COP27: Fundo para perdas e danos é “importante” mas é preciso mais, alertam especialistas



Este fim de semana as delegações dos quase 200 países presentes na 27.ª cimeira mundial do clima, a COP27, chegaram, por fim, a um acordo sobre a criação de um fundo para compensar os países mais vulneráveis por perdas e danos sofridos por fenómenos extremos causados pelas alterações climáticas.

Apesar de se considerar um passo importante na direção certa, algumas vozes alertam que é preciso ir mais longe para que se possa concretizar uma verdadeira ‘justiça climática”. Desde logo, o próprio Secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, argumentou este domingo que “a COP27 deu um importante passo em direção à justiça”, mas acautelou que o fundo “não será suficiente” para combater as alterações climáticas e os seus efeitos sobre as comunidades que estão mais expostas.

Ainda assim, acredita que “é um sinal político muito necessário para reconstruir a confiança” entre as várias nações do mundo, especialmente entre o Norte Global e o Sul Global, isto é, entre os países mais ricos e os países em desenvolvimento.

As reações ao anúncio do acordo não tardarem em fazer-se ouvir. A organização ambientalista internacional WWF publicou um comunicado no qual indica que a decisão da cimeira climática de Sharm El-Sheikh para ser criado um fundo para perdas e danos é “bem-vinda”, mas lamenta que a declaração final da COP27, conhecida como o ‘Plano de Implementação’, “falha em ações mais ambiciosas para reduzir as emissões.

Por isso, o limite de 1,5 graus Celsius de aquecimento global acima dos níveis pré-industriais, definido no Acordo de Paris de 2015, “está a fugir-nos das mãos, com consequências desastrosas para o mundo”, alerta da WWF.

Manuel Pulgar-Vidal, responsável de políticas climáticas e energéticas da WWF e que ocupou o cargo de presidente da COP20, defende que o acordo entre as várias delegações para o estabelecimento de um fundo para perdas e danos climáticos “é um passo positivo”, mas que “arrisca tornar-se um ‘fundo para o fim do mundo’ se os países não avançarem mais depressa no que toca à redução das emissões”.

“Ao falharem em chegar a um acordo sobre o abandono progressivo dos combustíveis fósseis”, diz Pulgar-Vidal, os líderes mundiais escolheram manter o planeta “na rota da catástrofe climática”, explicando que “sem cortes rápidos e profundos nas emissões, não podemos limitar a escala das perdas e dos danos”. Por isso, “não podemos dar-nos ao luxo de ter mais uma cimeira como esta”, aponta, considerando “inaceitável que os negociadores tenham falhado em alcançar um acordo mais ambicioso do que o que se conseguiu em Glasgow no ano passado”, na COP26.

Por sua vez, Alice Ruhweza, diretora regional da WWF para África, recorda que “esta era suposto ter sido a ‘COP de África’, mas falhou em responder às necessidades e prioridades do continente”, que está “na linha da frente da crise climática e é altamente vulnerável aos seus impactos”.

A União de Cientistas Preocupados (UCS), uma organização não-governamental que congrega perto de 250 cientistas, analistas e de especialistas das áreas da comunicação estratégica e desenvolvimento de políticas empenhados em responder aos “problemas mais urgentes do nosso planeta”, reconhece a importância do consenso alcançado sobre o fundo, mas também argumenta que “o acordo não permite responder inteiramente à urgência cada vez maior da crise climática global”.

Rachel Cleetus, diretora de políticas no Programa de Clima e Energia da UCS, admite que “os líderes mundiais finalmente ouviram os apelos dos países climaticamente vulneráveis e acordaram em estabelecer um fundo para perdas e danos climáticos”, destacando esse resultado como “uma grande vitória para a justiça climática que dá esperança a muitos milhões no Sul Global”.

O entendimento, prossegue, demonstra solidariedade para com as comunidades mais expostas aos efeitos das alterações climáticas, e aponta que “os Estados Unidos e outros países ricos começaram a restaurar a confiança e a credibilidade necessárias para que as nações possam responder juntas a este desafio global”.

Cleetus assinala que “há um longo caminho pela frente para tornar este fundo operacional e para assegurar que serve as necessidades das comunidades mais afetadas” por desastres relacionados com o clima.

No entanto, e ecoando outras vozes críticas, a responsável diz que “a decisão final da COP27 fica aquém do que a ciência demonstra ser necessário”, sublinhando que as emissões de gases poluentes para a atmosfera continuam a aumentar e a dificultar a concretização da meta de 1,5 graus de aquecimento global.

Salientando que o documento final da cimeira “não reflete a necessidade urgente” de reduzir o consumo de combustíveis fósseis e acelerar a transição para as energias limpas e renováveis, Cleetus refere que “as nações mais ricas continuam a falhar no cumprimento das suas obrigações financeiras climáticas, vitais para ajudar países de rendimentos baixos e médios a cortarem as suas emissões e a adaptarem-se às alterações climáticas”, e acusa os líderes mundiais de “retórica oca”.

Ainda assim, ela diz que “apesar de imperfeita, a decisão da COP27 representa um passo em frente que nos dá esperança e abre espaço a maior ambição nos próximos anos”, e que nesta “década decisiva” os países têm de pôr de lado “interesses nacionais míopes” e colocar “os interesses das pessoas e do planeta acima dos interesses dos poluidores”.





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