Animais feitos de plástico: Cientistas encontram microplásticos nos pulmões e tecidos de baleias, golfinhos e focas



A poluição por partículas microscópicas de plástico é considerada uma das grandes ameaças aos ecossistemas e às espécies animais, sobretudo em meio marinho. Os microplásticos resultam da degradação e fragmentação de objetos maiores que são descartados na Natureza e podem pôr em risco a saúde e até a vida de peixes, aves, mamíferos marinhos e até humanos.

Agora, uma nova investigação revela um cenário ainda mais preocupante. Através do estudo de espécies de mamíferos marinhos, como baleias, golfinhos e focas, cientistas das universidades de Duke e de Toronto descobriram microplásticos alojados nas camadas de gordura e nos pulmões desses animais, o que sugere que essas partículas sintéticas podem deixar o sistema gastrointestinal e acumular-se nos seus tecidos.

Ilustração esquemática das camadas de tecido de um cetáceo, neste caso uma baleia. A amarelo mais claro, mostra-se a camada de gordura, onde foi encontrada grande parte dos microsplásticos.
Imagem: Artigo

Num artigo online publicado na revista ‘Environmental Pollution’, os investigadores argumentam que, embora estudos anteriores tenham identificado a presença de microplásticos no sistema gastrointestinal de vários mamíferos marinhos, este é o primeiro que documenta “a translocação e deposição” dessas partículas nos tecidos desses animais.

Embora reconheçam que ainda não é possível saber com certeza os efeitos dessa acumulação nos tecidos, os autores argumentam que são conhecidos impactos ao nível hormonal, podendo afetar a atividade endócrina.

Nesta imagem, é possível ver uma micropartícula de plástico azul alojada no tecido dos pulmões de uma beluga.
Foto: Greg Merrill / Universidade de Duke

Greg Merrill, primeiro autor do artigo, salienta que a ameaça dos microplásticos vem intensificar o já extenso rol de perigos, todos de génese humana, que os mamíferos marinhos enfrentam hoje: alterações climáticas, poluição e ruído.

“Agora, não estão apenas a ingerir plástico e a ter de lidar com os grandes pedaços nos seus estômagos”, afirma, apontando que os minúsculos fragmentos de plásticos “estão também a ser internalizados”, e começam a fazer parte dos seus próprios corpos. Por isso, Merrill aponta que “uma parte da sua massa é agora plástico”.

As conclusões são suportadas por análises a amostras de tecidos recolhidas em animais arrojados ou em cativeiro entre 2000 e 2021 no Alasca e na Califórnia. No total, foram abrangidas 12 espécies de mamíferos marinhos, sendo que 68% das amostras continham pelo menos uma partícula de microplástico.

Contas feitas, dois terços das espécies analisadas tinham nos seus tecidos fragmentos de plástico.

Os investigadores referem que os plásticos são lipofílicos, ou seja, são atraídos para tecidos gordos, tendo sido encontrados em estruturas que as baleias usam para produzir sons, e as partículas identificadas tinham desde 198 a 537 micrómetros de diâmetro. Recorde-se que um cabelo humano tem, em média, 100 micrómetros de diâmetro.

Além do risco causado pela libertação de substâncias tóxicas do plástico no interior do organismo dos animais, Merrill diz ainda que os fragmentos podem causar lesões nos seus tecidos.

“Agora que sabemos que há plásticos nestes tecidos, estamos a tentar descobrir qual poderá ser o impacto metabólico”, avança.

Da panóplia de microplásticos que encontraram, os investigadores dizem que os mais comuns eram fibras de poliéster, resultante da degradação de peças de vestuário e que são arrastadas para o mar na água que usamos nas nossas máquinas de lavar roupa, e também polietileno, material comum em embalagens de bebidas.

Ainda que reconheça que a maior parte do plástico ingerido pelos mamíferos marinhos passe pelo sistema gastrointestinal e seja evacuado, parte dessa quantidade acabará por ficar ‘presa’ nos tecidos dos animais.

Um outro estudo, de 2022, revelava que uma baleia-azul, que se alimenta por filtração, era capaz de ingerir perto de 40 quilogramas de plástico todos os dias. Além da ingestão direta, predadores, como os golfinhos, as focas e outras espécies de cetáceos, podem ser afetados pelo plástico que foi ingerido pelas suas presas.

“A presença de microplásticos alojados em órgãos internos salienta a ubiquidade do problema generalizado da poluição por plástico que está a assolar os oceanos e os seus habitantes”, concluem os investigadores, alertando que se trata de uma ameaça também para os humanos, pois, tal como os predadores marinhos acumulam microplásticos quando se alimentam de presas contaminadas, também nós podemos sofrer esse mesmo fim quando nos alimentamos de peixes e moluscos que ingeriram essas partículas sintéticas.





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