidas para contrariar este fenómeno o mais rapidamente possível, e para assegurar as interações entre plantas e polinizadores, que existem há milhões de anos”.
Além de potenciar o agravamento da perda de polinizadores, ao recorrerem à auto-polinização, a diversidade genética das populações e das espécies de plantas com flor será reduzida, não apenas comprometendo a sua capacidade de adaptação às alterações ambientais, mas também o normal funcionamento dos ecossistemas dos quais fazem parte.
Algumas correntes científicas acreditam que a transição para a auto-polinização é um ‘beco sem saída’, ou seja, é uma adaptação que não pode ser revertida. Ainda assim, estes investigadores dizem que é preciso perceber se esse é realmente o caso e se é possível restabelecer interações perdidas entre insetos e plantas. Além disso, defendem que é igualmente importante compreender se essa é uma adaptação limitada a algumas espécies de plantas com flor ou um fenómeno mais abrangente e generalizado.