Em 300 anos, o planeta terá perdido 20% das suas zonas húmidas por causa das atividades humanas
As zonas húmidas são ecossistemas nos quais a água é o elemento central. Além de serem ‘pontos quentes’ de biodiversidade, são importantes sumidouros de carbono, alimentam os aquíferos subterrâneos de água doce e ajudam a purificar esse bem cada vez mais escasso.
Não é por acaso que as Nações Unidas, desde 2022, assinalam o Dia Mundial das Zonas Húmidas, uma efeméride celebrada a 2 de fevereiro e que pretende alertar para a urgência e importância de proteger, restaurar e conservar estas áreas de grande relevância para a biodiversidade, para a regulação do clima, para o ciclo da água e para a mitigação dos efeitos das alterações climáticas.
Apesar de apenas cobrirem 6% da superfície da Terra, estimativas apontam para que cerca de 40% de todas as espécies de animais e de plantas dependam das zonas húmidas, para viverem, para se alimentarem e para se reproduzirem.
No entanto, as zonas húmidas têm sido alvo de sucessivos ataques, sobretudo pelas atividades humanas. Durante muito tempo, foram considerados terrenos desadequados à exploração agrícola e que as suas águas paradas eram autênticos viveiros de insetos transportadores de doenças. Por isso, as suas águas eram drenadas para hidratar culturas e a sua vegetação era usada como combustível e como fertilizante.
É por essa razão que atualmente as zonas húmidas são dos ecossistemas mais ameaçados do planeta.
Uma investigação científica internacional revela que desde o ano 1700 a área global de zonas húmidas terá sido reduzida em 21% devido às atividades humanas. Embora estes valores fiquem significativamente abaixo das perdas estimadas em estudos anteriores, entre 50% e 87%, os cientistas dizem que isso não é razão para qualquer tipo de otimismo, uma vez que se estima que, entre 1700 e 2020, tenham sido perdidos cerca de 3,4 milhões de quilómetros quadrados de zonas húmidas em todo o mundo. Essas perdas foram sobretudo causadas pela conversão em terrenos agrícolas.
A Europa ocidental e central, a região oriental dos Estados Unidos e o leste da China são os países onde nos últimos 300 anos se registaram as maiores perdas de zonas húmidas, que terão acelerado a partir de meados do século XX, adiantam os investigadores num artigo publicado na revista ‘Nature’.
“Estes novos resultados permitem-nos quantificar melhor as alterações no sequestro de carbono da atmosfera por parte das zonas húmidas e a emissão de metano, outro poderoso gás com efeito de estufa”, argumenta Avni Malhotra, da Universidade de Stanford e uma das autoras.
Os investigadores apontam que a diferença entre as estimativas agora apresentadas e as que tinham sido divulgadas em estudos anteriores se deve ao facto de esta investigação não se limitar a analisar regiões que historicamente apresentam altas perdas de zonas húmidas, ampliando o leque de estudo a outras zonas com menores perdas.
E dizem mesmo que os números agora apresentados podem estar aquém do real, pois os dados anteriores a 1850 são escassos.
Calcula-se, por exemplo, que os Estados Unidos tenham perdido 40% das duas zonas húmidas só nos últimos 300 anos, e essas perdas representam mais de 15% do total global desse período.
No topo da lista está a Europa, com perdas que em muitos países de aproximam lamentavelmente dos 100%. Calcula-se que, desde 1700, a Irlanda tenha perdido mais de 90% das suas zonas húmidas, que a Hungria, a Alemanha e a Hungria tenham perdido mais de 80% e que os Países Baixos e a Itália tenham perdido mais de 75%.
Embora admitam que a conversão de zonas húmidas tenha vindo a desacelerar, os cientistas avisam que não há espaço para respirar de alívio, porque em algumas regiões do planeta a sua destruição continua de ‘vento em popa’, tal como na Indonésia, onde agricultores e empresas continuam a desflorestar grandes porções de terreno para plantações de óleo de palma e para outros fins agrícolas.
“Descobrir que se perderam menos zonas húmidas do que antes se pensava dá-nos uma segunda oportunidade para agir contra mais declínios”, salienta Peter McIntyre, da Universidade de Cornell e outro dos autores.