Maiores barragens do mundo podem perder 26% da capacidade de armazenamento até 2050
Estimativas das Nações Unidas apontam que quase dois terços da população mundial enfrenta condições graves de escassez de água pelo menos durante um mês todos os anos, e que dentro de dois anos metade poderá sofrer com a falta desse recurso vital, especialmente devido aos efeitos das alterações climáticas.
Agora, um estudo do Instituto da Água, Ambiente e Saúde da Universidade das Nações Unidas (IAAS-NU) coloca em cima da mesa outra ameaça e revela que a capacidade de armazenamento de águas nas barragens pode estar a diminuir devido à acumulação de sedimentos, que os especialistas dizem que já retirou a cerca de 50 mil das maiores barragens a nível mundial entre 13% e 19% da sua capacidade original para reter água. E as contas indicam que até 2050 essa percentagem possa mesmo chegar aos 26%.
Assim, a capacidade combinada das barragens analisadas poderá ser reduzida dos atuais 6.300 mil milhões de metros cúbicos para os 4.650 mil milhões de metros cúbicos até meados deste século. Isso equivale a uma perda de capacidade da ordem dos 1.650 mil milhões de metros cúbicos, que quase equivale ao consumo de água anual da Índia, da China, da Indonésia de França e do Canadá juntos, pelo que os impactos na segurança hídrica das populações humanas (e das culturas agrícolas e dos animais usados na agropecuária) poderão ser estrondosos.
A investigação revela que o Reino Unido, o Panamá, a Irlanda, o Japão e as Seicheles são os países que deverão sofrer as maiores perdas de capacidade de armazenamento de água em barragens até 2050, com perdas entre os 35% e os 50%. No canto oposto, o Butão, o Camboja, a Etiópia, a Guiné e o Níger deverão ser o que menos perdem, com reduções inferiores a 15%.
Duminda Perera, investigador do IAAS-NU e principal autor do artigo publicado na revista ‘Sustainability’, assinala que “a perda da disponibilidade de armazenamento até 2050 em todos os países e regiões lançará desafios sobre muitos aspetos as economias nacionais, incluindo a irrigação, a geração de eletricidade e o abastecimento de água”.
O especialista alerta que a construção de novas barragens “não permitirá compensar as perdas devido à sedimentação”, sublinhando que este estudo “faz soar o alarme” de uma crise global da água que se aproxima e que poderá ter “implicações significativas” para o desenvolvimento de muitos países.
O problema é criado pela acumulação de sedimentos que são transportados pelas correntes dos rios e que se vão concentrando por não terem para onde ir, e deve ser resolvido com a aplicação de estratégias de remoção dos sedimentos e de gestão a longo prazo da sua acumulação.
“A sedimentação é um assunto sério que ameaça a sustentabilidade do abastecimento futuro de água para muitas pessoas”, avisa Vladimir Smakhtin, outro dos autores, destacando que essa acumulação pode causar inundações da zonas ribeirinhas, afetar os habitats de muitas espécies selvagens e colocar em risco comunidades humanas que habitam nas margens dos rios.
Olhando mais detalhadamente sobre algumas regiões, até 2050 o conjunto dos 19 países das Américas perderão 28% da sua capacidade de armazenamento de água nas barragens; a Europa perderá também 28%, sendo que já perdeu 19%; África registará uma redução de 24%; e a Ásia-Pacífico poderá perder 23%.
Sobre a Europa, o estudo prevê que 33 dos 42 países que constituem a região (que vai muito além dos Estados-membros da União Europeia) perderão 25% da capacidade de armazenamento de água em barragens até 2050, em parte devido à idade avançadas dessas infraestruturas, dizem os especialistas. No topo da lista, deverá estar a Irlanda, com a maior perda, de 39%, sendo que a Dinamarca deverá ser o país europeu menos afetado, com uma perda de 20%.