Equipas desportivas podem ajudar a proteger a vida selvagem



Um novo estudo internacional mostra que quase um quarto das equipas profissionais de desporto em todo o mundo recorre a animais selvagens no nome, no logótipo ou na identidade dos adeptos — um potencial ainda pouco explorado para apoiar a conservação da biodiversidade. Os investigadores defendem que as organizações desportivas poderiam desempenhar um papel ativo na proteção destas espécies através de campanhas de sensibilização, parcerias com ONG e financiamento para a preservação de habitats.

Publicado na revista BioScience e co-assinado por investigadores da Flinders University, o trabalho analisou 727 equipas de 50 países e 10 modalidades, identificando 161 espécies diferentes usadas na imagem de clubes profissionais. Mamíferos e aves lideram a lista, mas a diversidade é ampla: todas as semanas, caranguejos, crocodilos, cangurus e enguias defrontam arminhos, pelicanos e lulas nos campos e pavilhões de futebol, râguebi e voleibol. Um mapa interativo destas equipas está disponível em The Wild League Map.

“Os organismos desportivos mobilizam audiências globais vastíssimas, e a vida selvagem está no centro de muitas das suas identidades”, afirma o autor principal, Ugo Arbieu, da Universidade Paris-Saclay, em França. “Esta ligação emocional entre adeptos e os animais que representam as suas equipas pode ser aproveitada para apoiar a conservação em grande escala.”

O professor Corey Bradshaw, especialista em biodiversidade e co-autor do estudo, sublinha que esta tendência global representa uma oportunidade singular para canalizar a paixão dos adeptos em favor da natureza. “O desporto é uma força cultural, e na Austrália faz parte da nossa identidade nacional. Com tantas equipas a usar fauna nativa como cangurus e coalas, existe um enorme potencial para transformar o orgulho desportivo em ação conservacionista”, afirma.

Segundo o estudo, mais de metade das equipas utiliza espécies consideradas ameaçadas, de acordo com a Lista Vermelha da IUCN. “Leões e tigres simbolizam força e coragem, mas na vida selvagem muitas destas espécies estão em declínio”, lembra o co-autor Franck Courchamp. “As equipas têm uma oportunidade — e talvez uma responsabilidade — de ajudar a proteger a biodiversidade que lhes dá identidade.”

A investigação revela ainda diferenças regionais: clubes em África e na Ásia recorrem mais a espécies locais, como elefantes asiáticos ou africanos, enquanto organizações europeias e americanas tendem a adotar símbolos de outras partes do mundo, como leões ou tigres. “Estas escolhas refletem a forma como cada sociedade se relaciona com a vida selvagem”, explica a professora Melanie Sartore-Baldwin, da East Carolina University, co-autora do estudo. “Algumas espécies são selecionadas por serem símbolos nacionais; outras pela ligação aos ecossistemas locais ou pelos valores que transmitem, como solidariedade ou coesão.”

Os investigadores defendem que as organizações desportivas podem apoiar ativamente a conservação por meio de campanhas, colaborações com ONG e financiamento para proteger habitats. “Estes símbolos têm força porque chegam a públicos amplos, muitas vezes difíceis de alcançar pelos meios tradicionais de comunicação ambiental”, destaca o co-autor Diogo Veríssimo, da Universidade de Oxford. “Se apenas uma fração das organizações desportivas usasse a sua plataforma para apoiar a vida selvagem, o impacto seria verdadeiramente transformador.”

Veríssimo recorda que as chamadas espécies-bandeira podem abrir caminho à proteção de ecossistemas inteiros. “Veja-se o caso dos San Jose Sharks, nos Estados Unidos. Pouca gente sabe que existem 70 espécies de tubarões no país, 31 delas ameaçadas. Estes emblemas podem ajudar a proteger não só os animais, mas também os habitats de que dependem, como zonas costeiras, rios ou pastagens.”

Para o professor Bradshaw, o estudo evidencia uma oportunidade perdida para o desporto assumir um papel de liderança na defesa da biodiversidade. “Imaginem o impacto se todas as equipas com cangurus, coalas ou outros símbolos da fauna australiana apoiassem projetos de proteção dessas espécies e dos seus habitats”, afirma.

Com esta análise, a equipa espera incentivar uma colaboração mais estreita entre os sectores da conservação e do desporto — dois mundos que raramente interagem, apesar do enorme potencial conjunto. Nesse sentido, criaram a iniciativa global The Wild League (thewildleague.org), que reúne atores do universo desportivo para promover a conservação da biodiversidade.






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