A Europa multiplicou as suas florestas (e pode ser um problema)
A especialista em florestas da EEA, Annemarie Bastrup-Birk diz que “os últimos 200 anos da Europa são uma história de florestamento”, referindo-se ao método de criação de áreas verdes em regiões que antes não eram ocupadas por florestas, por meio do cultivo de árvores.
Originalmente, a vegetação natural europeia era formada por florestas, explica Bastrup-Birk. Mas, com a colonização do continente, muitas áreas foram destruidas e as árvores utilizadas para construção, produção de energia, aquecimento, fabrico de móveis, entre outras actividades.
“Diante da necessidade de obter mais madeira, o que restava passou a ser preservado e também começou-se a plantar árvores para suprimir a procura, mas de forma planeada.”
Assim, enquanto a área florestal europeia perdeu, entre 1750 e 1850, cerca de 190 mil km², de 1850 até aos dias de hoje cresceu cerca de 386 mil km².
Hoje, é 10% maior do que antes da Revolução Industrial.
Menor uso da madeira e êxodo rural
As florestas ocupam hoje 1,8 milhões de km² da Europa — ou 43% de todo o continente, o que faz da Europa uma das regiões do mundo mais ricas em florestas, de acordo com a EEA.
De facto, grande parte da vegetação original já não existe: apenas 3% da área total de florestas na Europa é de mata nativa, segundo a EEA.
A maior parte do que existe hoje deve-se ao florestamento. Mais recentemente, concretamente desde 2000, tem vindo a ocorrer uma expansão natural das florestas já existentes.
Uma combinação de factores permitiu este crescimento. “Com a eletricidade e os combustíveis fósseis, o consumo de madeira caiu drasticamente”, diz Bastrup-Birk.
Ao mesmo tempo, este crescimento florestal foi favorecido pelo êxodo das zonas rurais para as urbanas, explica o diretor-adjunto para florestas do World Resources Institute (WRI), organização não governamental dedicada a pesquisas na área ambiental.
“Em países como Espanha e Itália, há vilarejos que estão abandonados, assim como os campos de cultivo são cada vez menores, porque o preço destes produtos é baixo, e quem cultivava vende os terrenos e vai para as cidades em busca de emprego”, afirma Stolle.
“Também há uma preocupação maior de muitos governos locais em criar áreas verdes e ampliar as florestas nas suas cidades e nas regiões limítrofes para proveito dos moradores e para atrair turistas.”
Impactos negativos no meio ambiente
Mas nem tudo são boas notícias na expansão das florestas, podendo mesmo não ser benéfica, de acordo com estudos recentes.
Uma pesquisa da União Internacional pela Conservação da Natureza (IUCN, em inglês), organização britânica que monitoriza o status de espécies biológicas, aponta que, entre as 454 espécies de árvores nativas da Europa, 42% estão ameaçadas de extinção no continente.
Entre as espécies endémicas, aquelas que não existem em nenhum outro lugar do mundo, a situação é ainda pior: 58% estão ameaçadas.
Isto deve-se à perda ou destruição de áreas naturais e pelo avanço de espécies invasoras, assim como as mudanças climáticas, diz o estudo.
“Isto mostra a terrível situação de muitas espécies negligenciadas e subvalorizadas que formam a espinha dorsal dos ecossistemas da Europa e contribuem para um planeta saudável”, diz Luc Bas, director do escritório europeu da IUCN.
Ao mesmo tempo, a ideia de que plantar árvores ajuda a combater as mudanças climáticas porque estas absorvem carbono foi questionada em outra pesquisa, publicada em 2016 na revista Science.
Alguns cientistas apontam que, na Europa, árvores cultivadas intensificaram o aquecimento global. Estes especialistas afirmam que a substituição de espécies de folhas largas, como carvalhos, por coníferas, como pinheiros, é uma das principais razões do impacto negativo.
Nos últimos 150 anos, privilegiou-se o cultivo de árvores de crescimento mais rápido e maior valor comercial, como as coníferas. Por outro lado, estas espécies são geralmente mais escuras e absorvem mais calor do que árvores de folhas largas.
“Devido à mudança para espécies coníferas, houve um aquecimento na Europa de quase 0,12°C, porque as coníferas absorvem mais radiação solar”, afirma Kim Naudts, principal autora do estudo.
Os investigadores afirmam que este aumento equivale a 6% do aquecimento global atribuído à queima de combustíveis fósseis e que impactos semelhantes são prováveis em regiões onde ocorreu o mesmo tipo de florestamento. Por isso, sugerem ser necessário examinar com cuidado os tipos de árvores que são plantadas.
‘Nem sempre plantar árvores é uma boa ideia’
Bastrup-Birk, da EEA, diz que o resultado deste estudo é relevante, mas ressalva que leva em conta apenas um aspecto destes ecossistemas.
“As florestas são multifuncionais, porque retiram carbono da atmosfera e armazenam, promovem uma maior biodiversidade, impactam a qualidade de vida. Então, precisamos olhar para isto”, afirma a especialista.
“Mas este estudo reforça que não basta plantar árvores. É importante saber o quê e onde plantar, fazendo uma melhor gestão florestal para termos os melhores resultados possíveis daqui a 50 ou 100 anos, que é o tempo que se leva para formar uma nova floresta.”
A expansão das florestas também deve ter um limite, diz Stolle, da WRI, para que não seja negligenciada a necessidade de cultivar alimentos para uma população mundial que cresce em ritmo acelerado.
“Vamos precisar produzir mais comida para suprimir as necessidades de quase 10 mil milhões de pessoas em 2050. Os cálculos apontam que será necessária para isso uma área extra equivalente a quase duas vezes o tamanho da Índia em relação à área usada globalmente para agricultura em 2010, e o mundo tem uma quantidade de terras limitadas”, afirma Stolle.
“Então, plantar árvores nem sempre é uma boa coisa, se as plantarmos em solo bom para a agricultura.”, indica
Este é um dos motivos pelos quais Bastrup-Birk acredita que o aumento da área florestal na Europa esteja a manter-se estável nos últimos anos. “Talvez tenhamos atingido o pico, porque a terra deve ter outros usos. É necessário encontrar um equilíbrio.”