Esquilo-vermelho de volta à Serra de Sintra depois de quase 500 anos de extinção local
Desde meados do século XVI que não se avistavam esquilos-vermelhos (Sciurus vulgaris) na Serra de Sintra. Mas agora pensa-se que o pequeno roedor possa realmente ter regressado, depois de ter sido detetado no Parque Natural de Sintra-Cascais, pelos vigilantes do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), que faziam trabalho de campo de monitorização de espécies nesse local.
O abate de árvores, nos anos de 1400, para responder às necessidades de madeira da indústria naval, as queimadas para renovar pastos, o corte de árvores para obtenção de lenha para aquecimento e a desmatação excessiva levaram à “intensa desflorestação do território”, contou à ‘Green Savers’ fonte do ICNF. Por isso, em 1875, as florestas cobriam apenas 7% do país.
Resultando numa “profunda depleção dos recursos florestais” e em “impactos na fauna florestal” em Portugal, esses mesmos fatores atingiram também a Serra de Sintra, pelo que é muito provável que a “redução drástica da floresta” nessa região tenha provocado a extinção local do esquilo-vermelho.
Esta espécie, facilmente distinguível por uma pelagem que faz jus ao nome que lhe foi atribuído, alimenta-se, sobretudo, de sementes, de frutos e de fungos, embora possa também comer, ainda que com menor frequência, pequenos invertebrados, líquenes, flores e ovos. Habita florestas de coníferas (como os pinheiros ou os ciprestes) ou de outras espécies que produzam as sementes das quais se alimenta e que ofereçam abrigos.
Então, a que se deve o ressurgimento do esquilo-vermelho na Serra de Sintra ao fim de todos estes séculos? Segundo nos conta o ICNF, deve-se a dois fatores. Um deles prende-se com os programas de reintrodução da espécie na década de 1990, como no Monsanto em 1993, mas também com a libertação de subespécies de esquilo-vermelho, como a Sciurus vulgaris infuscatus no Jardim Botânico da Universidade de Coimbra e a Sciurus vulgaris fuscoater no Parque Biológico de Gaia.
“Razões estéticas, recreativas e de educação ambiental estiveram na base destas ações, aparentemente bem-sucedidas, uma vez que passados 20 anos as populações locais se mantêm”, explica o ICNF, apontando que outro fator de grande importância para o ressurgimento da espécie está relacionado com a “recolonização” do território português por parte de grupos provenientes do norte da Península Ibérica, particularmente da Galiza, e que se dispersaram naturalmente para Portugal.
Um pequeno ‘silvicultor’ com uma grande importância ecológica
O esquilo-vermelho desempenha um papel importante dos ecossistemas florestais, uma vez que tem por hábito esconder parte das sementes que recolhe em buracos nas árvores ou debaixo da terra, uma forma de armazenar comida para alturas de menor abundância.
Ao fazê-lo, este roedor contribui, ainda que inadvertidamente, para o processo de regeneração natural das florestas, assumindo um papel de ‘silvicultor’.
Além disso, é também uma espécie que serve de alimento a outros mamíferos e a aves de rapina, entre as quais espécies ameaçadas como a águia-de-Bonelli (Aquila fasciata), a águia-calçada (Hieraaetus pennatus), o bufo-real (Bubo bubo) e o açor (Accipiter gentilis). E também é uma importante fonte de alimento para outras espécies que, embora não tendo estatuto de ameaça, são, diz-nos o ICNF, “raras em Sintra”, como é o caso da fuinha (Martes foina).
Atropelamentos são a principal causa de morte
Embora as doenças, especialmente as virais, se contem entre as principais causas da morte dos esquilos-vermelhos em Portugal, o atropelamento é “a principal ameaça à espécie”, fruto da expansão das redes de estradas, que, fragmentando os seus habitats naturais, obrigam os roedores a fazerem travessias que podem ter desfechos trágicos.
A par dos atropelamentos, “[a] utilização de métodos de controlo de pragas florestais com inseticidas de largo espectro” e os incêndios florestais são também ameaças, a primeira porque pode “causar mortalidade por intoxicação alimentar”, e a segunda por resultar na morte dos esquilos pela inalação do fumo, por queimaduras ou, indiretamente, pela destruição do seu habitat, a redução do alimento disponível e o aumento da fragmentação das florestas.
O ICNF considera que a presença do esquilo-vermelho no Parque Natural de Sintra-Cascais “já é uma boa notícia para a conservação da natureza, por contribuir para a biodiversidade desta área protegida, e também pelo papel que desempenha na cadeia alimentar do ecossistema”.