Acasalamento entre baleias-de-bossa documentado pela primeira vez. E evento revelou-se ainda mais intrigante
As baleias-de-bossa (Megaptera novaeangliae) são dos gigantes mais icónicos que nadam pelos mares da Terra, conhecidas pelas suas intricadas e fantasmagórica canções submarinas, que viajam quilómetros pelas águas.
Apesar de ser uma espécie relativamente bem estudada, alvo do interesse de cientistas e naturalistas há décadas, a sua reprodução continua a ser um dos grandes mistérios para quem as estudas e admira. No entanto, agora pode estar mais perto de ser desvendado.
Em janeiro de 2022, dois fotógrafos, Lyle Krannichfeld e Brandi Romano, estavam a bordo de um barco em águas havaianas, perto da cratera de Molokini, a poucos quilómetros da costa da ilha de Maui, quando um par de baleias-de-bossa se aproximou. Rapidamente perceberam que uma das baleias estava visivelmente debilitada, o seu corpo coberto de parasitas e magra.
A segunda baleia parecia bem de saúde e aproximava-se constantemente da primeira, usando as barbatanas peitorais para agarrá-la e puxá-la para si. Enquanto captavam essa interação inédita com as suas câmaras, os fotógrafos observaram que a baleia mais saudável tentava copular com a outra.
Apesar de ser um momento raro e um comportamento nunca antes documentado, um outro aspeto tornou tudo ainda mais intrigante. Os Krannichfeld e Romano enviaram as fotografias captadas para a bióloga Stephanie Stack, da Pacific Whale Foundation, que, após analisar as imagens, conclui que os dois indivíduos eram, na verdade, dois machos adultos.
No artigo publicado na revista ‘Marine Mammal Science’ que documenta a interação, o trio escreve que embora o comportamento homossexual não tenha sido anteriormente registado em baleias-de-bossa, tornando, por isso, o momento ainda mais extraordinário, já foi documentado noutras espécies de cetáceos, como nos roazes, “e desempenha um papel importante nas interações sociais entre indivíduos”.
“O comportamento das baleias-de-bossa nos locais de reprodução no Havai está bem estudado. Contudo, apesar disso, continuamos a descobrir novos aspetos do seu comportamento sexual e social”, argumentam os autores. E sugerem que a interação sexual entre os dois machos possa ter sido influenciada pela saúde debilitada de um dos indivíduos, que, além de parasitas na pele, apresentava um ferimento na mandíbula, indicando que poderá ser sofrido uma colisão com uma embarcação.
O indivíduo doente, propõem, podia mesmo estar na fase final da sua vida, uma vez que colisões podem gerar ferimentos que, apesar de poderem não ser imediatamente fatais, podem resultar na morte do animal.
“Infelizmente, estes ferimentos sem sempre são imediatamente letais, e o animal pode sofrer durante semanas ou meses” antes de morrer, explicam os autores no artigo.
Sem poderem afirmar com certeza a razão do comportamento observado, avançam três hipóteses: o macho saudável poderia estar a tentar copular com o macho doente por engano, confundindo-o com uma fêmea; poderia ser uma forma de reforço de laços sociais entre os dois indivíduos; ou poderia ser uma manifestação de domínio do macho saudável sobre o macho debilitado, visto como rival.
Será preciso mais trabalho de investigação para realmente perceber o que poderá levar uma baleia macho a tentar copular com outro indivíduo do mesmo sexo e que papel esse comportamento poderá ter nas interações sociais entre esses gigantes marinhos.