Pegada positiva
Por Dora Rebola
Líder de Operações de Sustentabilidade
greenlivingprojects.com
“E se em vez de CONSTRUIRMOS EDIFÍCIOS QUE SÃO MENOS MAUS, CONSTRUíSSEMOS EDIFÍCIOS QUE SÃO BONS PARA O AMBIENTE?”
Sustentabilidade é uma “buzz word” que nos últimos tempos cansa o ouvido de muitos e assume demasiados significados. Sustentabilidade não é mais que a capacidade de se suster/ suportar. Qualquer ação cujo resultado final são “restos” sem destino, ações que levam à desigualdade extrema e à falta de oportunidades, não é sustentável porque leva a um caminho sem saída. A sustentabilidade também não é possível se só falarmos do ambiente ou da economia, temos que olhar para o todo, compreender que somos parte de um sistema vivo. Podemos ter soluções a nível ambiental, mas se o utilizador final não tem liberdade de escolha porque a sua condição económica não o permite, essas soluções serão sempre difíceis ou mesmo impossíveis de implementar. E o problema ambiental que enfrentamos não vai ser vencido se apenas a classe média alta tiver acesso às soluções “amigas do ambiente”.
Construção Regenerativa
O Living Building Challenge é uma certificação para a construção sustentável, mais exigente que outras que se tornaram mais comuns no mercado, como é o caso do BREEAM e do LEED. Esta certificação olha para o edifício como um sistema/organismo que deverá funcionar apenas dependendo da sua envolvente próxima. Quando o dizemos assim, parece que falamos de um conceito radical, de comunidades “hippies”, mas na realidade se olharmos para as casas dos nossos avós/bisavós há 100 anos (com raras exceções), era assim que as pessoas faziam. Hoje temos o benefício de ter acesso a uma variedade de tecnologias que nos permite tomar decisões informadas com resultados previstos ao detalhe, no entanto não temos que dispensar os ensinamentos dos nossos antepassados. O caminho está em aprender com o empirismo dos nossos antepassados que tinham que se adaptar às condições locais porque não tinham opção, e juntar-lhe a tecnologia que hoje está ao nosso dispor.
A construção regenerativa tem impacto positivo na sua envolvente, as águas cinzentas são depuradas com sistemas naturais e reutilizadas para as sanitas, as águas da chuva para a rega, a energia é produzida pelo próprio edifício sem emissões de carbono e exportada para a rede, (muitas vezes com benefício financeiro), os materiais não são tóxicos e no seu fim de vida podem voltar ao sistema, quer como recurso biológico, quer como componentes de novos materiais. Aspetos como saúde e felicidade, beleza e equidade também são tidos em conta porque no fim do dia, os edifícios e ambientes urbanos são feitos pelas pessoas e para as pessoas. Acima de tudo trabalhamos para oferecer maior qualidade de vida porque uma pessoa saudável é uma pessoa feliz.
Há atualmente cerca de 500 edifícios no mundo em processo de certificação pelo International Living Future Institute. O certificado só é atribuído após 12 meses de ocupação, durante os quais se analisa o comportamento do edifício no que toca aos consumos de água e energia para que no final desse período se determine se terá o certificado Living Building Challenge. Em Portugal ainda não existe nenhum edifício em processo para obtenção deste certificado, mas em Espanha existe um, localizado em Bresca (Pallars Sobirà).
Mudança de paradigma
Então e se em vez de construirmos edifícios que são menos maus, construíssemos edifícios que são bons para o ambiente?
A filosofia por trás do conceito da sustentabilidade diz que devemos agir segundo os princípios da economia circular, por oposição à economia linear. Tudo o que começamos tem que ser pensado em todo o seu ciclo de vida: materiais, edifícios, cidades e até políticas.
No Living Building Challenge o edifício é pensado desde a escolha da implantação/localização, desenho passivo, funcionalidade, conexão com a envolvente, ligações a nível de transportes, sistemas e tecnologia, extração dos materiais usados para a construção, passando pela gestão do lixo e poluição durante a obra e durante o uso do edifício, manutenção, limpeza e substituição de materiais, reabilitação, demolição e recolocação de recursos no sistema.
É verdade que é necessário que haja toda uma infraestrutura para que isto seja possível, no entanto já é uma realidade em muitos países, apenas à escala da necessidade que irá crescendo conforme o mercado for ampliando.
Acredito que apenas uma filosofia/política/pensamento que põe na mesa todos os elementos de um problema, que se preocupa em como o atingimos e o que fazemos quando está obsoleto, terá lugar no futuro. Não queremos fazer menos mal, queremos fazer bem e temos os meios para isso.
Espaços curativos
Nos dias que correm tornou-se relativamente comum encontrar pessoas com problemas de ansiedade, provenientes dos mais variados estilos de vida, estratos sociais, profissões, etc. A frequência com que nos deparamos hoje com doenças de foro psicológico, e não só, faz-nos questionar o porquê deste fenómeno. E nós, na Green Living Projects, acreditamos que as cidades e espaços onde vivemos e trabalhamos estão a contribuir para essa realidade.
Há já variados estudos que determinam que pessoas em processo curativo nos hospitais, curam mais rapidamente quando em contacto com a natureza porque esta faz com que os seus níveis de stress baixem.
Estima-se que os trabalhadores de escritório que se sentam ao lado de uma janela com vista tenham mais 20% de produtividade do que a média. Hoje, passamos cerca de 90% do nosso tempo dentro de edifícios. Não podemos descartar o impacto disso na nossa saúde mental e física.
Sinto-me uma sortuda por trabalhar num lugar onde todos os princípios da biofilia foram levados em consideração e aplicados. Organizámos a Living Building Challenge – Workshop Series ai, Nest City Lab, e foi incrível ver como 80 pessoas rapidamente se apropriaram do espaço e relaxaram.