Fóssil encontrado no Brasil pode ser o elo perdido da evolução das iguanas



Paleontólogos brasileiros anunciaram ontem a descoberta de uma nova espécie de lagarto fóssil, denominada gueragama sulamericana, união das palavras Guera (antigo), agama (género feminino) e sulamericana, proveniente da América do Sul.

A descoberta, anunciada na revista Nature Communications e em vários media brasileiros, como o Encontro, foi realizada no Município de Cruzeiro do Oeste, noroeste do estado do Paraná, e tem cerca de 80 milhões anos.

Segundo os investigadores, foram encontrados poucos vestígios do animal: uma mandíbula esquerda com dentes, com cerca de 18 milímetros, e outros pequenos fragmentos do osso maxilar e dentes. A qualidade de preservação do exemplar, porém, é excepcional, o que permitiu aos estudiosos realizar descobertas impressionantes.

A equipa de cientistas responsável pelo estudo — uma parceria entre a Universidade do Contestado/CENPALEO, Museu Nacional/UFRJ e Universidade de Alberta — considera o achado extremamente importante para a paleontologia brasileira e mundial.

O gueragama sulamericana é um lagarto acrodonte, sendo o primeiro registo (fóssil ou vivo) de todo este grupo de répteis na América do Sul. Um dos maiores grupos de lagartos são os iguanídeos (representados por mais de 1.700 espécies vivas, mais as fósseis). Estes dividem-se entre os iguanídeos Acrodonta (informalmente, acrodontes), que existem atualmente apenas nos continentes do Velho Mundo, e nos iguanídeos não-acrodontes, que habitam predominantemente nas Américas.

Os fósseis mais antigos de acrodontes têm cerca de 180 a 160 milhões de anos e foram encontrados na Índia, que fazia parte do antigo supercontinente de Gondwana, juntamente com as actuais massas de terra do hemisfério sul. Este grupo dispersou-se pela Ásia durante o Cretáceo Superior (há 99 milhões e 65 milhões de anos), e muito posteriormente (durante o Cenozóico, era que se iniciou há 65 milhões de anos e se estende até hoje), pelo resto do Velho Mundo — Ásia, África e Europa.

A descoberta de gueragama sulamericana indica, portanto, que a dispersão deste grupo de répteis pelo hemisfério sul se deu muito antes do que se imaginava – aproximadamente 80 milhões de anos – e que os acrodontes alcançaram uma distribuição em escala global antes do Cenozóico — aponta o paleontólogo Everton Wilner, da Universidade do Contestado, em Mafra, no estado brasileiro de Santa Catarina, instituição que coordenou os trabalhos de campo, análise fotográfica do material e descrição filogenética.

A origem da fauna de lagartos e serpentes da América do Sul, importantes componentes da biodiversidade deste continente, continua um mistério. Porém, a descoberta da gueragama sulamericana ajuda a compreender um pouco mais desta origem. A nova espécie indica que pelo menos parte desta fauna primitiva de lagartos sul-americanos estava mais próxima dos grupos que hoje estão noutros continentes do que a grupos actualmente habitam a América do Sul.

Os animais da espécie gueragama sulamericana provavelmente viviam em tocas para evitar as altas temperaturas durante pelo menos parte do dia, como fazem lagartos acrodontes de habitat semelhante no norte da África e Oriente Médio, segundo o especialista em répteis da Universidade de Alberta Tiago Rodrigues Simões.

Há 87 a 75 milhões de anos, grande parte do centro-oeste, sudeste e sul do Brasil compunham um grande deserto, conhecido com como Deserto Caiuá, onde esta espécie habitava à volta de áreas húmidas, como oásis, convivendo com tapejarídeos (grupo de pterossauros) como a espécie Caiuajara drobuskii.

Para Alexander Kellner, do Museu Nacional/UFRJ, a descoberta demonstra o enorme potencial do Brasil para contribuir com o conhecimento da evolução dos vertebrados.





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