Comunidades amazónias mostram ser possível produção agrícola com respeito pela floresta



Comunidades do estado brasileiro do Pará procuram mostrar que é possível fazer da agricultura um meio de subsistência e ao mesmo tempo preservar, cuidar e respeitar a maior floresta tropical do mundo e a cultura ancestral dos povos originários.

“Não podemos só trabalhar o crescimento, só a economia, porque a gente depende da floresta. Sem ela…”, conta à Lusa Izete Costa, produtora rural e chocolateira na Ilha do Combu, no Rio Guamá, muito próxima à cidade de Belém, no estado do Pará, conhecida pela produção de cacau e pelo cultivo tradicional e sustentável através de práticas agroflorestais.

Izete Costa, de 61 anos, mais conhecida como Dona Nena, aprendeu com o pai “a cuidar da floresta” e essa missão está sempre presente na fábrica de chocolate Filha do Combu, que ajudou a promover o turismo na região e a criar emprego nesta ilha, sempre com a preservação da floresta amazónica das tradições ribeirinhas na mente.

O seu sucesso foi corado em março deste ano com a visita do Presidente brasileiro, Lula da Silva, e do Presidente francês, Emmanuel Macron.

Durante a visita para conhecer a produção artesanal de cacau desta fábrica de chocolate, Macron aproveitou para condecorar o líder indígena da etnia Kayapó, o Cacique Raoni, com a mais alta condecoração da França: a medalha da Ordem Nacional da Legião de Honra.

“Não esperava a visita de dois Presidentes”, disse, orgulhosa, Dona Nena, frisando que foi o reconhecimento do seu trabalho e um sinal de que está “fazendo a coisa certa”.

Esta popularidade que a ilha vem ganhando, traz, contudo, aspetos nefastos para os guardiões da sustentabilidade florestal e do modo ancestral.

“Apesar de ser bom para a comunidade, a gente também consegue enxergar a parte negativa”, como a “falta de consciência dos barqueiros”, criticou, considerando ser necessário que se dê “uma freada” (um travão): “Para que a gente consiga manter isso para os nossos netos, para os nossos filhos”.

Tal como a Filha do Combu, foram surgindo ao longo dos anos centenas de marcas de chocolate que procuram ser sustentáveis e ao mesmo tempo distribuir rendimentos às comunidades ribeirinhas e indígenas no estado do Pará.

Entre os dias 26 e 29 de setembro, a cidade de Belém, capital do Pará, acolheu a 39.ª edição da Chocolat Festival, num evento no qual os produtores amazónicos procuraram mostraram precisamente que a sustentabilidade e o rendimento podem andar lado a lado.

Uma delas é Tatiana Xippxa, que contou à Lusa ter sido uma inspiração para que seis outras etnias indígenas , como Sídja Wahiu, Iawá e Karaum Paru agarrassem na “forma ancestral” de cultivo e desenvolvessem um modelo sustentável de negócio.

“Trabalhamos assim para mostrar ao branco que ele pode fazer a mesma coisa”, disse.

Outro dos casos é a Natur´art, uma associação familiar liderada pela mãe Esmeralda Cardoso e a filha Franciele que desenvolvem produtos do ambiente, das folhas, raízes e sementes amazónicas em extinção.

Utilizam o cacau e outros produtos como o cupuaçu e o bacuri para fazerem chocolates, aproveitando os excedentes para cerâmica.

Em entrevista à Lusa, Marco Lessa, conhecido como o empresário do chocolate brasileiro, que lidera um grupo de empresários e entidades que procuram promover a aproximação entre investidores do Brasil e de Portugal, explicou que o objetivo deste evento é procurar que o “pequeno seja beneficiado”, alicerçado nos pilares da proteção ambiental e do impacto económico e social.

“O grande acaba por fazer um modelo de negócios muito desequilibrado”, frisou, referindo-se à utilização de insumos de baixa qualidade para baixar o preço e à pressão dos acionistas.

Nos dias 24 a 27 de outubro, o Chocolat Festival terá a sua terceira edição em Vila Nova de Gaia, no espaço WOW, e contará com marcas do Brasil, Portugal, França, Equador, Itália, Espanha, Japão, Madagascar, Bélgica, São Tomé e Príncipe, entre outros.

O objetivo é “contar para o português e para o mundo a importância que Portugal tem na história do chocolate”, sublinhou o empresário brasileiro que reside em Portugal, referindo-se ao facto de os portugueses, assim como os espanhóis, terem chegado à Amazónia e terem tido contacto com o cacau nos séculos XV e XVI.

“Portugal e Espanha foram fundamentais para a expansão do cacau e do chocolate no planeta e as pessoas quando falam de chocolate na Europa só falam de França, Bélgica e Suíça”, disse.

“Se não houvesse Portugal e Espanha não havia chocolate no mundo”, frisou, enaltecendo o investimento das antigas cortes no plantio.

Paralelamente ao Chocolat Festival, o Wow acolhe o evento Origem Brasil de negócios,com a missão de fortalecer a relação comercial entre Brasil e Portugal e no qual, de acordo com a organização, “mais de uma dezena de compradores de diversas partes da Europa virão ao evento para fazer negócios com os produtores brasileiros e portugueses em diversas áreas comerciais”.





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