Existe um projeto que está a mobilizar os jovens para a ação climática: o 1Planet4All



O 1Planet4All, projeto europeu implementado em Portugal pela ONG VIDA, está a mobilizar os jovens portugueses para a ação climática. Em entrevista à Green Savers, Ana Margarida Vaz, coordenadora do projeto no país, relata o propósito deste movimento e de que forma têm vindo a sensibilizar e informar o seu público – com idades entre os 15 e 35 anos – sobre as alterações climáticas e o desenvolvimento sustentável.

“Apesar de já ser assunto nas agendas política e mediática, ainda há um longo caminho a percorrer, muitas questões para refletir e uma grande necessidade de um maior envolvimento da sociedade civil nas mesmas. Procuramos com o “1Planet4All” que os/as jovens tenham maior e melhor conhecimento sobre esta realidade, e mais ferramentas para poderem olhar para o assunto de uma forma diferente, com maior capacidade crítica, e tomar as suas decisões, quer na esfera individual quer na esfera coletiva, de uma forma mais consciente e comprometida”, revela.

Fique a conhecer melhor este projeto e as ações que têm vindo a desenvolver em Portugal, em baixo.

Quando foi criado o projeto 1Planet4All? Qual é a sua missão?

O “1Planet4All” é um projeto europeu que resulta de um consórcio de 14 Organizações Não-Governamentais para o Desenvolvimento (ONGD’s) de toda a Europa e que teve início em fevereiro de 2020. Tem como objetivo consciencializar os jovens europeus entre os 15 e os 35 anos para os impactos das alterações climáticas por todo o globo, e inspirar e promover o seu envolvimento em ações concretas que contribuam para comunidades mais resilientes e “climate-smart”. Em Portugal, é implementado pela VIDA, uma organização não-governamental portuguesa com 30 anos de existência.

Enquanto Organizações da área do Desenvolvimento com trabalho junto de populações vulneráveis nos chamados países do Sul Global, interessa-nos igualmente, através do 1Planet4All, aproximar as realidades do Norte e do Sul Globais e promover um sentido de solidariedade e cooperação, pois apesar das dimensões globais que as alterações climáticas assumem, a verdade é que os países com menores responsabilidades históricas e, por outro lado, com menor capacidade de resposta e adaptação, têm sido os mais afetados. Por exemplo, na Guiné-Bissau e em Moçambique, países em que a VIDA está presente de forma contínua, conseguimos observar claramente os impactos concretos da crise climática que se manifestam na vida das famílias e das comunidades mais pobres e vulneráveis, extremamente dependentes do ecossistema em que vivem.

Que temáticas abrangem as vossas ações?

Procuramos abordar diversas temáticas ligadas às alterações climáticas e à sustentabilidade, nomeadamente a relação destes temas com os diferentes setores da nossa vida em sociedade e a necessidade de um consumo e de uma cidadania mais consciente.

Contamos com dois parceiros neste projeto que nos permitem também desenvolver ações em temáticas mais concretas, nomeadamente, a Faculdade de Letras da Universidade do Porto, na área da Comunicação das alterações climáticas, e a 2adapt, com ligação a investigadores em Alterações Climáticas da Faculdade de Ciências de Lisboa, com quem desenvolvemos atividades com uma componente mais prática de capacitação para a ação climática.

Quantas ações já foram desenvolvidas em Portugal?

Desde 2020 até hoje, temos desenvolvido diferentes tipos de atividades, de modo a chegar às diferentes faixas etárias (15 – 35 anos) com as quais o “1Planet4All” quer dialogar. No nosso canal de Instagram, criámos uma série de campanhas digitais onde convidámos diversos/as jovens influenciadores/as para se juntarem ao projeto e nos apoiarem na divulgação de mensagens-chave. Por exemplo, em fevereiro-março de 2021, até criámos uma série de lives chamados “1Talk4Planet”, onde convidámos um/uma especialista e um/uma influencer para falar sobre determinado tema: por exemplo, mitos vs. ciência das alterações climáticas; moda e sustentabilidade; agricultura e alimentação; oceanos e alterações climáticas. Estes lives estão disponíveis no nosso canal de Instagram e acessíveis a qualquer pessoa. Mais recentemente entre abril e junho, tivemos a campanha europeia #Act4Planet para sensibilizar para o grande impacto de mudanças simples, também dinamizada através do Instagram e de um website criado para este propósito.

Com grupos mais específicos, conseguimos dinamizar diferentes tipos de atividades: alguns fins-de-semana de plantação, dois workshops de permacultura urbana, as oficinas «Speakers do Clima» com estudantes universitários, e duas ações de formação com professores/as do ensino básico e secundário. Uma das ações mais icónicas e com grande impacto foi a plantação da FCULresta, uma minifloresta densa e biodiversa, plantada segundo o método do botânico japonês Miyawaki no campus da Faculdade de Ciências de Lisboa, em março de 2021. Substituímos um relvado, um espaço muito pouco biodiverso e com enorme consumo de água e gastos de manutenção associados, por uma floresta com um potencial de crescimento muito mais rápido (numa semana plantámos 677 plantas nativas de 48 espécies diferentes!), e com uma grande capacidade de promoção da biodiversidade urbana. Para além disso, tem um enorme potencial de inspirar e de ser um espaço verde acessível a todas as pessoas. Esta colaboração com a 2adapt e com a Faculdade de Ciências de Lisboa permite também que a aplicação deste método seja monitorizada e testada em contexto mediterrâneo, pois nunca antes havia sido testada no nosso país. Há diversos parâmetros que estão a ser monitorizados como a disponibilidade de água e a temperatura do solo, o crescimento das plantas. Partindo do potencial de inspiração deste espaço e da capacidade de sensibilização e de envolvimento comunitário, estamos atualmente a envolver 200 estudantes do ensino secundário em 4 escolas integrantes da área metropolitana de Lisboa na criação de espaços verdes resilientes, à semelhança desta minifloresta.

Plantação FCULresta | março de 2021
Plantação FCULresta | março de 2021

Pode mencionar as mais recentes?

Destacamos o desenvolvimento de 4 espaços verdes resilientes em 4 escolas da área metropolitana de Lisboa, três no concelho de Lisboa e uma no concelho do Seixal. Estamos, desde outubro de 2020, a trabalhar com cerca de 208 estudantes entre os 15 e os 19 anos e 12 professores/as de diferentes áreas do saber. O nosso objetivo é envolver toda a comunidade escolar na criação e dinamização de um pequeno projeto local que seja promotor da ação climática e da biodiversidade urbana, e que sejam espaço comum de aprendizagem.

Para além de todos os benefícios que estes espaços apresentam enquanto soluções locais que podem ser replicadas por todo o país, pretendemos acima de tudo estimular a relação destes e destas jovens com a natureza – cada vez mais difícil em contexto urbano –, favorecendo a sua relação com elementos do mundo natural. Esta religação é importante, não só em relação ao espaço em si, mas também entre as pessoas envolvidas – as palavras de ordem que têm emergido quando fazemos o balanço com estes/as estudantes são a cooperação, o compromisso, o esforço, a ligação, a entreajuda. Acreditamos que esta é uma das partes mais importantes de todo o processo. Talvez porque a indiferença e o alheamento de muitos dos problemas locais e globais também seja consequência desta falta de conhecimento, de ligação e de empatia entre nós, seres humanos que habitamos o mesmo planeta, e para com os ecossistemas naturais à nossa volta que são o garante da nossa sobrevivência na Terra. Em última análise, esperamos que possa ajudar a gerar uma maior empatia com os problemas ambientais e sociais que enfrentamos e que são consequência da exploração desequilibrada dos ecossistemas à nossa volta, e por outro lado, que possam sentir-se mais ativos/as e confiantes ao fazer algo por si e pelo Planeta, colmatando alguns sentimentos de indiferença e de impotência em relação a estes temas.

Plantação minifloresta na Escola Secundária Alfredo dos Reis Silveira, no Seixal
Plantação minifloresta na Escola Secundária Alfredo dos Reis Silveira, no Seixal

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Que resultados pode apresentar, para já, do que foi implementado?

Das atividades com estas 4 escolas, temos 4 espaços verdes construídos e inseridos na dinâmica escolar: duas miniflorestas e duas hortas ecológicas. Só nas duas miniflorestas, foram plantadas 689 plantas autóctones, de mais de 60 espécies, transportadas e utilizadas 16 toneladas de composto oriundo de resíduos urbanos recolhidos na cidade. Até ao final do projeto, em 2023, continuaremos a acompanhar e a apoiar estas escolas para que fiquem capacitadas para continuar a cuidar e a envolver a comunidade escolar nestes espaços verdes. Da FCULresta – para além de ser já um grande resultado por si –, já temos alguns resultados que ilustram o sucesso desta recém floresta como a elevada taxa de sobrevivência das plantas (81%), o sucesso das 150 bombas de sementes lançadas em março de 2021 que germinaram, desenvolveram-se, floriram e voltaram a produzir e lançar sementes ao solo, a atração crescente de biodiversidade para este espaço, e os diversos serviços de aprovisionamento, suporte, regulação e de recreio que providencia. Para a concretização deste espaço, foram envolvidos 23 parceiros e apoios e 150 jovens durante a semana de plantação. Numa outra componente, temos também já operacional um website chamado “Escolas pelo Planeta”, criado em parceria com a Faculdade de Letras da Universidade do Porto e no seguimento das oficinas

“Speakers do Clima”, a partir da ideia que lançámos como mote e desafio de unir todas as escolas do país num compromisso pela ação climática até 2024. O objetivo é que seja uma plataforma de convergência entre escolas e pessoas de diferentes pontos do país, onde possam partilhar e conhecer boas práticas já implementadas em contexto escolar. O website apresenta também um espaço para dar voz a jovens “speakers” que se podem envolver no projeto e publicar aí os seus conteúdos. Estamos, ainda, a compilar e a enriquecer uma secção de recursos existentes que podem ser utilizados por estudantes, professores/as e público em geral.

Até ao momento, nas atividades dinamizadas, foram envolvidos diretamente cerca de 550 jovens com idades entre os 15 e os 35 anos, e 34 professores e professoras do ensino básico e secundário. Nas campanhas digitais, envolvemos, desde início, cerca de 30 jovens influenciadores/as. Não podemos saber se estes números se traduzem numa mudança efetiva que queremos ver, mas importa-nos que para aqueles/as que já se sentem comprometidos, a participação neste projeto possa ter dado força para continuar a sua ação; e para quem se sente ainda desligado, que possa ter deixado uma pequena semente.

Speakers do Clima | Faculdade de Letras da Universidade do Porto

 

FCULresta | março de 2021
FCULresta | março de 2022

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Que projetos têm em curso para um futuro próximo?

O projeto “1Planet4All” terminará no início de 2023, e para já não há projetos previstos, embora estejamos a trabalhar para conseguir dar seguimento a este trabalho e a estes temas.

No entanto, até ao final do projeto, ainda teremos muitas atividades a decorrer, como por exemplo, em agosto, estaremos presentes no ACANAC’22, o Acampamento Nacional Escutista, em Idanha-a-Nova, onde dinamizaremos um atelier durante uma semana para crianças e jovens de todo o país; em setembro, participaremos num Youth Event, co-organizado por várias ONGD envolvidas no 1Planet4All; em outubro, dinamizaremos algumas oficinas integradas no Festival UmunduLx; e paralelamente, continuaremos também o trabalho em escolas secundárias e em algumas universidades.

Qual é a importância deste projeto para o país?

Este projeto surge no contexto atual em que os grandes desafios que as alterações climáticas trazem à nossa vivência humana e aos diversos ecossistemas do Planeta exigem um esforço conjunto e coordenado à escala global, mas também convocam a nossa responsabilidade e ação local enquanto cidadãos e cidadãs. No nosso país, este também é um dos principais temas da ordem do dia, pois os efeitos da crise climática já são visíveis um pouco por todo o país, para além de que faremos parte do grupo de países europeus mais afetados. Apesar de já ser assunto nas agendas política e mediática, ainda há um longo caminho a percorrer, muitas questões para refletir e uma grande necessidade de um maior envolvimento da sociedade civil nas mesmas. Procuramos com o “1Planet4All” que os/as jovens tenham maior e melhor conhecimento sobre esta realidade, e mais ferramentas para poderem olhar para o assunto de uma forma diferente, com maior capacidade crítica, e tomar as suas decisões, quer na esfera individual quer na esfera coletiva, de uma forma mais consciente e comprometida. O grande objetivo e último é que os/as jovens portugueses, e também europeus, possam desempenhar um papel comprometido e ativo em prol das mudanças necessárias para um desenvolvimento mais sustentável e inclusivo, almejado e preconizado nas metas da Agenda 2030.

Que papel têm os jovens na ação climática?

Temos sentido que estes temas e problemáticas não são indiferentes aos/às jovens com quem trabalhamos, há um conhecimento e uma aceitação geral, embora muitos e muitas ainda não estejam totalmente despertos para refletir com maior profundidade, fazer ligações e tomar ação. Por outro lado, cada vez vemos mais jovens que, individualmente ou em movimentos, demonstram uma grande vontade de agir, de fazer diferente e sentem verdadeiramente a urgência desta causa (e de muitas outras causas). Cremos que projetos como este que dialoguem com os/as jovens são fundamentais, pois para além de facultarem ferramentas, conhecimento, etc., podem ser também um espaço e oportunidade para encontrarem a sua voz. Se, por um lado, é urgente alertar e capacitar este grupo pois será quem mais sentirá na pele os efeitos da crise climática, a par das gerações vindouras, por outro, os/as jovens de hoje ocupam e ocuparão lugares decisivos nas diferentes esferas da sociedade, não só enquanto futuros/as líderes e decisores/as, mas também enquanto cidadãos/ãs, educadores/as, consumidores/as.





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