Associação cabo-verdiana com futuro incerto receia que falte proteção para tartarugas
O presidente da associação ambiental cabo-verdiana Careta-Careta disse hoje à Lusa que aquela organização tem um futuro incerto e que as tartarugas que nidificam na ilha de Santiago, sob a sua vigilância, poderão “morrer descontroladamente”.
“O financiamento que temos este ano não vai chegar para fazermos este trabalho até ao fim” e, ao ritmo atual, “pode comprometer a preservação” da espécie.
“Se não fizermos o trabalho de preservação, as tartarugas vão morrer descontroladamente”, afirmou João Lomba.
A associação ambiental Careta-Careta (nome de uma espécie de tartaruga que nidifica em Cabo Verde) trabalha há 12 anos para proteger as tartarugas marinhas, tendo como base a parte sul da praia de Areia Grande, junto à localidade de Achada Igreja, 40 quilómetros a norte da cidade da Praia.
Este ano, os seus elementos têm vigiado 160 ninhos de tartaruga.
Outras três ilhas – Sal, Boa Vista e Maio – acolhem muitos mais, representando 95% da nidificação nesta altura do ano (junho a novembro), enquanro Santiago e o resto das ilhas significam 5%.
No que toca à ilha de Santiago – a maior de Cabo Verde -, a Careta-Careta é uma das entidades mais influentes nesta área de intervenção.
A monitorização é feita de dia e de noite nas praias de Areia Grande, Praia Baixo, Mangue, Porto Lancha e Achada Baleia.
“Em todas estas cinco praias temos no mínimo 160 ninhos. Areia Grande e Achada Baleia são zonas com maior número”, descreve.
Os membros da associação ajudam também a evitar a captura ilegal de tartarugas, usadas pelos residentes para venda e alimentação.
“Em Achada Baleia já tivemos duas capturas e se houver chuvas e não tivermos condições de ir, ou se demorarmos a chegar, eles capturam”, acrescentou João Lomba.
“Esta zona é crítica. Encontramos sempre caçadores”, apontou.
A vigilância começou em junho, período das desovas, mas tem sido “muito desafiante” manter voluntários a patrulhar a zona.
Apesar de terem um financiador estrangeiro há três anos, amigo da associação, a par da Escola Portuguesa de Cabo Verde, que este ano os começou a apoiar, o dinheiro não é suficiente para “dar conta do recado”.
“Areia Grande é uma zona que fica mais próxima”, mas a deslocação para as outras praias tem custos.
João Lomba questionou: se as tartarugas e outras espécies são protegidas, porque é que os voluntários não o são também – até porque alguns residentes os veem com animosidade, ao travar a captura ilegal.
“A nossa preocupação é ver essas tartarugas morrer nos próximos anos ou até mesmo no fim desta temporada. Não há um plano do Governo para travar este problema e nós continuamos este trabalho, até onde pudermos. Mas é uma tristeza”, insistiu.
A emigração e a deslocação para outras ilhas também têm feito diminuir o número de voluntários.
“Neste momento temos 35 voluntários, mas têm diminuído. Quando saírem, fica difícil encontrar outros, porque temos que dar treino”, realçou João Lomba.
Os cães vadios também têm sido uma preocupação porque atacam os ninhos, mesmo depois de a associação ter investido numa vedação para proteger as tartarugas.
Outros cães têm dono, mas são pouco alimentados e procuram os ninhos.
Cabo Verde introduziu legislação para proteger as tartarugas marinhas pela primeira vez em 1987, proibindo a sua captura em épocas de desova, e desde 2018 prevê outros tipos de crime, nomeadamente o abate intencional, bem como a aquisição, a comercialização, o transporte ou desembarque, a exportação e o consumo.
A população de tartarugas marinhas ‘Caretta caretta’ de Cabo Verde é a terceira maior do mundo, sendo apenas ultrapassada pelas populações na Florida (Estados Unidos) e em Omã (Golfo Pérsico).