A luta contra a perda da Biodiversidade

Artigo publicado originalmente na edição Número 8 da revista Green Savers.



Estamos a perder a nossa guerra suicida contra a Natureza.” Foi com estas palavras que o Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, descreveu aos líderes mundiais os efeitos catastróficos da ação humana sobre o mundo natural, na primeira metade da 15.ª Conferência das Partes da Convenção sobre a Diversidade Biológica, que decorreu em outubro de 2021, em Kunming, na China.

Estaremos mesmo a perder a luta contra a perda da biodiversidade? As opiniões podem divergir, mas uma coisa é certa: é preciso fazer mais para travar a redução da diversidade biológica no nosso planeta, a perda de ecossistemas e de habitats, e de cessar os ataques sistemáticos ao mundo natural e à Terra. Caso contrário, a própria sobrevivência das sociedades humanas poderá estar em risco.

Apesar de os governos, por todo o mundo, terem criado áreas protegidas para a conservação da vida selvagem e de florestas ao longo de séculos, podemos definir o ano de 1992 como um momento definitivo da mobilização global para salvaguardar a diversidade biológica.

Foi nesse ano que os Estados do mundo, reunidos no Rio de Janeiro, adotaram a Convenção das Nações Unidas para a Diversidade Biológica (CDB), reconhecendo “a importância da diversidade biológica para a evolução e manutenção de sistemas da biosfera para o suporte da vida”, que “os Estados são responsáveis por conservar a sua diversidade biológica e por usar os seus recursos biológicos de forma sustentável” e que a biodiversidade “está a ser significativamente reduzida por certas atividades humanas”.

Atualmente, 196 países (à exceção dos Estados Unidos da América e a Santa Sé) já ratificaram essa convenção, considerada “o primeiro acordo global a cobrir todos os aspetos da diversidade biológica” e estipulando que “os recursos biológicos da Terra são vitais para o desenvolvimento económico e social da humanidade”.

Ao longo dos anos, a CDB foi sendo reforçada, designadamente com os Protocolos de Cartagena e de Nagoia, que procuraram conceber estruturas de regulamentação para a utilização dos serviços providenciados pela natureza, designadamente, para a partilha equitativa e justa dos benefícios do uso dos recursos genéticos e para a proteção da biodiversidade face à introdução de organismos vivos modificados por técnicas de biotecnologia.

Em 2010, foi estabelecido um novo marco importante, com a definição dos Objetivos de Aichi, que apontavam cinco objetivos estratégicos para reforçar o combate à perda da biodiversidade a nível mundial, compostos por duas dezenas de ações concretas que os Estados signatários da CDB deveriam seguir para concretizar esses compromissos.

A opinião geral é de que nenhum dos Objetivos de Aichi foi integralmente cumprido. No entanto, a Secretária Executiva da CDB, Elizabeth Maruma Mrema, acredita que foram feitos “bons progressos” quanto a esses objetivos e que os governos têm vindo a aumentar os recursos devotados à proteção da biodiversidade. Mas, ainda assim, não deixa de reconhecer que se poderia, realmente, ter ido mais longe.

Elizabeth Maruma Mrema, Secretária-executiva da Convenção das Nações Unidas sobre a Diversidade Biológica.

“Para a próxima década, temos de aprender essas lições do passado”, frisa, apontando que os esforços feitos até agora “ainda são inadequados para responder à magnitude da perda da biodiversidade, pelo que é preciso fazer mais.”

 

A estratégia

Foi esse reconhecimento de que a luta pela proteção da biodiversidade estava a ser perdida que levou a comunidade internacional a concordar com a necessidade da criação de uma estratégia pós-2020, conhecida como ‘Post-2020 Framework’, atualmente em negociação. Deveria ter sido aprovada em finais de 2020, mas os constrangimentos erguidos pela pandemia de covid-19 obrigaram a adiamentos sucessivos das reuniões das várias delegações. Porém, espera-se que seja aprovada em dezembro, na parte final da 15.ª Conferência das Partes (COP15) da CDB, a ter lugar em Montreal, no Canadá.

Um dos grandes propósitos dessa estratégia é proteger, pelo menos, 30% dos ecossistemas até 2030, para que, chegados a 2050, “a biodiversidade seja valorizada, conservada, restaurada e usada sensatamente, mantendo os serviços de ecossistemas, suportando um planeta saudável e disponibilizando benefícios essenciais para todas as pessoas”.

Contudo, apesar dos esforços internacionais, continuamos a assistir à deterioração da biodiversidade a nível mundial. O ‘Living Planet Report 2022’ da World Wildlife Foundation mostra que as populações de mamíferos, aves, anfíbios, répteis e peixes de todo o mundo sofreram um “declínio alarmante” entre 1970 e 2016.

A União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) alerta que, “apesar do incremento das políticas e ações para suportar a biodiversidade, os indicadores mostram que as causas da perda da biodiversidade intensificaram-se”, agudizando ainda mais esse declínio entre 2011 e 2020.

No entanto, Mrema considera que “a perda de biodiversidade teria sido muitas vezes maior se as ferramentas e cooperação promovidas pela CDB não existissem”.

O célebre naturalista britânico David Attenborough acredita que “a cooperação por vezes exige fazer cedências e chegar a acordos” e que “o tempo de puros interesses nacionais já passou, o internacionalismo tem de ser a nossa abordagem”, para que seja possível “maior igualdade entre os que as nações tiram do mundo e o que devolvem”.

“As nações mais ricas tiraram muito, e chegou agora o tempo de darem”, declara Attenborough, numa mensagem muito oportuna que se adequa na perfeição às antevésperas da COP15.

Com um cenário negro, em que a diversidade biológica do mundo continua a ser perdida e em que os esforços e convenções internacionais têm sido insuficientes para travar a tendência de degradação, haverá esperança de que se possa alcançar um acordo forte, tão necessário para proteger, conservar e recuperar a biodiversidade do nosso planeta? Ou serão as palavras do Secretário-Geral da ONU uma sentença incontornável?

Elizabeth Maruma Mrema mostra-se confiante de que a estratégia pós-2020 para a biodiversidade será aprovada na cimeira de dezembro, desbravando o caminho para “uma década transformacional”.

“Quando a estrutura for aprovada, governos, empresas e toda a sociedade embarcarão numa colaboração significativa e em ações concretas que nos colocarão no trajeto para travar e reverter a perda de biodiversidade.”

 

As negociações

Já Henrique Miguel Pereira, Professor de Biologia da Conservação do Centro Alemão para Investigação Integrada de Biodiversidade, em Leipzig, reconhece que, “neste momento, há dúvidas sobre quão bem-sucedidos podemos ser em dezembro, quando ainda há muito texto específico sobre estes objetivos” que gera divergências entre as delegações dos vários Estados-parte da CDB.

Henrique Miguel Pereira, Professor de Biologia da Conservação do Centro Alemão para Investigação Integrada de Biodiversidade, em Leipzig, e investigador do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (CIBIO) das Universidades do Porto e de Lisboa.

Mas o especialista português, que é também investigador do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (CIBIO) das Universidades do Porto e de Lisboa, mostra-se otimista, afiançando: “Estou convencido de que teremos algum acordo em dezembro e que será ambicioso.”

E explica que as negociações encontram resistência numa divisão clara, e tradicional, entre os países mais ricos e as nações em processo de desenvolvimento no que toca a estratégias para proteger a biodiversidade, e essa cisão continua a marcar as negociações nos dias de hoje.

Os países mais desenvolvidos defendem a definição de objetivos mais ambiciosos, mas os seus contrapartes mais pobres ou em emergência defendem que essas metas colocam em causa a sua capacidade de desenvolvimento e que objetivos mais ambiciosos devem contemplar a compensação financeira dos países que estão a desenvolver-se pelas perdas derivadas de políticas de conservação mais rigorosas.

“Qual é a moralidade que podemos ter ao exigirmos que, por exemplo, a Indonésia ou a Malásia não desflorestem, quando nós aqui desflorestámos muito nos últimos séculos e pouco restauro fizemos?”, questiona Henrique Miguel Pereira.

A COP15 será também palco para o debate sobre outras importantes dimensões da luta contra a degradação da diversidade biológica, como a “integração da sabedoria tradicional de povos indígenas e comunidades locais que seja relevante para proteger a biodiversidade”, adianta Mrema.

Espera-se ainda que os governos do mundo discutam “a necessidade de mobilizar recursos de todas as fontes para financiar a ação sobre a biodiversidade”, eliminando subsídios a atividades destrutivas de ecossistemas e habitats e canalizando esse dinheiro para a proteção da biodiversidade, em vez de para a sua exploração insustentável e destruição.

A responsável acredita que, em Montreal, os compromissos já assumidos pelos vários Estados-parte da CDB serão reforçados, tendo por base a noção de que “resolver as crises económica, alimentar e energética exige que o mundo responda urgentemente à crise da biodiversidade”. Estimativas do Fórum Económico Mundial indicam que cerca de metade de toda a riqueza mundial depende moderada ou profundamente da natureza e dos seus serviços, pelo que a conservação e uso sustentável da biodiversidade é a coluna-mestra do desenvolvimento sustentável.

No entanto, mesmo que seja aprovado um acordo forte na cúpula de Montreal, “depois o problema é a aplicação”, alerta Henrique Miguel Pereira.

E isto porque “estes objetivos são definidos de uma forma genérica a nível global”, mas a sua aplicação no âmbito nacional não é suportada por um processo formal que esteja contemplado na convenção. Ou seja, não está previsto um processo em que os objetivos globais sejam traduzidos para objetivos nacionais e em que se verifique se essas metas nacionais “são suficientes para alcançar os compromissos globais” e que a sua aplicação seja monitorizada.

Apesar de, no seu Artigo 26, a CDB estabelecer que os Estados-parte devem apresentar relatórios regulares sobre “as medidas que tenham tomado para a aplicação das provisões desta Convenção e a sua eficácia para alcançar os objetivos desta Convenção”, o especialista diz que “há muito pouca verificação sobre se os objetivos nacionais que foram estabelecidos estão a ser aplicados”.

 

Na União Europeia

A nível europeu, a situação é um pouco diferente. O biólogo português argumenta que a União Europeia “tem exercido um papel muito ativo no campo da biodiversidade, principalmente com a atual Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen”.

A líder do executivo comunitário definiu as alterações climáticas e a biodiversidade como pilares fundamentais da sua plataforma de ação política, “comprometendo-se a ter uma estratégia para a biodiversidade nos primeiros cinco dias de mandato”.

Foi assim que surgiu a Estratégia Europeia para a Biodiversidade 2030, parte do Pacto Ecológico Europeu, em que é apontado que “a UE está pronta para liderar pelo exemplo para responder à crise global da biodiversidade”.

No entanto, ao contrário do que se verifica ao nível da convenção das Nações Unidas, na UE “há um processo para transferir estes objetivos para os planos nacionais” e “a própria estratégia europeia estabelece um processo com prazos”, o que, ainda assim, levanta alguns desafios aos Estados-membros, visto que, “na Europa, não há sistemas de monitorização de biodiversidade”.

“Não existe em Portugal, nem em Espanha, nem em França, nem em muitos países”, salienta o cientista, avançando que está atualmente envolvido num projeto na Alemanha cujo propósito é conceber um sistema que possa servir à UE.

Apesar de, no bloco europeu, se vislumbrarem progressos em termos da aplicação das metas de conservação da biodiversidade, continuam a existir falhas na avaliação do impacto das estratégias nacionais e da concretização dos compromissos assumidos dos vários Estados-membros.

“Mas, mesmo que o sistema de monitorização não seja muito bom, a Europa tem um processo formal de reporting”, reitera, apontando que, “a nível internacional, está em falta este processo de transferência dos objetivos para o plano nacional”.

Voltando a lançar o olhar sobre o plano global, Henrique Miguel Pereira aponta que o ‘calcanhar de Aquiles’ da estratégia para a conservação da biodiversidade é o financiamento.

Algumas das maiores divergências nas negociações estão relacionadas com o facto de os países em desenvolvimento exigirem ser compensados pelas perdas económicas que poderão vir a sofrer no quadro da estratégia para a conservação da biodiversidade.

“Há aqui uma questão de justiça histórica, um pouco como no caso das alterações climáticas”, assevera. “O problema é quem está a emitir mais poluição agora ou quem o fez nos últimos 100 ou 200 anos? Com a biodiversidade é a mesma coisa.”

Sobre o restauro dos ecossistemas, um vetor fundamental no combate à perda de biodiversidade, Henrique Miguel Pereira esclarece: “Fizemos algum, mas muito mal feito, e agora estamos a pagar o preço por isso”, referindo-se aos incêndios que grassaram e que ainda se fazem sentir na Europa e em Portugal.

A estratégia europeia estabelece como metas a designação de pelo menos 30% do território da UE como áreas protegidas e de 10% como zonas de proteção estrita, ou seja, de proteção total, inteiramente entregues à natureza sem a presença de qualquer atividade extrativa e dedicadas exclusivamente a fins de conservação da biodiversidade.

O biólogo aponta que o objetivo de colocar sob proteção 30% do território na UE não representa qualquer desafio, e que o problema estará em aumentar para 10% as áreas de proteção exclusiva.

“Esse é um objetivo muito complicado”, reconhece, e aponta que, em Portugal, há muito poucas áreas dedicadas estritamente à conservação, tendo algumas pequenas porções de “proteção total” no Parque Peneda-Gerês, no Parque Nacional da Malcata ou na Reserva do Estuário do Tejo. “São áreas mínimas”, contando Portugal com regiões de proteção estrita “muito abaixo de 1%”.

“Como é que vamos passar isso a 10%? Isso, para mim, é certamente o maior desafio ambiental da próxima década em termos de biodiversidade na Europa e também em Portugal.”

O investigador admite que o objetivo dos 10% não será atingido, “mas se fossem 2%, 3% ou 4% já era muito bom”, e sublinha: “Considero muito positivo a Comissão ter posto este desafio, porque os 30% não custam nada.”

Elizabeth Mrema elucida que aumentar a área do planeta sob proteção é apenas uma dimensão da luta contra a perda da biodiversidade. “Ao expandir essas áreas, precisamos de assegurar que as necessidades das pessoas são também tidas em conta”, pelo que as contribuições de povos indígenas e das comunidades locais são cruciais para garantir a eficácia dessas zonas de proteção.

“Trata-se de envolver as comunidades, levar a cabo uma gestão adaptativa que envolve as pessoas nessas decisões, sempre sob a orientação da ciência”, frisa a responsável.

Assim, o que falta para que existam políticas públicas que efetivamente atuem no sentido de proteger a biodiversidade?

Destacando que “recursos limitados não são o problema”, mas sim o seu uso insustentável, Mrema sentencia que “a relação entre o bem-estar humano e a natureza precisa de mudar drasticamente”, elencando como problemas “a falta de compreensão da importância da biodiversidade para a qualidade de vida” e o facto de as políticas e decisões não tomarem em devida consideração esses aspetos.

A Secretária Executiva responde que “espera-se que a estratégia global pós-2020 para a biodiversidade seja um mapa global, adotado e desenvolvido a nível nacional”, pelo que os planos de cada Estado-parte da convenção terão de refletir os objetivos acordados em Montreal em dezembro, adaptando-se às especificidades de cada país.

“Os governos terão de ajustar as suas estruturas institucionais, administrativas e de governança, e facilitar a consideração da biodiversidade na conceção das suas políticas e nos processos de tomada de decisão”, argumenta Mrema.

No entanto, “sabemos que os governos não serão bem-sucedidos se agirem sozinhos”, pelo que é necessária a participação ativa de todos os setores da sociedade, desde as empresas à sociedade civil, passando pelas instituições financeiras.

“A crise da biodiversidade é um fardo partilhado e uma responsabilidade repartida que tem de ser efetivamente endereçada através de esforços conjuntos de todos.”

 

Em Portugal

Relativamente a Portugal, Henrique Miguel Pereira afirma que a concretização de uma estratégia eficaz de conservação da biodiversidade “é uma questão complicada, porque há várias componentes que têm de trabalhar em conjunto”.

Uma delas prende-se com a gestão das áreas protegidas, “problema que tem sido recorrente em Portugal”, principalmente “porque o Estado detém muito pouco de área”.

“Portugal é um completo ‘marginal’ a nível europeu e internacional”, pois o Estado tem somente cerca de 1% das áreas naturais portuguesas”, pelo que a gestão é feita maioritariamente em espaços privados ou em terrenos baldios. A média dos outros países ronda os 25% ou 30%.

“Nunca houve uma conversa séria sobre este assunto em Portugal, sobre o que é que deve estar nas mãos do Estado e sobre compensações que devem ser entregues aos privados para que possam gerir os seus terrenos para fins de conservação da biodiversidade”, denuncia, e prevê: “Não vamos conseguir atingir estes 10% de proteção estrita só nas áreas privadas”, desde logo porque na lei portuguesa de conservação de natureza está previsto que o Estado tem de adquirir essas áreas caso sejam declaradas zonas de proteção total.

“E esta é uma conversa que não está a acontecer de todo em Portugal e penso que tem de existir.”

Henrique Miguel Pereira argumenta que “há que fazer muito mais em termos de proteção da biodiversidade” em Portugal, e que “aí o principal mecanismo é o de atribuição de subsídios ambientais”.

No âmbito da Política Agrícola Comum, da UE, “há uma grande discussão sobre como fazer com que tenhamos uma agricultura e uma silvicultura que sejam mais amigáveis para a biodiversidade e que fomentem os benefícios que a biodiversidade pode dar para a produção agrícola e para a produção silvícola”.

Temos de fazer uma maior uso dos subsídios da PAC para conseguirmos uma floresta mais resiliente às alterações climáticas e que seja protetora e promotora da biodiversidade. “Isto tem mesmo de ser feito, e não o estamos a fazer à escala correta.”

Quanto à agricultura, “há já uma série de ideias que vêm da Estratégia Europeia para a Biodiversidade, em termos da redução dos pesticidas e de adubos e também em termos da aplicação de modos de produção agrícola mais sustentáveis, que sejam subsidiados para que as paisagens agrícolas sejam também focos de biodiversidade”.

“Temos de usar esses instrumentos financeiros para levar os gestores destes territórios em direção à proteção da biodiversidade.”

Considerando que os atuais sistemas mundiais de produção alimentar são “uma das principais causas da perda de biodiversidade, das alterações climáticas e da degradação dos solos”, emitindo entre 21% e 37% do volume total de gases com efeito de estufa a nível mundial, Mrema sugere que os Estados procurarão fazer as transformações necessárias, cientes da importância do desenvolvimento de sistemas de produção agroalimentar amigos da natureza e do clima, “que apoiem e fortaleçam a biodiversidade e reduzam as emissões de carbono”.

Foto: Palombar – Conservação da Natureza e do Património Rural

Um relatório de 2020, desenvolvido pela Agência Europeia do Ambiente e intitulado ‘O Estado da natureza na União Europeia”, revela que 81% dos habitats europeus estão classificados com os estatutos de “pobre” ou “mau”, e que mais de um terço continuam a deteriorar-se. E mostra ainda que mais de 60% das espécies estão também em estados de conservação “pobre” ou “mau”, sendo que as populações de peixes e de anfíbios são as mais afetadas.

Quanto a Portugal, o mesmo relatório alerta que mais de metade dos habitats avaliados estão em deterioração, e que sobre mais de 60% das espécies no país não se conhece o seu estado de conservação, o que evidencia a já referida falta de mecanismos de monitorização.

O estudo “Biodiversidade 2030: Nova Agenda para a Conservação em contexto de Alterações Climáticas”, que reúne dezenas de especialistas, foi financiado pelo Fundo Ambiental e que contou com o apoio da Universidade de Évora e do Ministério do Ambiente e da Ação Climática, revela que “entre 73% e 81% das espécies de aves e mamíferos existentes em território continental português podem enfrentar perda de habitats favoráveis em cenário de alterações climáticas, com os termómetros a subirem 3 a 4°C até final do século”.

O cenário adquire contornos ainda mais preocupantes quando se percebe que “Portugal encontra-se entre os países europeus com maior vulnerabilidade às alterações climáticas”.

O relatório deixa claro que, “globalmente, o estado de conservação do capital natural protegido português é maioritariamente (cerca de 70%) pobre ou mau, como revelam as avaliações sobre o estatuto de conservação dos habitats nos diversos Estados-membros da União Europeia”.

E Portugal tem cartas para dar no campo da biodiversidade, com o coletivo de peritos a afirmar que o país “tem alguns instrumentos de política de ordenamento do território, onde se incluem servidões administrativas e restrições de utilidade pública, que foram e continuam a ser inovadores no contexto internacional, e que poderão ser usados como exemplo de boas práticas, com potencial aplicação fora do nosso contexto jurídico e político”.

Apesar de Portugal ter uma Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade 2030, que foi aprovada em 2018, o mesmo estudo salienta que “os desafios a nível europeu deverão ser atendidos na revisão da estratégia nacional, passando esta a prosseguir uma visão mais integrada, em que a biodiversidade e o suporte físico do qual depende seriam assumidos como a estrutura fundamental de valorização do capital natural, plenamente articulados no exercício do ordenamento e da gestão territorial”.

“A biodiversidade é essencial para que se possa atingir os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, eliminar a ameaça existencial das alterações climáticas, travar a degradação dos solos, construir segurança alimentar e suportar avanços na saúde humana”, disse António Guterres já no passado mês de maio, no âmbito da celebração do Dia Mundial da Biodiversidade.

Apesar de o quadro que temos hoje ser algo negro, Elizabeth Mrema acredita que “cada vez mais pessoas percebem que a degradação da natureza não é somente uma questão ambiental” e que “a perda de biodiversidade abrange a economia, a saúde, a justiça social, a segurança e os direitos humanos”, explicando que “a degradação dos ecossistemas pode até exacerbar tensões geopolíticas e conflitos”.

No que toca à luta contra a perda da biodiversidade, a responsável deixa uma mensagem clara e contundente: “Estamos todos juntos nisto” e “temos de cuidar do nosso planeta e de agir agora”, pois “não há outra Terra”.





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