A qualidade do ar interior e exterior e os efeitos na saúde
Celebrou-se ontem o Dia Nacional do Ar, data que pretende reconhecer a importância da qualidade do ar e sensibilizar para melhorar este recurso. No âmbito do projeto IDI&CA “RESpira_ISEL” e do projeto ISEL Eco-Escolas, decorreu durante a tarde o webinar “Qualidade do Ar que Respiramos”, organizado pelo ISEL – Instituto Superior de Engenharia de Lisboa.
Nuno Canha, do C2TN – Centro de Ciências e Tecnologias Nucleares do Instituto Superior Técnico, abriu o evento com o painel “Qualidade Ar e Sono: quando o ambiente se impõe na saúde!”, no qual começou por revelar que respiramos entre 12.000 a 15.000 litros de ar por dia, uma grande quantidade que caso tenha poluição, apresenta um risco para a saúde. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), que define 5 microgramas por metro cúbico (µg.m3) como o valor de exposição seguro para uma pessoa, 97% da população está exposta a níveis superiores a este valor. Como explicou o especialista, esta exposição é medida por estações de monitorização, que se localizam por norma no centro das cidades. No entanto, existe uma grande variedade das concentrações dentro de uma cidade, e as próprias pessoas passam grande parte do seu tempo em ambientes interiores (mais de 90%).
“Na realidade nós acreditamos que para avaliar a real exposição humana à poluição atmosférica é necessário considerar os vários locais onde as pessoas estão durante as 24 horas e isso engloba os espaços interiores, como a nossa casa, o trabalho, até o transporte de casa-trabalho, também os espaços de lazer, o exterior, até quando fazemos exercício físico. Ou seja, só concentrando todos estes ambientes, o tempo que passamos neles e os níveis a que estamos expostos neles, é que é possível realmente termos uma noção efetiva de qual é que é a exposição humana à poluição atmosférica”, refere Nuno Canha.
O ar interior é constituído por uma “grande variedade de poluentes e parâmetros”, nomeadamente, agentes químicos (dióxido de carbono), biológicos (bactérias) e parâmetro físicos (humidade relativa). A sua qualidade é afetada por três principais fatores, os fatores exteriores, os fatores interiores e a ventilação – sendo a humidade ainda um quarto fator, para o profissional.
Por sua vez, Miguel Meira e Cruz, diretor da Unidade de Sono no Centro Cardiovascular da Universidade de Lisboa, mencionou que a poluição do ar apresenta um grande risco para a saúde, estando associada a milhões de mortes, ao desenvolvimento de doenças cardíacas, respiratórias e a efeitos no sistema nervoso central. Este problema está também associado ao sono, principalmente devido à qualidade do ar interior. “Vários poluentes afetam o padrão de sono e afetam por esta via a relação com a saúde cardiovascular e metabólica”, sendo ainda mais preocupante a situação em pessoas de risco. Os problemas passam sobretudo pela falta de ventilação dos quartos, dos edifícios, e pela proliferação de bactérias – mesmo o mexer na cama favorece este risco. É ainda necessário desenvolver-me mais estudos sobre a relação entre estas duas variáveis.
No segundo painel “Qualidade do ar e saúde respiratória: contributos para a construção de ambientes seguros“, Helga Rafael Henriques, Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, referiu, em primeiro lugar, que a qualidade do ar interior depende da concentração e dos poluentes presentes na atmosfera, que são condicionados pelas fontes de emissão, como a indústria e a agricultura, e pelos fatores meteorológicos, como as temperaturas e o vento. A qualidade do ar afeta, principalmente, a saúde humana, o clima através do aquecimento global, a água através das mudanças nos padrões da chuva, a energia através do rendimento da energia solar e os alimentos com a redução do rendimento das culturas. As partículas que encontramos nos locais onde passamos a maior parte do nosso dia a dia durante toda a vida, seja em casa, no escritório ou na escola, consistem numa mistura de vários poluentes, que tanto vêm do exterior como se originam no interior. Os contaminantes originados no interior podem vir de hábitos de tabagismo, de velas ou incensos, dos sistemas de refrigeração, dos equipamentos por combustão ou até do próprio mobiliário.
Para melhorarmos a qualidade do ar que respiramos, a especialista considera que é necessário “aumentar a literacia na saúde”, mas também criar ambientes seguros, onde se incluem, a nível interno, edifícios com fontes de energia renováveis, a aposta na prevenção da humidade e do bolor, e com ventilação e exposição solar; a nível interno e externo, a aposta na eficiência energética, e indústrias com tecnologias limpas; e a nível externo, a criação de espaços verdes, da gestão dos resíduos e de transportes acessíveis de com baixas emissões.
Para concluir, o painel “Impacte do confinamento na Qualidade do ar atmosférico a nível mundial“, apresentado por Marina Almeida-Silva, da Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Lisboa, revelou que durante o período de confinamento provocado pela COVID-19, que se iniciou em março de 2020, houve realmente uma melhoria da qualidade do ar atmosférico. Verificou-se uma redução significativa de vários poluentes, Óxido de Azoto (NOx), Dióxido de enxofre (SO2), Monóxido de carbono (CO), PM2.5 e PM10, e um aumento do Ozono (O3). Como refere a oradora, este aumento justificou-se pela menor transformação do O3 pelo NOx, pela menor concentração de partículas que provocou uma maior radiação solar e que favoreceu a formação do O3, e pelo aumento das emissões associadas às atividades domésticas e de jardinagem.
“Em todos os continentes onde foram realizados estudos verificou-se uma diminuição da concentração dos poluentes. (…) Efetivamente o confinamento teve um impacto direto, e de certa forma positivo, da qualidade do ar atmosférico”, sublinha. Esta melhoria, ainda que temporária, já que a maioria dos países voltou a atingir valores máximos no período de pós-confinamento, diminuiu o número de mortes e de doenças provocadas pela qualidade do ar.