José Pedro Salema, presidente da EDIA: “Das 426 ilhas de Alqueva, 40 devem ser preservadas, mas muitas outras podem ter turismo”



Na terceira parte da entrevista exclusiva ao Green Savers, o presidente da EDIA, José Pedro Salema, explica porque as ilhas de Alqueva podem ter turismo sem por em causa a sustentabilidade e como o Parque de Natureza de Noudar pretende compensar a pegada ecológica deixada pela construção da barragem de Alqueva. 

A EDIA quer utilizar para fins turísticos parte das 426 lhas de Alqueva. De que forma essa iniciativa acautela ou põe em causa a conservação ambiental?
Sim, são 426 ilhas, mas apenas 100 se mantêm sempre como ilhas, independentemente da quota de água da barragem. Destas, há 40 com alto valor ambiental e, de acordo com um estudo que fizemos, deverão ficar reservadas para preservação da biodiversidade. Mas há outras que podem ter utilizações turísticas.

Hoje tudo é proibido nessas ilhas, mas se não temos lá alguém a policiar ou a viver não temos quem vigie. São 100 quilómetros de comprimento e há um ou dois barcos para vigiar todo o Alqueva… acho que o que é eficaz é haver regras de utilização e que compreendam um caderno de encargos ambientais para quem ali quiser investir e fazer a sua actividade.

O que será permitido e proibido, segundo esse mesmo estudo?
Estão proibidas novas construções, portanto terão de ser aproveitadas as já existentes em algumas ilhas. Serão permitidas estruturas amovíveis, como casas de madeira. Não poderá existir ali nada agressivo para o ambiente. Os investidores terão de pensar como podem aproveitar esta oportunidade, porque não é a EDIA que vai criar uma rede de dormidas.

Quando é que os investidores e operadores turísticos poderão apresentar propostas à EDIA?
Podem sempre ser apresentadas e são bem-vindas. Ainda ontem recebi um email de um investidor, com um projecto interessante para as ilhas de Alqueva. É muito importante irmos percebendo que interesses existem.

E esse interessado é um investidor português?
É. Está interessado em fazer pernoitas nas ilhas e com formas sustentáveis, portanto está focado no ecoturismo e para mim este género de projecto está muito alinhado com o que pensamos.

Nas preocupações com o ambiente e o turismo sustentável, insere-se também a gestão do Parque de Natureza de Noudar, pela EDIA?
Sim. É uma parte da nossa actividade que é menos conhecida, o Parque de Natureza de Noudar fica em Barrancos e foi adquirido pela EDIA como medida de compensação pela destruição de montado provocada pela barragem. A herdade tem mil hectares e faz fronteira com o rio Ardila e com Espanha e está isolada, ou seja, está a oito quilómetros do alcatrão.
A EDIA adquiriu-o em 2006/2007 e conserva-o. Está aberto ao público desde 2009 e temos lá uma unidade de turismo, que é um monte alentejano recuperado com capacidade para 30 a 40 pessoas. Tem o restaurante Pançona (nome de uma fonte em Barrancos) que está aberto todos os dias, tem exploração cinegética onde se pode fazer caça de forma completamente controlada, exploração agrícola, criação de 120 vacas mertolengas e de porco preto.
Estamos ainda a fazer a recuperação do habitat para aumentar o número de coelhos com o intuito de vir a ter ali o lince. Aliás, a EDIA integra e tem actualmente a presidência Associação Iber Linx (para conservação do lince ibérico).  Queremos mostrar que é possível fazer tudo isso, com preservação e gestão sustentável do território.

Sendo o Parque de Natureza de Noudar em Barrancos, como convive com as touradas? Pessoalmente, aprecia?
Eu, pessoalmente, sou apreciador. Mas não temos nenhuma actividade ligada com isso. Estamos presentes sempre nos eventos, como a Feira de Barrancos.

Por falar em gado, as terras de Alqueva têm sido procuradas para agricultura mas não tanto para criação de gado, actividade associada a alta pegada ecológica. Como a EDIA poderá acautelar essa questão, caso aumente a procura para este fim?
Não sei se estamos em altura de fazer esse género de restrições em Alqueva, porque a ocupação da terra está muito longe do que é a norma em termos de ocupação para produção de carne noutros sítios do mundo, e até em Portugal. Hoje temos um modelo extensivo, em que as vacas estão no campo a pastar, e mesmo que se fale hoje na ‘carne de regadio’ (cujas vacas pastam em prados regados) isso está muito longe da realidade, que é ter as vacas em estábulos dentro de um pequeno espaço e a comer farinha o dia todo, em modelo intensivo, o que aliás é regra para fazer carne por esse mundo fora.  Em Alqueva há procura para criação de gado, há players importantes que querem locais para ter boas produção neste modelo da carne de regadio, ou seja produção extensiva mas com rendimentos altos, pela disponibilidade de alimento para os animais em grande quantidade. Do ponto de vista ambiental, existem densidades máximas de número de cabeças por hectare que têm de ser cumpridas, mas isso ainda não é uma preocupação em Alqueva.

Bilhete de identidade
Nome

José Pedro Salema

Idade

41 anos, dois filhos, com 3 e 6 anos

Formação

Engenharia Agrónoma e MBA e mestrado em Gestão pela Universidade Católica Portuguesa

Carreira

Geria a empresa que fundou, a Agro-Gestão, dedicada à produção de software para a agricultura e consultoria, antes de assumir a presidência da EDIA

Meta
Até final do ano ficarão irrigados os 120 mil hectares previstos desde o início do projecto. A grande novidade é que há potencial hídrico para aumentar o regadio até 170 hectares.

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