O que faz a arquitectura típica de Ílhavo num dos bairros mais elitistas de Londres? (com FOTOS)
O que pode fazer um proprietário irritado com a rejeição de um plano para reabilitar a sua moradia de €20 milhões no centro de Londres? Pintá-la às riscas vermelhas e brancas – como se a inspiração viesse das célebres casas dos palheiros da Costa Nova, em Ílhavo – para passar essa irritação para os seus vizinhos.
A situação tem uma explicação simples: Zipporah Lisle-Mainwaring é proprietária de uma casa no bairro exclusivo de Kensington, Londres, e pretende demolir a habitação e construir uma casa com cinco andares – três deles subterrâneos – para incluir uma piscina, ginásio, sala para media e quatro quartos.
Depois de uma longa batalha legal com o Royal Borough of Kensington, com o Chelsea Council e os vizinhos, Lisle-Mainwaring viu a sua proposta recusada. O caso, que chegou hoje às páginas dos jornais ingleses, ganhou contornos tragicómicos quando a proprietária decidiu pintar a moradia de um bizarro vermelho e branco, típico das casas costeiras.
A casa foi pintada a meio da noite e, como seria de esperar, está a levar os vizinhos à exasperação. “Estamos todos horrendamente insatisfeitos com a pintura. Todos se estão a queixar, é uma monstruosidade”, explicou ao Mail online Saskia Moyle, que vive com o pai na casa da frente.
“[Zipporah Lisle-Mainwaring] está a fazer isto para que o município a obrigue a demolir a casas. A construção da casa demoraria seis anos, seria um pesadelo”, continuou.
Segundo Colin Burchett, que trabalha numa rua paralela, a propriedade está a receber muita atenção dos turistas, que visitam regularmente a rua para tirar fotografias. “A pintura está bizarra. Gostaria de saber como é que conseguiram fazê-la”, explicou. “De certeza que aquele edifício está listado [como histórico] e devem existir restrições”. Será que Lisle-Mainwaring conseguirá os seus objectivos?
O QUE SÃO OS PALHEIROS DA COSTA NOVA?
Segundo a Câmara Municipal de Ílhavo, os palheiros da Costa Nova são famosas e castiças casas de riscas existentes na praia com o mesmo nome, originalmente em tons de vermelho ocre e preto, utilizados como antigos armazéns de alfaias da pesca.
Até inícios do século XIX a Costa Nova era um extenso areal desabitado mas, após a fixação da Barra do Porto de Aveiro, os pescadores das campanhas piscatórias de Ílhavo mudaram-se para a Costa Nova e começaram a construir “palheiros” para guardarem as redes e outros materiais associados à pesca.
Estes eram inicialmente amplos e sem quaisquer divisões interiores e, mais tarde, divididos com tabiques de madeira que eram “decorados” com conchas de ostras. Simultaneamente, as famílias dos seus sócios, escrivães e “arrais” de outras companhias foram sendo atraídas para a zona nos meses de verão e outono, transformando-os nos actuais “palheiros”, com riscas coloridas, bem à “moda burguesa de ir a banhos” da segunda metade desse século, para que pudessem servir como habitação na estação balnear.
O Palheiro José Estêvão, mandado construir por Manuel de Moura Vilarinho, em 1808, é um belo exemplar dos originais palheiros da Costa Nova, que se mantém na tonalidade original – o vermelho ocre. A meados desse século o parlamentar José Estêvão adquiriu-o e ainda hoje se encontra na posse dos seus descendentes, onde reunia alguns dos grandes nomes da cena artística nacional e políticos da época como Eça de Queirós, Guerra Junqueiro e Oliveira Martins, associados à “Geração de 70” e ao movimento do “realismo”.
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