COP15: Só é possível proteger a biodiversidade protegendo os direitos dos povos indígenas
A cimeira global da biodiversidade, a COP15, continua a atrair as atenções do mundo para a cidade de Montreal, no Canadá, onde este sábado, dia 10 de dezembro, milhares de pessoas saíram às ruas, enfrentando o frio lancinante, para alertar que não há proteção da biodiversidade sem a proteção dos direitos dos povos indígenas.
Numa marcha promovida pelas organizações Colectifs COP15 e Global Youth Biodiversity Network (GYBN), os manifestantes quiserem alertar os líderes mundiais que as decisões que saírem da reunião-magna sobre a natureza “terão impactos diretos nos povos indígenas a nível global”, de acordo com um comunicado divulgado pela Greenpeace.
A historic day for #GYBN community🌿
We took the streets in #Montreal together with civil society to call the leaders and decision-makers at @CBD_COP15 @UNBiodiversity to #StopTheSame and
to include #HumanRights in the text! ✊🏾✊🏿✊🏾👉🏾The message is clear
Rights & Equity NOW!! pic.twitter.com/xFnBsGjKV3— Global Youth Biodiversity Network (GYBN) (@GYBN_CBD) December 11, 2022
Empunhando cartazes com mensagens como “Equidade”, “Justiça para o nosso futuro” e “Justiça para a Natureza” e “Justiça social”, os manifestantes defendem que as negociações sobre a biodiversidade não podem ignorar a forte ligação que existe entre a proteção do mundo natural e dos povos indígenas e comunidades locais que vivem em ambientes pautados por grande diversidade biológica.
Ronald Brazeau, responsável de recursos naturais da reserva Lac-Simon, que representa o povo indígena ‘First Nation’, do Québec, afirma que a perda de habitat “está a empurrar muitas espécies para o limiar da extinção”, destacando, em particular, os caribus, “uma espécie essencial para as culturas e tradições de povos indígenas”.
E diz que não são apenas os caribus que estão ameaçados, pois “povos indígenas estão a ser forçados a mudar as suas formas de vida e, como resultado, as comunidades estão a sofrer física, mental e espiritualmente”, apontando que ignorar os direitos dessas populações nas estratégias para proteger a natureza representa “uma forma de racismo sistémico”.
Por sua vez, Orpha Yoshua, uma mulher indígena do grupo Namblong, da província de Papua, na Indonésia, que esteve entre os manifestantes, recorda que as florestas de Papua, de Kalimantan e de Sumatra “são cruciais para conservar a biodiversidade e para proteger o clima”.
E avisa que a destruição desses florestas altamente diversas despoletará “uma massiva crise climática”, acompanhada da extinção de espécies como a irreverente ave-do-paraíso, assinalando que, nesse quadro negro, não será apenas a cultura indígena Namblong que será devastada, mas também a cultura “de todos os povos em todo o mundo”.
Da parte da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), uma organização que congrega várias organizações que compõem o movimento indígena brasileiro, Dinamam Tuxá, salienta que “não há qualquer futuro para o clima e para a biodiversidade sem os povos indígenas”.
“Esta COP15 deve tomar medidas urgentes para conter o avanço das perdas de biodiversidade a nível global”, afirma, mas salienta que “todas as novas metas que estão a ser formuladas devem ter por base os direitos dos povos indígenas”.
Falando como indígena, Tuxá sublinha que “se somos os maiores protetores da biodiversidade”, lembrando que cerca de 80% da biodiversidade global está localizada em territórios de povos indígenas, “porque é que não somos os principais atores e não estamos sentados ao lado dos decisores?”.
Já Valentin Engobo, líder da vila de Lokoloma, da República Democrática do Congo, em África, e responsável da Associação dos Camponeses Pigmeus de Lokolama, pede, “em nome da minha comunidade indígena”, que o acordo que venha a sair da COP15 “assegure o total envolvimento dos povos indígenas em todos os procedimentos e decisões relacionados com a proteção das florestas e da biodiversidade”.
E frisa a importância do acesso desses grupos nativos a financiamento para que possam reforçar os seus esforços de conservação da natureza.
“A única forma ética e ecologicamente sustentável de proteger a natureza é reconhecer os direitos dos povos indígenas que vivem nela e que, há décadas, têm usado o seu conhecimento tradicional para protegê-la”, diz Valentin Engobo.