“Compras públicas sustentáveis estão abaixo dos 20%” (com ENTREVISTA)
Financiado pelo Life+ e coordenado, em Portugal, pelo LNEG (Laboratório Nacional de Energia e Geologia), o projecto Building SPP pretende promover as compras públicas sustentáveis na Europa. Portugal é dos países com percentagens mais baixas de compras públicas sustentáveis – abaixo de 20% – e o Green Savers foi perceber porquê junto da investigadora do LNEG e coordenadora do projecto em Portugal, Paula Trindade.
O que é o projecto Building SPP e quais as principais conclusões até agora?
O projeto Building-SPP pretende desenvolver e implementar actividades que resultem na promoção e integração de práticas de compras sustentáveis em Portugal e Grécia, através da assistência às autoridades públicas na definição de uma estratégia de compras que contribua para as suas políticas ambientais e sociais: do fomento e cooperação entre autoridades públicas; e da promoção de um maior envolvimento entre autoridades públicas e fornecedores.
O projecto desenvolveu e testou metodologias e instrumentos para definir estratégias de compras que contribuam para os objectivos e compromissos decorrentes das políticas ambientais e sociais das organizações em projetos-piloto. Por outro lado, promoveu a sensibilização, colaboração e formação dos compradores e fornecedores em Compras Sustentáveis.
O projecto é financiado pelo Programa LIFE+ e consiste numa parceria envolvendo especialistas de organizações em Portugal e na Grécia.
Quais os principais resultados desta fase da iniciativa?
O projecto Building SPP teve uma vertente eminentemente prática, pois o principal objectivo era demonstrar às autoridades públicas que é possível fazer compras sustentáveis em Portugal, fazê-lo de uma forma sistemática e que os conhecimentos para isso estão disponíveis.
Entretanto criou-se uma rede de compras sustentáveis (rede Procura+ Portugal), com cerca de 30 organizações participantes, em Portugal, onde os compradores podem tocar experiências e adquirir conhecimentos. Desta troca de conhecimentos resultou um catálogo de boas práticas, uma compilação de casos de compras sustentáveis com autoridades públicas portuguesas.
Foi feita uma abordagem aos fornecedores, onde se explorou até que ponto os critérios de sustentabilidade podem ser cumpridos pelas empresas portuguesas e assegurar assim a sua competitividade. Foram realizados grupos de trabalho entre compradores e fornecedores para produtos alimentares e serviços de catering, construção, produtos e serviços de limpeza, papel de cópia e impressão, equipamentos informáticos e de impressão. Concluiu-se que existe uma grande disponibilidade dos fornecedores mas que, ao nível dos pequenos fornecedores, existe ainda uma falta de conhecimento dos aspectos ambientais associados aos seus produtos e serviços.
Foi ainda desenvolvido um instrumento para a implementação de uma estratégia de compras sustentáveis numa organização, que foi testada em Loures, Torres Vedras e na Lipor. No âmbito deste projectos-piloto foram desenvolvidos processos de contratação com critérios de sustentabilidade (Torres Vedras – produtos para o controlo de pragas, fardamento, alimentação escolar; Loures – serviço de vigilância, transporte escolar, serviço de controlo de pragas; LIPOR – serviço de limpeza).
Com estes resultados práticos, quisemos desenvolver recomendações para a estratégia portuguesa e grega de compras sustentáveis, uma vez que a abordagem de comparas sustentáveis nas organizações pode e deve ser sustentada pelas políticas públicas.
As compras das administrações públicas representam 16% do PIB da UE. Quantas destas compras são sustentáveis?
Um estudo realizado pela UE em 2012 sobre o nível de implementação das compras ecológicas na Europa dos 27 revela que Portugal, Irlanda, Polónia, República Checa, Finlândia, Eslovénia, Hungria, Roménia, Bulgária, Grécia, Letónia e Estónia apresentam um nível de implementação abaixo dos 20%. Isto em termos do número de contratos com critérios ambientais (compras ecológicas).
Em termos do valor dos contratos realizados em 2009-2010, com critérios ambientais para 10 grupos de produtos e serviços, Portugal apresenta um nível de implementação abaixo dos 20%.
De que forma podem estas administrações públicas revolucionar o sector ligado à economia verde e sustentabilidade? Por outras palavras, que percentagem das compras públicas teria de ser “ecológica” para que o sector da economia verde gerasse um número interessante de receitas e criasse milhares de empregos?
Há ainda muito para fazer, quer ao nível das organizações que pretendem ser pioneiras neste processo de mudança, quer ao nível da generalização das práticas de compras sustentáveis nas organizações. O projeto Building SPP deu, por assim dizer, um pontapé de saída e mostrou que é possível fazer. Agora há que disseminar estes resultados junto das organizações, levá-las a considerar as compras sustentáveis como uma prioridade. Até porque em muitos casos uma maior exigência por parte da administração pública pode e deve corresponder a uma melhor preparação e qualificação dos fornecedores e portanto uma maior competitividade do tecido empresarial. É nesta perspectiva que as compras sustentáveis devem ser encaradas.
A segunda pergunta que me fazem teria que ser respondida depois de um estudo sobre esta matéria.
Por que razão vão debater o caso sueco, especificamente, no congresso?
A Suécia é um dos países mais avançados em matéria de compras sustentáveis, com um nível de implementação superior a 80%, quer em número de contratos quer no valor dos contratos. Pode por isso ser um exemplo para Portugal. A ideia da conferência foi apresentar o exemplo de um País muito avançado (Suécia) e de outro muito próximo (Espanha), com o objectivo de demonstrar ao participantes que Portugal também tem bons exemplos que podem ser disseminados.
O tema das compras públicas sustentáveis é um tema em cima da mesa há já algum tempo. O que tem travado a sua implementação no terreno?
Uma abordagem de compras sustentáveis numa organização requer mudanças na própria organização e na forma de realizar e planear a contratação pública. Esse é o principal obstáculo, mas o papel do LNEG tem sido demonstrar que é possível fazer, com vantagens inequívocas ao nível do planeamento, aumentando o envolvimento interno nas organizações, aumentando a transparência dos processos de contratação, melhorando a imagem política das organizações e contribuindo para os objectivos estratégicos das organizações a nível ambiental e social. Em termos de custos também pode haver vantagens, se considerarmos não só o custo do produto ou serviço, mas incluirmos os custos de operação, manutenção e fim de vida.
A conferência Compras Sustentáveis: Um desafio para a Administração Pública vai realizar-se a 16 de Setembro no Museu do Oriente, em Lisboa. Pode inscrever-se neste link.
Foto: zack Mccarthy / Creative Commons