Águas interiores em todo o mundo estão a perder oxigénio

Por todo o planeta, os corpos de águas interiores, como rios, lagos e albufeiras, estão a perder oxigénio, e a culpa, dizem os cientistas, é dos humanos.
Um grupo de investigadores da Universidade de Utrecht (Países Baixos) criou o que descreve como o primeiro modelo global que descreve todo o ciclo de oxigénio de águas interiores a nível mundial.
Jack Middelburg, um dos principais autores do artigo publicado recentemente na revista ‘Science Advances’, explica que “com este modelo, fornecemos a compreensão mais completa possível deste ciclo em grande escala, de modo que se possa prever o surgimento de problemas relacionados com o oxigénio, conhecer as suas causas e, com sorte, intervir a tempo”.
Embora as águas interiores sejam consideradas “pulmões”, na medida em que tradicionalmente libertam oxigénio na atmosfera e, por outro lado, capturam e armazenam carbono, os investigadores alertam que esse delicado equilíbrio parece estar a desaparecer, com esses corpos de água a consumirem mais oxigénio do que aquele que produzem.
De acordo com o estudo, as atividades humanas estão no cerne da disrupção desse equilíbrio. “Mais agricultura, mais águas residuais, mais represas e um clima mais quente – todos eles mudam a função dos nossos ecossistemas de água doce”, explica Junjie Wang, primeira autora.
À medida que cada vez mais nutrientes escorrem para os rios, lagos e albufeiras, maior é a produtividade das algas. Embora organismos fotossintéticos que absorvem dióxido de carbono e libertam oxigénio, as algas, quando morrem e se decompõem consomem “quantidades enormes de oxigénio”, dizem os cientistas.
Middelburg salienta que a adição de nutrientes nos corpos de águas interiores provenientes, por exemplo, de escoamentos de explorações agrícolas que usam fertilizantes em excesso “é uma das principais causas” desse desequilíbrio. Além disso, aponta que também a construção de represas e barragens, que desacelera a velocidade dos cursos de água doce para os mares, é também um fator de peso.
Mas também causas humanas indiretas são apontadas pelos investigadores, designadamente o aumento da temperatura do planeta, que reduz a quantidade de oxigénio dissolvido na água, torna mais lento o transporte de oxigénio ao longo da coluna de água e promove processos que o consomem mais rapidamente.
“Até agora, o consenso na literatura científica tem sido sempre do de que o aumento da temperatura é a principal causa desta aceleração”, afirma, citada em nota, Junjie Wang, “mas o nosso modelo mostra que o aquecimento apenas cerca de 10-20% para este fenómeno”.
Os investigadores dizem que o ciclo de oxigénio nas águas interiores atualmente não tem nada a ver com aquilo que era no início do século passado, e estimam que removam agora quase mil milhões de toneladas de oxigénio todos os anos da atmosfera, cerca de metade da quantidade produzida pelos oceanos.
“Não podemos continuar a ignorar as águas interiores nos orçamentos globais do clima e do oxigénio”, avisa Junjie Wang. “Elas estão a alterar-se mais rapidamente do que pensávamos e são peça cruciais do puzzle do sistema terrestre.”