Investigadores alertam que aumento da pesca em águas internacionais pode estar a ameaçar populações de lulas



A pesca de lulas em águas internacionais aumentou 68% entre 2017 e 2020 e a contínua expansão das frotas pesqueiras para lá do controlo de entidades reguladores pode estar a ameaçar a sustentabilidade das pescarias.

As conclusões, reveladas na revista ‘Science Advances’, são de uma investigação realizada por uma equipa internacional de cientistas, que se focou nas regiões do sudoeste do Atlântico, no noroeste do Índico e no noroeste e sudeste do Pacífico, e que alerta que, embora não seja ilegal, a pesca em águas não sujeitas a regulação pode resultar na sobrepesca, neste caso, das lulas e exceder os limites da capacidade de recuperação dessas populações.

“Estas pescarias de lula são altamente móveis, pescando em múltiplos oceanos num dado ano”, avança Katherine Seto, Professora de Estudos Ambientais na Universidade da Califórnia e uma das autoras do artigo. “Embora estejam implementadas algumas medidas de conservação e gestão para regular este tipo de pesca, a nossa investigação constatou que os atores pode estar a tirar partido dessas regulações fragmentadas para maximizar a extração de recursos”, assinala.

Usando imagens de satélite e dados de monitorização de embarcações, os cientistas perceberam que 86% das embarcações de pesca de lula operam em alto-mar, longe da jurisdição dos Estados e do controlo regulatório, podendo, dessa forma, capturar grandes quantidades de pescado sem estarem obrigadas a cumprir quotas.

“A pesca não-regulada de qualquer espécie representa numerosos problemas”, apontam os autores, entre eles, a exploração excessiva levada a cabo por embarcações industriais e os impactos que decorrem dessa prática insustentável sobre a pesca artesanal nas Zonas Económicas Exclusivas (águas que estão sob a jurisdição nacional dos Estados). Por isso, os investigadores destacam que a não-regulação da pesca, além dos grandes impactos ecológicos, “exacerba a iniquidade sobre os pescadores tradicionais e de pequena escala”, que, devido à captura massiva em águas internacionais, acabam por ter acesso a menos lulas.

Com este trabalho, os investigadores querem recordar que, no que toca à proteção dos oceanos e à conservação da vida marinha, é importante não fazer incidir o foco das atenções somente sobre a pesca ilegal, mas também sobre a pesca não-regulada.

“Apesar dos danos substanciais sobre as populações de peixes, os ecossistemas marinhos, os pescadores artesanais e as comunidades costeiras, a pesca não-regulada tem recebido pouco atenção nos últimos anos comparativamente à pesca ilegal”, lamentam.

E indicam que as embarcações de pesca à lula se mantêm no mar, em média, entre três meses e um ano de uma só vez, um período muito mais longo do que a média de qualquer expedição dedicada à pesca de outras espécies comerciais. Isso faz com que seja possível uma pesca “quase constante” e “coloca pressão adicional sobre as populações de lulas, que os especialistas acreditam estar em declínio, quer globalmente, quer nas áreas estudadas”.

Para Osvaldo Urritia, da Pontificia Universidad Católica de Valparaíso, no Chile, todas as atividades que ocorrem no que é hoje conhecido como os global commons, áreas do planeta que, por estarem fora das jurisdições nacionais, pertencem a todos, “a pesca no alto-mar deve ser totalmente regulada”.

No entanto, o especialista denuncia que esforços nesse sentido têm sido obstaculizados por “uma mão-cheia de Estados” que beneficiam de atividades em áreas não-reguladas. “A pescaria global de lulas mostra o quão importante é o reforço da gestão regional dos recursos do alto-mar”, salienta, acrescentando que os Estados e organizações regionais devem “levar a sério” esses apelos.

Será importante recordar que no início deste mês de março, e depois de quase 20 anos de negociações, os governos de todo o mundo finalmente chegaram a um Tratado do Alto Mar, que, acima de tudo, pretende aumentar a proteção das águas dos mares e oceanos que estão excluídas das zonas económicas exclusivas dos Estados, para garantir a conservação dos ecossistemas e da vida marinha e para regular as atividades que possam prejudicá-los.

Para isso, este acordo tem como um dos objetivos centrais designar porções de águas internacionais como áreas marinhas protegidas, onde as lulas, e muitas outras espécies, poderão encontrar refúgio da captura humana.





Notícias relacionadas



Comentários
Loading...