Pêlo oleoso: O segredo dos ursos-polares para sobreviverem nos ambientes mais extremos do planeta
Para muitos humanos, ter cabelos oleosos é uma inconveniência, e prova disso são os inúmeros produtos cosméticos que têm como finalidade precisamente reduzir a gordura produzida pelo couro cabeludo. Contudo, para alguns animais não-humanos isso é fundamental para a sua sobrevivência.
É o caso dos ursos-polares (Ursus maritimus). Este grande mamífero, ícone dos ambientes gelados da região ártica e um dos maiores símbolos da crise climática, tem o seu pêlo grosso impregnado de sebo. Essa gordura, produzida pelo corpo do animal e composta por colesterol, ácidos gordos e diglicerídeos, impede a formação de gelo no seu pêlo, mantendo os ursos quentes e permitindo-lhes enfrentar as temperaturas gélidas do Ártico.
A descoberta foi feita por um grupo internacional de investigadores liderado pela Trinity College Dublin (Irlanda) e divulgada recentemente na revista ‘Science Advances’.
Ao realizarem análises bioquímicas a pêlos de ursos-polares recolhidos, entre março de abril de 2022, de seis indivíduos (três machos e três fêmeas) de uma população residente no arquipélago norueguês de Svalbard, os cientistas ficaram surpreendidos por não encontrarem vestígios de esqualeno, uma substância oleosa presente nos pêlos de outros mamíferos aquáticos, como as lontras, e até nos cabelos humanos.
Por isso, concluem que a ausência de esqualeno é “muito importante” para impedir que a formação de gelo na pelagem espessa dos ursos-polares.
Richard Hobbs, um dos coautores do artigo, destaca que, além de ser o primeiro a estudar a composição do sebo do pêlo dos ursos-polares, este estudo permite também identificar a razão pela qual esses animais não sofrem com a acumulação de gelo.
“Apesar de possuírem espessas camadas isolantes de gordura e pêlo, e de passarem longos períodos na água a temperaturas abaixo dos zero graus, parece que a gordura do pêlo permite aos ursos-polares livrarem-se facilmente do gelo quando se forma, devido à reduzida aderência do seu pêlo”, explica o investigado, citado em comunicado. Assim, bastam umas quantas sacudidelas e o animal consegue repelir os cristais gelados do seu corpo, mantendo-se quente.
Além de aprofundar o conhecimento sobre os ursos-polares, os autores acreditam que os resultados da investigação podem ter aplicações práticas, especialmente no desenvolvimento de novos produtos relacionados com atividades que decorram em zonas geladas, como o ski.
Os autores acreditam que a composição do sebo capilar desses gigantes brancos pode ajudar a criar substâncias isoladoras mais sustentáveis, que podem substituir químicos nocivos usados atualmente na impermeabilização de múltiplos materiais e objetos.
Além disso, os cientistas argumentam ainda que o sebo do pêlo dos ursos-polares ajuda-os a reduzir o ruído produzido quando caçam presas na água gelada e também a reduzir o atrito, tornando-os mais velozes.
As propriedades anti-gelo da pelagem dos ursos-polares não são novidade para os povos humanos tradicionais que coexistem com eles hás muitos e muitos anos. Os Inuítes, segundo os investigadores, usam o pêlo desse animal para produzirem uma série de objetos que lhes permitem reduzir os ruídos quando em caçadas, tornando-os mais eficazes na perseguição de presas, como as focas.