Dia Mundial da Água: 80% dos Municípios com défice tarifário no serviço de abastecimento de água apresentam elevadas perdas de água



A ZERO analisou um conjunto de dados que constam do Relatório Anual dos Serviços de Água e Resíduos de Portugal, de 2022 (referente ao ano 2021), da Entidade Reguladora da Água e dos Resíduos (ERSAR) procurando correlacionar a cobertura de custos das entidades gestoras dos serviços de abastecimento de água, em baixa, com a eficiência dos sistemas de abastecimento que gerem, nomeadamente ao nível dos procedimentos de faturação e de redução de perdas. A associação considera, assim, que o regime de tarifas “deverá assegurar a tendencial recuperação dos custos com a prestação dos serviços em respeito pelo princípio do utilizador-pagador e pelo uso eficiente dos recursos”, sublinha em comunicado.

Segundo a mesma fonte, a informação processada “evidenciou a existência de relação entre a percentagem de água não faturada (que inclui as perdas reais de água) e a recuperação de custos com o serviço pelas entidades gestoras, uma vez que, em 79% das entidades que apresentam um nível de cobertura de gastos inferior a 100%, apresentam simultaneamente um desempenho do serviço insatisfatório em relação ao indicador ‘Água não faturada’, verificando-se na sua quase totalidade em áreas predominantemente rurais, havendo apenas seis situações associadas a áreas mediamente urbanas”.

Em comparação, acrescenta, menos de metade (46%) dos municípios com bom desempenho na cobertura de gastos apresentam “avaliação insatisfatória” em relação à água não faturada, os quais respeitam sobretudo a áreas mediamente urbanas.

Estes dados “revelam a disparidade que existe, ao nível das tarifas e do investimento nas infraestruturas, entre as entidades gestoras cujos territórios de intervenção se classificam como áreas predominante e mediamente urbanas e os que se classificam como áreas predominantemente rurais”, afirma a associação.

A mesma fonte salienta que a água não faturada “representa toda a água que, depois de captada, tratada, transportada, armazenada e distribuída, não chega a ser faturada, quer pelas perdas reais, quer pelo uso autorizado ou não autorizado que, em muitos casos, não é sequer alvo de qualquer medição”.

Água não faturada em 2021 representou perdas económicas de 347 milhões de euros

A água não faturada tem rondado, ao longo da última década, os 30% da água que entra no sistema, o que, em 2021, no serviço em baixa, correspondeu a 237 milhões de metros cúbicos, representando perdas económicas de cerca de 347 milhões de euros, tendo em conta o preço médio do serviço de abastecimento de água (1,4631 €/m3), revela ainda a Zero.

Segundo a associação, as perdas de água “configuram assim um fator decisivo para a eficiência hídrica do setor em especial no que toca às perdas reais, devidas a ruturas ou extravasamentos, cujo total, em baixa, foi de 174 milhões de metros cúbicos, acrescido de 23 milhões no serviço em alta, o que, segundo a própria ERSAR, corresponde a 1,5 vezes o volume de armazenamento da albufeira de Odeleite, no Algarve, o que permitiria servir 2,9 milhões de habitantes em Portugal”.

Sustentabilidade dos serviços comprometida

A Lei da Água (Lei n.º 58/2005, de 29 de dezembro), e o Regime Financeiro dos Recursos Hídricos (Decreto-Lei n.º 97/2008, de 11 de junho), em consonância com o Direito Comunitário, determinam que o regime de tarifas dos serviços de águas, que são cobradas aos utilizadores, deverá assegurar a tendencial recuperação dos custos com a prestação dos serviços em respeito pelo princípio do utilizador-pagador e pelo uso eficiente dos recursos.

“Este é um objetivo que se afigura difícil de concretizar com entidades gestoras que insistem em praticar tarifas incapazes de garantir a cobertura integral dos gastos incorridos, a maioria das quais a funcionar em regime de gestão direta pelos municípios, os quais recorrem frequentemente aos orçamentos municipais para subsidiar os serviços de forma pouco transparente, desviando verbas que poderiam apoiar de forma mais eficaz o desenvolvimento económico dos territórios. Esta situação é agravada pelo limitado poder regulatório que a Entidade Reguladora possui em relação às tarifas aplicadas, traduzindo-se num incumprimento generalizado dos princípios do utilizador-pagador e do poluidor-pagador previstos na Lei de Bases da Política de Ambiente”, lamenta a associação.

A recuperação dos gastos pelas entidades gestoras pela via tarifária e o consequente e significativo aumento das tarifas imputadas aos consumidores, é uma medida que a ZERO vê como “absolutamente necessária, pese embora tenha de ser aplicada com garantias da existência de tarifários que discriminem positivamente os cidadãos mais desfavorecidos e as entidades da economia social”. A recuperação dos gastos por essa via, pelo risco de comprometer a acessibilidade económica dos consumidores e gerar a sua insatisfação “pode colocar em causa o objetivo de regulação do equilíbrio económico e financeiro das entidades gestoras, deve, pois, acontecer de forma gradual e associada a outros mecanismos de receitas, inclusive a subsidiação através de receitas de impostos e/ou do apoio do Fundo Ambiental, desde que executada com transparência e de forma limitada”, conclui.

 





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