Aquecimento dos oceanos está a afetar a reprodução dos tubarões-anjo



Em águas marinhas cada vez mais quentes, as fêmeas de tubarões-anjo (Squatina squatina) preferem manter-se frescas a visitar locais de reprodução.

Sendo uma espécie “Criticamente em Perigo” de extinção, de acordo com a Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da União Internacional para a Conservação da Natureza, o desencontro entre machos e fêmeas pode ter “consequências graves para o futuro da espécie”, alertam 15 cientistas do Reino Unido e de Espanha.

Num artigo publicado esta semana na revista ‘Global Change Biology’, a equipa internacional explica que usou equipamentos de gravação de som (telemetria acústica) na Reserva Marinha de la Graciosa, no arquipélago das Canárias, entre 2018 e 2023, para tentar perceber de que forma o aumento da temperatura do mar está a afetar o comportamento reprodutivo das fêmeas de tubarões-anjo.

Durante uma onda de calor marinha nessa região em 2022, que fez a temperatura das águas superficiais chegar aos cerca de 23 graus Celsius e que coincidiu com a época de reprodução no final do outono, os investigadores registaram a ausência de grande parte das fêmeas na área marinha protegida, um local onde a espécie se costuma reproduzir. No entanto, os machos apareceram, como esperado.

David Jacoby, da Universidade de Lancaster e um dos principais autores do estudo (o trabalho contou com o Oceanário de Lisboa como uma das entidades financiadoras), descreve as cada vez mais frequentes e intensas ondas de calor marinhas como “os incêndios do oceano”, que estão a ter “efeitos inéditos nas espécies marinhas”.

Em comunicado, o cientista diz que, no caso dos tubarões-anjo, “observámos importantes diferenças sexuais, com as fêmeas a serem desproporcionadamente influenciadas pelos aumentos da temperatura do mar”. Por serem mais sensíveis a esses fenómenos, estiveram “ausentes dos seus locais tradicionais de reprodução”.

Por outro lado, “os machos eram muito mais resilientes aos aumentos de temperatura e mantiveram os seus padrões regulares de chegada e partida, aparentemente priorizando a reprodução apesar das temperaturas extremas”, aponta Jacoby.

Com base nos dados recolhidos, os cientistas pensam que uma temperatura marinha de 22,5 graus Celsius poderá ser o limite máximo tolerado pelas fêmeas de tubarões-anjo.

A maior sensibilidade das fêmeas ao calor deve-se, acreditam, à sua biologia reprodutiva. “Como resultado, são mais sensíveis à temperatura, uma vez que precisam de regular os seus processos metabólicos e gastos energéticos”, explica a equipa.

Como a maioria dos outros tubarões, esta espécie é ectotérmica, o que significa que a sua temperatura corporal é amplamente ditada pela temperatura do meio envolvente, pelo que quanto mais quentes forem as águas, mais quentes estarão os tubarões.

Por isso, e dado que se prevê que a temperatura nas Canárias continuará a subir, os cientistas receiam que se perca uma importante área de reprodução de uma espécie criticamente ameaçada de tubarão.

“Estes resultados têm implicações importantes para como nós conservamos esta espécies altamente ameaçada num mundo cada vez mais quente”, salienta Lucy Mead, primeira autora do artigo.

Lamentando que os impactos das alterações climáticas tendem a seguir a lógica de “olhos que não veem, coração que não sente”, a ecóloga marinha avisa que “tal como as ondas de calor e os incêndios estão a tornar-se mais frequentes em terra, também os eventos extremos nos oceanos estão a tornar-se mais frequentes”.






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