Genes das tartarugas marinhas podem conter o segredo para a sua sobrevivência num clima em mudança



Estima-se que há aproximadamente uma centena de milhões de anos, tartarugas terrestres ancestrais tenham migrado para os mares, evoluindo para os répteis marinhos plácidos que hoje conhecemos. No entanto, ainda pouco se sabe sobre as transformações genéticas que possibilitaram essa mudança drástica de habitat.

Um grupo de 48 cientistas de vários países acredita que o segredo para essa migração se esconde nos genes de duas espécies de tartarugas marinhas que hoje subsistem, a tartaruga-verde (Chelonia mydas) e a tartaruga-de-couro (Dermochelys coriacea). E estão também confiantes de que o mapeamento genético dessas espécies poderá ajudar a perceber os mecanismos que permitem a sua sobrevivência em climas em mudança, numa altura em que atravessamos o que é já considerado, com maior ou menor consenso, uma crise climática.

Tartaruga-verde (Chelonia mydas).
Foto: Filipe Silvia / Unsplash

Traçar o mapa genético de uma espécie permite conhecer o ‘código’ que faz dela o que é, mas não é tarefa fácil. Desde 2013, os cientistas têm à sua disposição o ‘rascunho’ do genoma da tartaruga-verde, mas Blair Bentley, da Universidade de Massachusetts, nos Estados Unidos, e principal autor da investigação divulgada na ‘PNAS’, diz que os dados estavam desorganizados, “era como se entrássemos numa biblioteca e encontrássemos 100 mil páginas dispersas no chão”.

Por isso, a primeira tarefa na lista de prioridades desta equipa era a sequenciação genómica mais precisa dessas espécies de tartaruga marinha. Depois de a informação genética estar devidamente organizada, os investigadores depararam-se com uma série de surpresas.

Uma delas prendia-se com o facto de o genoma das tartarugas-verdes e das tartarugas-de-couro, apesar de terem divergido há 60 milhões de anos a partir de um antepassado comum, ser bastante semelhante. Mas foram identificadas diferenças, que são o que torna essas espécies “únicas”, explica Lisa Komoroske, da Universidade de Massachusetts e uma das principais autoras do artigo.

Tartaruga-de-couro (Dermochelys coriacea).
Foto: Brian Skerry

Os cientistas acreditam que é nessas diferenças que reside o segredo para a sobrevivência dessas duas espécies a longo de milhares de anos.

As tartarugas-verdes desenvolveram mais genes dedicados à imunidade, o que leva os especialistas a crer que esses animais estão mais bem preparados para enfrentar novos patógenos, e ao olfato. Por outro lado, a análise genómica das tartarugas-de-couro revelou que essa espécie tem uma menor diversidade genética entre os seus indivíduos e tende a ter populações mais reduzidas.

Lisa Komoroske diz que isso é um ‘pau de dois bicos’, uma vez que a menor diversidade genética indica que a tartaruga-de-couro é uma espécie resiliente, que teve pouca necessidade de adaptação ao longo do seu percurso evolutivo, mas faz também com que tenha uma menor capacidade para se adaptar a um ambiente em rápida mudança.

Conhecer os segredos genéticos destas duas espécies, consideradas ameaçadas de acordo com a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), ajudará os conservacionistas a criarem os planos mais adequados à sua preservação num planeta em plena convulsão climática.

O estudo do genoma das duas espécies permitiu também perceber que a diferenças entre elas reside sobretudo nos chamados microcromossomas, pequenos elementos genéticos que não são encontrados nos mamíferos, mas que estão presentes nas aves e nos répteis. Por isso, os cientistas acreditam que esses microcromossomas podem conter dados valiosos sobre a evolução adaptativa dos vertebrados.





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