Amnistia em Portugal pede respeito por populações afetadas pela exploração de recursos
A Amnistia Internacional Portugal defendeu hoje que a transição energética não pode acontecer à custa da violação dos direitos humanos das populações residentes nos locais onde são explorados recursos alternativos à energia fóssil.
A posição da Amnistia surge na sequência da demissão do primeiro-ministro, António Costa, no âmbito de uma investigação judicial relacionada com alegado tráfico de influências no negócio de um centro de dados em Sines.
O Ministério Público considera que houve intervenção do primeiro-ministro na aprovação de um diploma favorável aos interesses da empresa Start Campus, responsável pelo centro de dados, de acordo com a indiciação. No dia da demissão, Costa recusou a prática “de qualquer ato ilícito ou censurável”.
Em comunicado emitido hoje, a Amnistia Internacional (AI) reafirma a necessidade da transição energética para mitigar o efeito das alterações climáticas, mas defende um processo justo que coloque no centro os direitos humanos.
“Em junho, a Amnistia Internacional Portugal lançou um artigo sobre projetos fotovoltaicos previstos para o sul do país, nomeadamente dois em que a energia produzida será canalizada para a Subestação de Sines. Um deles é a Central Solar Fernando Pessoa, em São Domingos e Vale d’Água, que, de acordo com documentos a que a Amnistia teve acesso, estará ligado à empresa Start Campus, gestora de um megacentro de dados em Sines. Sozinho, este empreendimento irá quadruplicar as necessidades energéticas naquele município”, lê-se no comunicado.
Os terrenos da Central Solar Fernando Pessoa estão, na maioria, localizados em área de Reserva Ecológica Nacional, refere a organização.
“A construção desta central, que será a maior da Europa, vai implicar o abate de cerca de um milhão e meio de árvores. O projeto tem sido, desde o início, contestado por grupos cívicos, empresários locais e organizações de defesa do ambiente. Contudo, após dois chumbos, recebeu este ano parecer favorável da Agência Portuguesa do Ambiente”, sublinha a AI.
A Amnistia sustenta que a transição energética e a redução de combustíveis fósseis devem ser feitas em conformidade com as recomendações do relator especial das Nações Unidas, ou seja, de forma consistente com os direitos humanos, ao garantir que as populações afetadas “são consultadas de uma forma inclusiva e transparente”.
“O governo tem a responsabilidade de se concentrar na sustentabilidade ambiental, respeitando os direitos humanos”, escreve a Amnistia.
Desde a publicação do artigo da Amnistia Internacional Portugal, em junho, o Governo português propôs a revisão das metas de produção de energias renováveis até 2030, que são “ainda mais ambiciosas” do que as inicialmente previstas, destaca a mesma fonte.
No dia 07 de novembro, o Ministério Público deteve cinco pessoas – o chefe de gabinete do primeiro-ministro, Vítor Escária, o presidente da Câmara de Sines, Nuno Mascarenhas, dois administradores da sociedade Start Campus, Afonso Salema e Rui Oliveira Neves, e o advogado Diogo Lacerda Machado, amigo de António Costa, – que no final do interrogatório judicial foram colocadas em liberdade.
No total, há nove arguidos na investigação aos negócios do lítio, hidrogénio verde e do centro de dados de Sines, entre eles o ministro das Infraestruturas, João Galamba, entretanto exonerado, o presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta, o advogado e antigo porta-voz do PS João Tiago Silveira e a empresa Start Campus.
Para o MP, podem estar em causa os crimes de prevaricação, corrupção ativa e passiva de titular de cargo político e tráfico de influência.