“Armadilha tóxica”: Dívidas aos países ricos mantêm Estados mais pobres ‘reféns’ dos combustíveis fósseis



Os países mais pobres, do chamado Sul Global, não têm alternativa senão manterem-se dependentes da exploração de combustíveis fósseis como forma de gerar receitas para pagarem dívidas às nações mais ricas e a credores privados.

A conclusão é de um relatório publicado esta segunda-feira por 35 organizações não-governamentais, incluindo a portuguesa Oikos – Cooperação e Desenvolvimento.

Enquanto na região ocidental do hemisfério norte do planeta se procura abandonar a energia fóssil em prol de uma transição energética que permita alicerçar essas sociedades em modelos de produção e consumo de energia de fontes limpas e renováveis, no sul o cenário é outro.

Os relatores avançam que para vários países em desenvolvimento, como a Argentina, o Uganda e Moçambique, poderá ser “impossível abandonar progressivamente os combustíveis fósseis” em prol das renováveis, a não ser que o problema das suas dívidas externas “seja resolvido”.

“Os governos do Sul Global não serão capazes de cortar a dependência da produção de combustíveis fósseis a menos que resolvamos os prejudiciais níveis de endividamento e as vulnerabilidades e desigualdades que estão associadas aos atuais sistemas financeiros e de dívida”, escrevem.

Assim, as organizações defendem, sobretudo, a implementação de planos de cancelamento das dívidas externas de todos os países mais pobres que deles precisem para poderem abdicar da energia fóssil, bem como o reforço do financiamento a esses Estados para poderem fazer face aos danos sofridos por eventos climáticos extremos.

“Altos níveis de endividamento são uma das principais barreiras ao abandono progressivo dos combustíveis fósseis para muitos países do Sul Global”, explica Tess Woolfenden, responsável de políticas da Debt Justice, uma das organizações que participou no trabalho.

A ativista alerta que muitos países em desenvolvimento estão ‘reféns’ da exploração da energia fóssil “para gerar receitas para pagar as dívidas”, e salienta que, por vezes, os projetos de combustíveis fósseis podem não gerar as receitas esperadas “e podem deixar os países ainda mais endividados do que quando começaram”.

Woolfenden fala de uma “armadilha tóxica” em que os Estados mais pobres estão enredados, apelando a que as nações do Norte Global cancelem “urgentemente” as dívidas dos seus contrapartes do Sul “para evitar ainda mais problemas climáticos”.

Para Mae Buenaventura, do movimento Asian People’s Movement on Debt and Development, cancelar as dívidas dos países mais pobres “é o mínimo que os países ricos e os credores podem fazer para compensar o Sul Global” pelos danos que a esses Estados causaram por causa do financiamento de projetos de energia fóssil. E diz que se trata de “uma questão de justiça”.

As alterações climáticas, e todos os seus efeitos, “estão a afundar cada vez mais os países vulneráveis em dívidas, aprisionando-os num ciclo vicioso que, perversamente, alimenta o investimento em combustíveis fósseis” que agudiza a crise climática, argumenta Arthur Larok, secretário-geral da organização ActionAid International.





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