COP26: Adaptação de empresas varia entre setores com mais pequenas sem estratégia definida



A adaptação à sustentabilidade varia entre as empresas portuguesas, consoante setor e dimensão, com mais disponibilidade na energia, construção ou agroalimentar, enquanto micro e PME estão sem uma estratégia “perfeitamente definida” e a tentar recuperar da crise, segundo associações empresariais.

“As empresas portuguesas são uma realidade muito diversa. Assim, o grau de maturidade com que já integram o tema da sustentabilidade nas suas cadeias de valor varia muito, por exemplo, consoante o setor, a dimensão e o tipo de empresa”, disse à agência Lusa o secretário-geral do Business Council for Sustainable Development (BCSD) Portugal ou conselho empresarial para o desenvolvimento sustentável, João Wengorovius Meneses.

A Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas (CPPME) apontou à Lusa que estas estarão atentas “a tudo o que efetivamente vier a ser colocado em prática” a partir dos compromissos assumidos pelos países na conferência do clima, que se inicia no domingo e decorre até 12 de novembro em Glasgow, Escócia, copresidida pelo Reino Unido e por Itália.

“Bem sabemos que dos compromissos à prática vai um longo caminho, que nem sempre é percorrido por todos”, defende a confederação, salientando que, em Portugal e no que respeita as micro e PME (MPME), “não existe, neste momento, uma estratégia perfeitamente definida nesta matéria”.

A Lusa questionou associações acerca das preocupações e expectativas relativamente a esta 26.ª conferência das Nações Unidas sobre alterações climáticas (COP26) que junta os países no esforço de encontrar soluções para a redução das emissões dos gases com efeito de estufa.

O BCSD Portugal, que reúne mais de 120 empresas, explica que “os setores onde se sente uma disponibilidade maior para o tema da sustentabilidade são os setores energético, da construção, agroalimentar, da mobilidade e da moda. Mas, em todos eles, há que acelerar”.

“O nível de compromisso e ação atuais ainda não são suficientes para cumprirmos o Acordo de Paris sobre o clima [que definiu metas para a redução de emissões], o Pacto Ecológico Europeu e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas”, justifica João Wengorovius Meneses.

O maior desafio que as empresas enfrentam “é serem capazes de transitar para cadeias de valor e modelos de negócio que sejam regenerativos, isto é, que tenham um impacte positivo no mundo” e permitam que os seus parceiros e clientes optem por este tipo de impacte, através das suas decisões de consumo, investimento e de trabalho, resume.

Para o responsável, as empresas “precisam, sobretudo, de regras estáveis e claras”, na fiscalidade, na regulamentação e na política de incentivos, sendo “fundamental criar um mapa de referência para a década 2020-2030”.

“Esperamos que a COP26 dê um contributo decisivo para que o Acordo de Paris sobre o clima seja alcançado, sabendo que acabamos de entrar na década derradeira para tal”, já que os compromissos de descarbonização dos 196 países signatários do Acordo de Paris “estão longe de estar alinhados com a redução global necessária de 50% na emissão de gases com efeito de estufa, até 2030”, acrescenta.

A CPPME refere que muitas MPME já adotaram práticas de proteção ambiental, “algumas que decorrem do cumprimento de exigências legais”, como separação de lixos ou aquisição de equipamentos menos poluentes, mas salienta que muitas destas empresas “estão, neste momento, a sair de uma grave crise” provocada pela pandemia sanitária.

“Face a este cenário, o foco da grande maioria das MPME, sobreviventes à crise, está na recuperação da sua atividade”, defende aquela entidade.

E é a esta retoma que destinam os investimentos, dirigidos a reposição de ‘stocks, a manutenção de equipamentos ou a preenchimento de postos de trabalho, esforço que decorre num quadro de escassez e de aumento dos preços das matérias primas.

Reconhecendo que “a transição para uma economia mais verde é fundamental para a sobrevivência da espécie humana” e que “tudo o que possa ser feito nesse sentido” representa um investimento e não um custo, a CPPME diz-se disponível para dar o seu contributo.

A Lusa contactou também algumas empresas acerca das suas expectativas sobre a COP26, tendo obtido respostas da EDP e da Cimpor.

“A gravidade crescente dos fenómenos climáticos tem colocado em evidência, de forma cada vez mais urgente, a necessidade de acelerar a transição para uma economia de baixo carbono, em particular com a produção de energia a partir de fontes renováveis. É nesse contexto que se espera que esta COP estabeleça o fim do carvão como fonte de geração de energia”, afirma o administrador da EDP Miguel Setas.

Para o responsável, além do tema central da transição para uma economia de baixo carbono, “espera-se a negociação do Artigo 6 do Acordo de Paris, que define os instrumentos para a criação de um mercado global de carbono”.

“Obviamente que também estarão em destaque as soluções de financiamento para viabilizar a transição para a neutralidade carbónica, em especial para os países menos desenvolvidos”, aponta o responsável que marcará presença em Glasgow.

Para a EDP, a grande expectativa é que se consiga cumprir nesta COP o que ficou prometido na de Paris, em 2015.

Por sua vez, Luís Fernandes, administrador da Cimpor – Cimentos de Portugal, considera que o “limitado nível de participação dos países grandes emissores de CO2 na COP26 reduz as expectativas de se poderem alcançar compromissos significativos e, também, a possibilidade de entendimento quanto a um ‘level playing field’ [condições equitativas] a nível internacional, que deveria ser o grande objetivo destas negociações”.

“O compromisso de partilha de esforço no sentido da descarbonização do planeta seria a grande decisão a esperar desta conferência, mas tal não parece possível com tanta ausência”, sublinha.

Luís Fernandes defende que “as empresas necessitam de previsibilidade para a tomada das suas decisões económicas e o contexto atual cria incertezas adicionais, quase insuportáveis, às incertezas climáticas, regulatórias e políticas já existentes”.

“Embora pudesse parecer que os atuais preços da energia tornariam viáveis alguns dos investimentos em futuras tecnologias, o contexto económico em que vivemos não o permite”, refere.

Para a Cimpor, “as mudanças só podem fazer-se de uma forma equilibrada e harmoniosa, nunca no meio de dificuldades económicas e sociais”.

“Precisamos de energia abundante e económica para o nosso desenvolvimento e temos de fazer a transição para fontes de energia limpa de uma forma acelerada, mas de forma a não provocar constrangimentos na nossa economia”, defende.

Mais de 120 líderes políticos e milhares de especialistas, ativistas e decisores públicos são esperados em Glasgow para atualizar os contributos dos países para a redução das emissões de gases com efeito de estufa até 2030.

Apesar dos compromissos assumidos até agora, as concentrações daqueles atingiram níveis recorde em 2020, mesmo com a desaceleração económica provocada pela pandemia de covid-19, segundo a ONU, que estima que, ao atual ritmo de emissões, as temperaturas serão no final do século superiores em 2,7 ºC.





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