Áreas protegidas falham na proteção de 76% de todas as espécies de insetos



Os insetos são animais que gozam de uma reputação dúbia: se por um lado pode ser vistos como um incómodo, especialmente nos dias quentes de verão, e como ‘pragas’ que arruínam colheitas, por outro são considerados importantes agentes da manutenção da natureza devido à sua atividade de polinização e ao facto de serem essenciais em diversas redes tróficas.

São esses serviços que prestam aos ecossistemas, que por sua vez fornecem serviços indispensáveis aos humanos e a tantos outros animais, que fazem com que seja fundamental protegê-los contra perdas populacionais causadas pelo mau uso dos solos, por práticas agrícolas menos ambientalmente sustentáveis, pela destruição dos seus habitats, pela poluição, pelas alterações climáticas, entre muitas outras causas que tem feito cair a pique os números de espécies e de indivíduos desse grupo, um dos maiores do reino animal. Estima-se que mais de 80% de todas as espécies de animais sejam insetos.

Contudo, uma equipa de investigadores da Alemanha, da Austrália e do Canadá diz-nos agora que, a nível global, 76% de todas as espécies de insetos não estão a ser devidamente tidas em conta na designação e manutenção das áreas protegidas.

Os cientistas dizem que os insetos têm sido marginalizados nos programas de conservação da natureza e da biodiversidade e que esse grupo representa apenas 8% de todas as espécies abrangidas pela Lista Vermelha de Espécies Protegidas da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), um ‘barómetro’ do mundo natural que nos permite perceber e avaliar o estado de conservação da espécies de animais, plantas e fungos.

Por isso, e com base em estudos já realizados, defendem que é possível que as áreas protegias protejam também os insetos, se forem criadas tendo esse objetivo como uma das prioridades e se essas zonas coincidirem com as áreas de distribuição desses pequenos animais.

O trabalho teve por base as quase 90 mil espécies de insetos registadas na Global Biodiversity Information Facility, considerado o maior repositório de dados sobre biodiversidade de todo o mundo, e revelou que as áreas protegidas falham na proteção dos insetos, incluindo várias espécies criticamente em perigo, como a formiga Nothomyrmecia macrops, a libelinha Megalagrion leptodemas e a borboleta Apantesis phalerata.

Além disso, os investigadores perceberam também que a distribuição de perto de 1.800 espécies de insetos não coincidem com qualquer área protegida.

Shawan Chowdhury, da University Jena, na Alemanha, e principal autor do artigo publicado na revista ‘One Earth’, confessa-se surpreendido, negativamente, pela descoberta e diz que “muitos dos dados sobre insetos vêm de áreas protegidas, pelo que pensávamos que a proporção de espécies cobertas por áreas protegidas fosse maior”.

E o especialista destaca que essa discrepância é muito maior relativamente aos insetos do que a espécies de vertebrados, que, ainda assim, 57% não estarão abrangidas devidamente pelas áreas protegidas.

No entanto, essa falta de proteção dos insetos não é igual nas áreas protegidas em todo o mundo, uma vez que se constatou que na Amazónia, nas Américas Central e do Sul, na África Subsariana, na parte ocidental da Austrália e na Europa Central existe uma maior porção de espécies se insetos protegidas. Em contraponto, é na América do Norte, na Europa de Leste, na Sul e Sudeste asiáticos e em algumas regiões da Austrália que os insetos estão mais expostos e a grande maioria não está abrangida pelas áreas protegidas.

Shawan Chowdhury afirma que esses animais têm sido “frequentemente negligenciados” na designação de áreas protegidas, sendo que o foco tende a incidir sobre espécies de vertebrados. Sendo s insetos um grupo “que contém uma vasta proporção dos reino animal e desempenha diversas funções nos ecossistemas, isso é preocupante”, salienta.

Pouco mais de um mês depois de os líderes mundiais terem adotado a Estrutura Global para a Biodiversidade, na cimeira global dedicada ao tema (COP15) que decorreu em dezembro no Canadá, os autores dizem que é tempo de dar o merecido destaque ao insetos nas estratégias de conservação. Este é um momento bastante oportuno para reforçar a proteção dos insetos, pois a Estrutura Global para a Biodiversidade contempla, como um dos principais eixos, a designação como áreas protegidas de, pelo menos, 30% de todas as áreas terrestres, marinhas, costeiras e de água doce.

Para que essa proteção possa ter sucesso, é preciso, no entanto, recolher mais dados sobre as espécies e populações de insetos em todo o mundo, sobretudo em zonas como uma elevada taxa de biodiversidade. A esse respeito, assinala que todos nós, incluindo o leitor, temos um papel central a desempenhar na identificação e avaliação das populações de insetos e da sua distribuição, através da chamada ‘ciência cidadã’, em que todos e cada um podem ajudar a preencher as falhas de conhecimento que existem hoje sobre esses animais.

“Os cientistas e os decisores políticos agora têm de se chegar à frente e ajudar neste desafio que é a identificação de locais de importância para a conservação dos insetos”, remata Shawan Chowdhury.





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