Cacifos solidários ajudam sem-abrigo de Lisboa (com FOTOS)
Alguma vez pensou que os sem-abrigo também têm pertences pessoais? E que, não tendo abrigo, não têm onde os guardar e tornam-se mais vulneráveis a assaltos? Esta é uma preocupação que assola diariamente quem vive na rua. E é a pensar nela que nasceram os cacifos solidários, destinados aos sem-abrigo de Lisboa.
O projecto é da responsabilidade da Associação Conversa Amiga (ACA), que desenvolve a sua acção junto das pessoas sem-abrigo da capital.
Duarte Paiva é o coordenador deste projecto. Arquitecto de formação, este voluntário lida há sete anos com sem-abrigo e percebeu que cuidar dos seus bens é uma tarefa árdua para a maioria. “Já não consigo contar a quantidade de vezes que me disseram que foram roubados e ficaram sem as suas coisas, que a chuva lhes levou os cobertores ou que não se podem deslocar porque não podem carregar os seus pequenos mas importantes pertences”, explica Duarte ao Green Savers.
Foi quando um sem-abrigo partilhou que, por vezes, arrumava as suas coisas dentro de cacifos de supermercados que se fez luz – por que não criar locais onde as pessoas sem tecto possam guardar os seus bens, evitando andar carregadas ou ficar presas ao mesmo sítio pela impossibilidade de os transportarem?
Segundo Duarte, os cacifos solidários podem melhorar em muito a vida destas pessoas, proporcionando-lhes dignidade e segurança. “Não é um incentivo para permanecerem na rua, mas sim uma responsabilidade”, defende o coordenador do projecto.
Os cacifos vão ainda permitir um ponto de correio entre instituições e beneficiários. Não descartando a importância de haver alternativas que permitam às pessoas sair da rua, Duarte acredita que também se devem garantir algumas condições enquanto esse processo ocorre – às vezes, durante anos.
Os possíveis beneficiários da iniciativa, em contacto com a ACA, têm reagido de forma muito favorável. “Alguns ficam surpreendidos com a ideia mas aderem logo – e a possibilidade de terem uma chave é-lhes muito importante.”
O projecto-piloto vai arrancarem S. Jorge de Arroios, em Lisboa, por ser uma área onde a ACA actua. Numa fase inicial, serão seleccionadas para terem um cacifo as pessoas que a associação já conhece e acompanha na área.
A necessidade do equipamento nesta zona é inquestionável, pelo número de sem-abrigos existente e pela ocorrência de alguns conflitos com moradores, por questões ligadas a pertences presentes no espaço público. Além disso, existe um espaço que parece ser o ideal para a implementação do equipamento, quase em frente a uma esquadra da PSP – o que garante ainda mais segurança.
Espera-se assim que, ainda durante este ano, Arroios receba 14 cacifos metálicos. Mas uma das principais dificuldades tem sido encontrar empresas disponíveis para fabricar os equipamentos. “Contactamos dezenas de empresas e apenas duas responderam no sentido de nos darem um orçamento. É algo que nos incomoda, saber que há pouca abertura das empresas em querer participar num projecto como este”, diz Duarte.
Os maiores desafios nesta ideia colocam-se também ao nível de financiamento. A ACA está neste momento à procura de apoios, sendo que o projecto está dependente da ajuda da Câmara Municipal de Lisboa – ainda em deliberação – ou de outros financiadores.
“A ideia é que estes equipamentos sejam propriedade da cidade de Lisboa”, afirma Duarte. O objectivo a longo prazo passa por abranger o máximo de área possível, dentro das necessidades. Depois, quem sabe, partir para outros pontos do país e até da Europa.
A ACA foi vencedora dos Prémios Do Something 2011, na categoria Comunidade, e promete continuar a trabalhar na melhoria das condições de vida dos mais frágeis. Fique atento: estes cacifos amarelos podem não estar longe de se tornarem numa marca solidária da nossa capital.