Dos invertebrados às baleias: o impacto do ruído na saúde dos oceanos
Cientistas documentaram os impactos do ruído nos animais e ecossistemas marinhos e identificam ações para restaurar os sons saudáveis do oceano.
A chuva cai levemente na superfície do oceano. Mamíferos marinhos gorjeiam e gritam enquanto nadam. O bater das ondas ao longo de uma costa distante levanta e bate com uma regularidade cronometrada. Estes são os sons que muitos de nós associamos ao ambiente marinho. Mas o som ambiente de um oceano saudável já não reflete o ambiente acústico do oceano de hoje, atormentado pelo ruído criado pelo homem.
Uma equipa de cientistas decidiu perceber como o ruído produzido pelo homem afeta a vida selvagem, de invertebrados a baleias, nos oceanos, e encontrou evidência de que a fauna marinha e os seus ecossistemas são afetados negativamente pelo ruído. Este ruído atrapalha o seu comportamento, fisiologia, reprodução e, em casos extremos, causa mortalidade. Os cientistas pedem que o ruído induzido por humanos seja considerado um fator de stress prevalente à escala global e que sejam desenvolvidas políticas para mitigar os seus efeitos.
A investigação publicada na revista Science, é reveladora para a prevalência global e intensidade dos impactos de ruído do oceano. Desde a Revolução Industrial, os humanos tornaram o planeta, os oceanos em particular, mais barulhentos através da pesca, navegação, desenvolvimento de infraestruturas e muito mais, ao mesmo tempo em que silenciavam os sons dos animais marinhos que dominavam o oceano primitivo.
“A paisagem sonora é um indicador poderoso da saúde de um ambiente”, observou, em comunicado, Ben Halpern, co-autor do estudo e diretor do Centro Nacional de Análise e Síntese Ecológica da UC Santa Barbara. “Como fizemos nas nossas cidades terrestres, substituímos os sons da natureza em todo o oceano pelos dos humanos.”
A deterioração de habitats, como recifes de coral, prados de ervas marinhas e leitos de kelp com pesca excessiva, desenvolvimento costeiro, alterações climáticas e outras pressões humanas, silenciaram ainda mais o som característico que guia as larvas de peixes e outros animais à deriva no mar para encontrar e se estabelecerem nos seus habitats. O “call home” não é mais audível para muitos ecossistemas e regiões.
O meio marinho do Antropoceno, segundo os investigadores, está poluído por sons de origem humana e deve ser restaurado ao longo das dimensões sónicas, e junto às mais tradicionais, químicas e climáticas. No entanto, as estruturas atuais para melhorar a saúde dos oceanos ignoram a necessidade de mitigar o ruído como um pré-requisito para um oceano saudável.
O som viaja para longe e rapidamente debaixo de água. E os animais marinhos são sensíveis ao som, que utilizam como um sinal sensorial proeminente guiando todos os aspectos de seu comportamento e ecologia. “Isto torna a paisagem sonora do oceano um dos aspectos mais importantes, e talvez subestimados, do ambiente marinho”, afirma o estudo. A esperança dos autores é que as evidências apresentadas no artigo “levem a ações de gestão para reduzir os níveis de ruído no oceano, permitindo assim que os animais marinhos restabeleçam o uso do som do oceano”.
A conclusão do estudo é que “mitigar os impactos do ruído das atividades humanas na vida marinha é a chave para alcançar um oceano mais saudável”. O estudo liderado pela KAUST identifica uma série de ações que podem ter um custo, mas são relativamente fáceis de implementar para melhorar a “paisagem sonora” e, com isso, possibilitar a recuperação da vida marinha e o objetivo do uso sustentável do oceano.