Entrevista a Joana Balsemão: O acesso à terra “é essencial à saúde e bem-estar da comunidade”



A Green Savers falou com Joana Balsemão, vereadora para a área do Ambiente da Câmara Municipal de Cascais, sobre a iniciativa “Verdes Solidários”, que regressou dia 17 de dezembro, e o Programa “Terras de Cascais”. Para a responsável, “o acesso à terra, mesmo que seja apenas por lazer, é essencial à saúde e bem-estar da comunidade”.

– A promoção da agricultura urbana começou em Cascais em 2009, com a criação das primeiras Hortas Comunitárias. Das hortas passaram para os pomares e, mais recentemente, para as vinhas. Fale-nos um bocadinho desta evolução.

A primeira horta comunitária surgiu no âmbito da Agenda 21, em conjunto com o orçamento participativo. Foi um processo participativo em que os moradores decidiram sobre as valências que gostariam de ter num espaço verde público do seu bairro, na altura devoluto. Depois foram surgindo mais hortas porque se percebeu a multiplicidade de benefícios que traziam para a comunidade e para o ecossistema de Cascais. A criação dos pomares e vinhas surgiu naturalmente, no sentido de alargar a produção local a outro tipo de alimentos. As pessoas reagiram muito bem. É interessante ver que a produção de Vinho de Carcavelos em Cascais ressurgiu com as Vinhas Comunitárias. Desde 2015 não se registava qualquer produção de Vinho de Carcavelos dentro dos limites do concelho. Importa dizer que toda a produção é biológica.

– Em Cascais, a agricultura biológica e regenerativa tem ganho espaço desde que se criou a primeira horta comunitária em 2009. Hoje, sob o programa Terras de Cascais, estamos a falar de quantas hortas, pomares e vinhas?

Neste momento existem 34 hortas comunitárias, 5 pomares e 4 vinhas comunitárias. Para além destes espaços, temos ainda cerca de 50 hortas nas escolas, duas hortas biológicas de maiores dimensões – a Horta do Pisão, para visitação do público, e a Horta do Brejo, que está dentro do Estabelecimento Prisional de Tires -, e ainda a Vinha do Mosteiro de Santa Maria do Mar, 2,7 hectares para produção de Vinho de Carcavelos.

– O projeto cresceu para apoiar e incentivar a produção e o consumo de produtos frescos locais, biológicos e sazonais. De que forma e quem é que esteve/está envolvido no processo?

Aquilo que começou como um projeto de Hortas Comunitárias tornou-se hoje num programa alargado de promoção da agricultura biológica em Cascais. A Divisão Terras de Cascais, inserida na Cascais Ambiente, dedica-se por exclusivo a este programa. Contudo, existem muitas pessoas envolvidas: os munícipes que participam ao cultivar os terrenos, a comunidade escolar através das Hortas nas Escolas, a rede social de instituições que distribuem os legumes biológicos pelas famílias mais necessitadas e a academia que estuda o nosso programa e produz conhecimento.

– Quais os desafios e oportunidades ao longo do processo?

Penso que o maior desafio continua a ser o de conseguir responder a todas as pessoas interessadas em ter um espaço para cultivar. O acesso à terra, mesmo que seja apenas por lazer, é essencial à saúde e bem-estar da comunidade. Nas hortas, as pessoas ocupam o seu tempo livre com uma atividade tão saudável que lhes permite exercitar o corpo, passar tempo na natureza, conversar com os vizinhos e ainda alimentarem-se de produtos mais nutritivos e livres de químicos. Para uma pessoa reformada ou para alguém que vive o stress de uma vida na cidade, ter uma horta pode ser decisivo para o seu bem-estar. Neste momento temos cerca de 1900 pessoas em lista de espera para as hortas comunitárias e esse número nunca baixou. À medida que se criam novas hortas, há sempre mais pessoas a inscreverem-se. Existe muita vontade de criar mais espaços de cultivo e neste momento estamos a trabalhar em novos projetos que irão permitir a instalação de novos agricultores profissionais em Cascais.

– Os Verdes Solidários, iniciativa do município de Cascais, de recolha de bem alimentares frescos, originados, sobretudo, nas hortas comunitárias do concelho, regressou dia 17 de dezembro. Cada horticultor, fruticultor e viticultor é convidado a doar um cabaz de legumes biológicos e locais que serão distribuídos frescos à população carenciada, através das instituições de solidariedade social do concelho. Como é que correu?

Os Verdes Solidários são sempre um ponto alto do nosso ano. É um momento de encontro com os horticultores, onde se celebra as primeiras colheitas do outono e as pessoas ficam contentes por poder ajudar. Este ano conseguimos doar mais de 1 tonelada de legumes frescos a cerca de 1500 famílias. A insegurança alimentar não é só não ter capacidade de colocar comida na mesa, é também não ter acesso a alimentos que compõem uma dieta saudável e culturalmente apropriada. A premissa dos Verdes Solidários é então combater a insegurança alimentar, disponibilizando legumes frescos e biológicos a quem dificilmente teria acesso a eles.

– Nota-se alguma diferença na perceção das pessoas da necessidade de uma alimentação mais saudável entre 2016 (altura em que a iniciativa “Verdes Solidários teve início) e este ano?

Nota-se que a preocupação em ter uma alimentação saudável é uma tendência geral, mais ou menos partilhada por todas as pessoas. Contudo, é essencial que esse tipo de alimentação esteja acessível à maioria da população e é aí que tentamos atuar. Promover uma alimentação saudável baseada numa ligação mais próxima com a terra.

 





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