Aquecimento global e poluição: População de tartarugas-verdes em risco por falta de machos
As tartarugas-verdes (Chelonia mydas) são uma espécie de tartaruga marinha considerada em risco de extinção pela União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN).
Entre as principais ameaças estão a caça furtiva, colisões com barcos, a destruição do seu habitat e as mortes por captura acidental. No entanto, outro perigo, porventura ainda mais grave, surge com o aquecimento dos oceanos, fruto das alterações climáticas impulsionadas pela ação humana.
Esta espécie, tal como outras tartarugas, são influenciadas pela temperatura ambiente. Isso significa, por exemplo, que temperaturas mais elevadas durante a fase de desenvolvimento embrionário, nos ovos, dão origem a mais fêmeas.
Estima-se que na região norte da Grande Barreira de Coral já nasçam centenas de fêmeas por cada macho. Este desequilíbrio poderá fazer cair a pique a capacidade de reprodução das populações de tartarugas-verdes e, assim, empurrá-las ainda mais para o precipício da extinção.
Como se não bastasse, uma outra ameaça surge que pode fazer pender os pratos da balança ainda mais para a perda dessa espécie: a poluição.
Num artigo publicado esta semana na revista ‘Frontiers in Marine Science’, um grupo de investigadores da Austrália revela que substâncias poluentes que chegam aos ambientes marinho fruto das atividades humanas podem fazer aumentar o nascimento de tartarugas fêmeas.
Liderada por Arthur Barraza, da Universidade Griffith, a investigação, parte do ‘Turtle Cooling Project’ da WWF Austrália, procurou deslindar os efeitos da poluição no desenvolvimento de tartarugas-verdes de uma população na Ilha de Heron, na zona sul da Grande Barreira de Coral. Nesse local, entre 200 e 1.800 fêmeas chegam para desovar todos os anos, pelo que é considerado um local privilegiado para o acompanhamento e estudo contínuo da espécie.
Nessa população, o rácio macho-fêmea apresenta um maior equilíbrio do que no norte, mais perto do equador, com cerca de três fêmeas a nascerem por cada macho.
Os investigadores perceberem, através de análise dos tecidos de tartarugas recém-nascidas, que a concentração de metais, como crómio, bário e antimónio, bem como de substâncias como hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (HAP), policlorobifenilos (PCB) e éteres difenílicos polibromados (PBDEs) podem promover a formação de embriões fêmeas.
Essas substâncias são ingeridas pela progenitora através dos peixes e espécies vegetais dos quais ela se alimenta. São depois transmitidas aos embriões aquando da formação dos ovos, influenciando a formação das jovens tartarugas.
Os resultados do trabalho mostram que elevadas concentrações de antimónio e cádmio eram responsáveis pelo nascimento de muito mais fêmeas do que machos da população estudada, uma vez que imitam a função da hormona estrogénio, que tende a resultar em embriões fêmeas.
Barraza avisa que à medida que as populações de tartarugas-verdes caminham para nascimentos quase exclusivamente femininos, “será cada vez mais difícil as tartarugas fêmeas adultas encontrarem um companheiro”, um fenómeno intensificado pela combinação dos efeitos das alterações climáticas com a poluição marinha.
Jason van de Merwe, também da Universidade Griffith e outro dos autores do estudo, considera importante perceber quais os poluentes que atuam na feminização das populações de tartarugas, para que se possam atuar no sentido de evitar que cheguem aos habitats desses animais.
“Dado que a maioria dos metais pesados vêm de atividades humanas”, como a mineração e escoamentos industriais e urbanos, “a melhor solução será usar estratégias de longo-prazo baseadas na ciência para reduzir os inputs de poluentes nos nossos oceanos”, salientou.