Grandes mandíbulas e caudas compridas: Cientistas revelam como os peixes colonizaram as profundezas dos oceanos



Os mares profundos, que se situam a cerca de 200 metros de profundidade, contêm mais de 90% de toda a água contida nos oceanos do planeta Terra. Contudo, apenas um terço de todas as espécies de peixes residem nesses habitats frios, desolados, sombrios e sujeitos a grandes pressões.

Apesar de se poder pensar que as áreas marinhas mais superficiais, quentes e abundantes em recursos, como, por exemplo, os icónicos recifes de coral, são os locais mais propícios ao desenvolvimento de novas espécies, um estudo publicado na revista ‘Proceedings of the National Academy of Sciences’ revela que, durante a longa história do mundo, houve alturas em que os peixes preferiam, realmente, as regiões mais profundas do oceano.

Elizabeth Miller, do grupo de cientistas da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, que conduziu a investigação, argumenta que “é fácil olhar para os habitats superficiais, como os recifes de coral, que são muito diversos e entusiasmantes, e assumir que sempre foram assim”. No entanto, a bióloga conta que os resultados do estudo “desafiam essa assunção” e ajudam a perceber como os peixes se adaptaram às mudanças climáticas que pautaram a história da Terra.

Com base na análise de registos genéticos de peixes com até 200 milhões de anos, Miller descobriu um padrão evolutivo que revela que o ritmo de especiação, ou seja, a velocidade a que novas espécies surgiam, flutuou ao longo do tempo. Assim, o estudo permitiu perceber que, ao longo de períodos que podiam estender-se às dezenas de milhões de anos, novas espécies de peixes desenvolveram-se mais rapidamente nas profundezas do oceano do que nas áreas mais superficiais.

Para estes cientistas, três grandes eventos na história da Terra poderão ter estado na origem dos movimentos dos peixes de águas mais quentes e superficiais para regiões mais frias e profundas. Um deles, apontam, é a separação do supercontinente conhecido como Pangeia, que terá ocorrido há cerca de 200 milhões de anos. “Isso criou novas linhas costeiras e novos oceanos”, explica Miller, e também permitiu aos peixes chegarem a novas áreas mais profundas.

Outro evento terá sido um período de intenso aquecimento global durante o Cretáceo, há cerca de 100 milhões de anos, e que, de acordo com os autores, terá sido uma das eras mais quentes da história do nosso planeta. Com o aumento da temperatura, as massas geladas derreteram, com outro estudo a indicar que era muito pouco provável que existissem plataformas de gelo nos pólos. Isso fez subir o nível do mar, inundando zonas costeiras e criando habitats mais superficiais e quentes, que permitiram a diversificação das espécies de peixes.

O terceiro grande evento que terá impulsionado a colonização das profundezas foi a transição climática do Mioceno médio, há cerca de 15 milhões de anos, que provocou alterações significativas nas correntes oceânicas e arrefeceu o planeta.

“Por esta altura, vemos que o ritmo de especiação em mares profundos acelerou verdadeiramente”, aponta Miller, que indica que essa diversificação se terá em muito devido a peixes que preferem águas mais frias.

Contudo, os cientistas indicam que não foram apenas esses eventos à escala planetária que permitiram aos peixes conquistar as zonas mais frias e escuras dos oceanos. A sua constituição anatómica foi também um elemento fundamental para que se conseguissem adaptar ao novo ambiente.

Os primeiros peixes a conseguirem singrar nesses novos habitats, mais duros e desafiantes, tendiam a ter maxilares maiores, que lhes permitia apanhar mais alimento, que nas profundezas era muito mais escasso do que à superfície, onde a luz solar permite o desenvolvimento de organismos fotossintéticos que formam a base de grandes e complexas cadeias alimentares.

Também os peixes com caudas mais longas e finas tinham maior sucesso no novo ambiente, pois permitiam-lhes navegar sem grandes gastos de energia pelo leito oceânico. “Se olharmos para quem hoje vive no mar profundo, algumas espécies têm corpos longos e outros têm mandíbulas grandes, assustadoras e cheias de dentes”, afirma Miller, indicando que são traços que se mantêm dos seus antecessores, os primeiros a colonizarem a escuridão marinha.

Fonte: Twitter / Elizabeth Miller

No entanto, esses peixes, mesmo a várias centenas de metros abaixo da superfície, podem estar ameaçados pelas alterações climáticas e pelo aquecimento dos mares.

“Com este estudo aprendemos que os peixes do mar profundo tendem a dar-se melhor quando os oceanos estão mais frios, mas, com as alterações climáticas, os oceanos estão a tornar-se mais quentes”, alerta a cientista, sublinhando que “é expectável que isso tenha realmente um impacto nos peixes das profundezas nos próximos anos”.





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