“Estilos” musicais das populações de aves mudam ao longo do tempo

As melodias extraordinariamente variáveis e complexas são um dos traços mais distintivos das aves canoras. Embora nos deleite, essa forma de comunicação não evoluiu para os ouvidos humanos, mas para, por exemplo, transmitir informações sobre predadores e alimentos, para conquistar parceiros e afastar rivais, entre outras funções.
Tal como as nossas próprias formas de comunicação não foram sempre as mesmas e estão em constante transformação, também as canções das aves evoluem ao longo do tempo. E foi precisamente para tentar descobrir que fatores influenciam essa evolução que um grupo de investigadores analisou mais de 20 mil horas de gravações áudio de chapins-reais em contexto selvagem (Parus major) na região de Oxfordshire, no Reino Unido.
A investigação, de cientistas do Instituto Edward Grey, da Universidade de Oxford, passou pela identificação de mais de 100 mil canções diferentes emitidas pelos chapins-reais, recorrendo a Inteligência Artificial para identificar aves individuais e detetar diferenças nas canções cantadas por uns e por outros.
Num artigo publicado recentemente na revista ‘Current Biology’, os investigadores parecem aludir a uma espécie de “cultura melódica” nas populações de chapins. Os resultados revelam que as aves com idades semelhantes tendem a ter repertórios musicais muito parecidos, ao passo que grupos com várias faixas etárias mostram uma maior diversidade de canções.
Além disso, os cientistas perceberam que o surgimento ou desaparecimento de canções está intimamente ligado à chegada ou à partida de indivíduos. Quanto uma ave morre ou deixa o grupo, vários tipos de canções desaparecem também, e os jovens que ocupam o lugar deixado vago trazem consigo novas “modas” e promovem a adoção de novas canções pelo grupo.
Tal como em muitas outras sociedades, incluindo as humanas, os indivíduos mais velhos são repositórios de saberes que se vão transformando ou perdendo com o tempo.
Os cientistas notaram que aves com mais idade cantam canções que, com o tempo, se vão tornando menos frequentes na população, pelo que consideram que esses anciãos mantêm viva a memória cultural do grupo. Dessa forma, podem transmitir aos mais novos essas velhas canções, tal como nós, humanos, aprendemos com os nossos avós lengalengas, canções e histórias de tempos passados.
A localização do grupo também influencia o repertório musical dos indivíduos. As aves que se mantêm perto dos locais onde nasceram tendem a ter culturas musicais mais diversas e únicas, com os investigadores a comprarem tal com as comunidades humanas isoladas que muitas vezes desenvolvem dialetos próprios e estilos musicais distintos.
“Tal como as comunidades humanas desenvolvem dialetos e tradições musicais distintas, algumas aves também têm culturas de canto locais que evoluem ao longo do tempo”, explica, em comunicado, Nilo Merino Recalde, primeiro autor do artigo.
“O nosso estudo mostra precisamente como as dinâmicas populacionais – as chegadas e partidas de aves individuais – afetam esse processo de aprendizagem cultural, influenciando quer a diversidade de canções como o ritmo da mudança”, acrescenta o investigador.