Aquecimento global ameaça biodiversidade nos rios ‘gelados’ dos Alpes



À medida que sobe a temperatura média global, também aumenta o ritmo de degelo dos glaciares um pouco por todo o planeta. Os Alpes europeus, segundo o Copernicus, o programa de observação terrestre da União Europeia, são uma das regiões em que os glaciares estão a desaparecer mais rapidamente, sendo que se estima que entre 1997 e 2017 os glaciares alpinos tenham perdido uma média de 24 metros de espessura.

Há previsões que apontam que essas massas geladas podem mesmo desaparecer até ao final deste século. Se tal acontecer, toda a diversidade de vida que se adaptou e evoluiu nesses ecossistemas gelados sofrerá um duro golpe.

A conclusão é de uma investigação de cientistas europeus, divulgada esta semana na revista ‘Nature Ecology & Evolution’, e que revela que o ritmo sem precedentes do degelo dos glaciares alpinos, fruto das alterações climáticas colocadas em modo ‘turbo’ pela ação humana, fará reduzir o habitat de uma multiplicidade de invertebrados que fazem dos rios de água fria, criados pelo derretimento das massas de gelo, a sua casa.

Com base em previsões climáticas para as próximas décadas, os cientistas procuraram estimar a distribuição futura, com base na atual, de 15 espécies de invertebrados aquáticos dos Alpes europeus, como os plecópteros, pequenas moscas da família Chironomidae e as efémeras.

Os investigadores acreditam que, há medida que os glaciares vão derretendo cada vez mais, também os rios gelados por eles alimentados, e que servem de habitat a todas essas pequenas criaturas, acabarão por recuar para maiores altitudes. Poderíamos pensar que, se conseguirem acompanhar a contração dos cursos de água os invertebrados estariam salvos. No entanto, como dizem os autores, quando menos gelo houver, mais concentrada será a pressão sobre essas massas restantes.

Com menores áreas cobertas de gelo, mais animais terão de competir em menos território e por uma quantidade mais escassa de recursos. Além disso, a pressão humana será também cada vez mais pesada nesses últimos redutos glaciais, através, por exemplo, de atividades como o ski ou o turismo.

Os cientistas preveem que, com o aquecimento global e o aumento do degelo, os invertebrados deslocar-se-ão para zonas mais elevadas, no encalço dos glaciares em retirada e em busca de temperaturas mais baixas, mas algumas espécies poderão tornar-se “funcionalmente extintas onde os glaciares desapareceram por completo”, escrevem.

Se esses organismos desaparecerem, as repercussões ecológicas serão vastas. Isto, porque esses animais estão na base da teia alimentar de muitos outros, como peixes, anfíbios, aves e mamíferos que rumam por todo o ecossistema alpino.

Lee Brown, Professor de Ciência Aquática da Universidade de Leeds, no Reino Unido, e um dos principais autores do artigo, explica que é urgente que os conservacionistas repensem a definição de áreas protegidas, tanto as existentes como as que possam vir a ser criadas, para que sejam tidos em conta os efeitos das alterações climáticas sobre a biodiversidade que se pretende proteger.

“É possível que algumas espécies tenham de ser transportadas para áreas de refúgio se quisermos salvaguardar a sua sobrevivência, uma vez que muitas delas não são grandes voadores e, por isso, não se podem dispersar tão facilmente pelas montanhas”, salienta o especialista.

Apesar de no curto-prazo os rios dos glaciares que derretem poderem crescer e até criar novos cursos de água, Jonathan Carrivick, outro dos autores, avisa que, daqui a várias décadas, “a maioria dos rios tornar-se-ão mais secos, fluirão mais lentamente” e pode haver anos em que não corra qualquer água. “Além disso, a maior quantidade da água dos rios alpinos será mais quente no futuro”, não servindo para a vida adaptada ao frio que agora habita neles.

Mas nem tudo são más notícias, pois no ‘jogo’ da sobrevivência há sempre vencidos e vencedores. Neste último grupo poderão estar os vermes do grupo dos platelmintos, que os cientistas acreditam que será capaz de se adaptar aos novos ambientes com menos quantidade de gelo.

“Ações decisivas por parte dos líderes mundiais para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa poderão limitar as perdas”, afirma Martin Wilkes, da Universidade de Essex, que esteve também envolvido neste trabalho.

“Por outro lado, a inação poderá significar que as perdas acontecerão mais cedo do que prevemos”, alerta.





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